Em plena sexta-feira, o Plenário do Senado aprovou 21 projetos de lei, entre 23 protocolados na Mesa Diretora. Não, você você está lendo errado. Há, porém, uma ressalva: os senadores presentes não eram os habituais senhores de mais de 35 anos eleitos no ano passado ou em 2006. Na verdade, eram jovens entre 16 e 19 anos, que participaram da primeira legislatura do projeto Senado Jovem (leia mais sobre o projeto). Os 27 novos parlamentares foram os finalistas do 4º Concurso de Redação do Senado, cujos resultados foram divulgados no transcorrer desta semana. O objetivo é levar o funcionamento do processo legislativo ao conhecimento dos estudantes e estimular um relacionamento constante deles com a política.
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Ao longo dos últimos três dias, os estudantes puderam vivenciar a experiência de trabalho dos senadores. Eles apresentaram 23 proposições, por meio de formulários de intenção legislativa, que foram analisadas em três comissões. Eram 20 projetos de lei e três propostas de emenda à Constituição.
Com o resultado das votações de hoje, os projetos aprovados serão encaminhados para análise da Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, e tramitarão de acordo com as regras previstas para as demais proposições da Casa, desde que acatados no colegiado inicial.
Empossados pelo presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP), os estudantes ouviram Orlei Jacinto Pereira, da Paraíba, ler o termo constitucional de posse, em que dizia: “Prometo guardar a Constituição Federal e as leis do país, desempenhar fiel e lealmente o mandato de jovem senador”. Ele foi escolhido por ser o mais velho da turma.
Sarney, por sua vez, desejou aos alunos que a experiência sirva como um ensinamento. “Quero desejar aos jovens que hoje estão sendo investidos nessa função que a desempenhem como o início de um ensinamento. Ao mesmo tempo, espero que faça parte de cada um o desejo de participar da vida pública e de ajudar o povo através das leis”, disse o peemedebista, após a cerimônia de posse.
As proposições versam, em sua maioria, sobre educação. A divisão dos colegiados se deu com base nos projetos e PECs apresentados pelos estudantes, de acordo com regras regimentais do Senado. Cada uma das três comissões teve a participação de nove jovens senadores e trataram de Assuntos Sociais e Segurança, Organização e funcionamento da Educação, e Gestão e Políticas da Educação.
Na manhã de hoje (18), os 27 jovens senadores participaram de uma reunião com a secretária-geral da Mesa do Senado, Cláudia Lyra, em que discutiram os resultados da iniciativa. “Há muito anos eu pretendo trabalhar com a juventude para ajudar a construir a cidadania. Vocês, juntamente com este projeto, são meus filhos”, disse a secretária-geral, emocionada e dirigindo-se aos jovens senadores.
No comando
Na condução da sessão deliberativa, a presidenta jovem do Senado, Fernanda Maciel, mostrou a que veio no frescor dos seus 17 anos. Amazonense, ela apresentou em seu primeiro dia de mandato um projeto de lei que vincula o Bolsa Família a um projeto de capacitação “para as pessoas, ao serem desvinculadas do programa, não ficarem estagnadas na mesma situação”. “É um projeto bem Lula” brincou, em referência ao ex-presidente, que fez do programa a menina-dos-olhos de sua gestão. “A gente não dá o peixe, ensina a pescar. É a possibilidade de a pessoa prover a família dela.”
Em entrevista ao Congresso em Foco logo após a sessão, Fernanda explicou que foi determinada a vencer a indicação para a Presidência do Senado, na reunião entre os demais jovens representantes que serviu para a escolha da Mesa Diretora. “Tive a oportunidade de me apresentar. Foi nessa hora que eu disse: é agora ou nunca! Eu vim com isso na cabeça, vim querendo ser a presidente. Eu disse a mim mesma: eu vou ser a presidente”, declarou a estudante do terceiro ano do ensino médio.
Instada a comentar seu papel de destaque na sessão, Fernanda valorizou os próprios colegas, em exemplo que deveria servir de modelo para a relação dos senadores de verdade. “Cada um tem o seu adjetivo próprio, todos são muito especiais. Eu falei para eles que eu vou manter contato e, se ninguém me responder, eu casso a pessoa”, brincou a jovem senadora.
“Todos são muito especiais, mas eu vim com o intuito de ganhar a Presidência do Senado. É a minha chance de falar o que eu quero falar, minha chance de brilhar. Aproveitei essa chance com sangue, suor e lágrimas”, filosofou a estudante, alçada ao posto com nove votos, em eleição nominal no plenário, nos moldes do regimento interno da Casa.
Fernanda disse que pretende enveredar pela magistratura e, como já havia demonstrado na sessão, pretende retornar ao Parlamento. Mas como mandatária. “Se depender de mim, com certeza. Vou seguir a carreira política e fazer faculdade de Direito. Porque o que eu quero mesmo na minha vida, desde pequena, é ser desembargadora”, disse a estudante, explicando com propriedade – e cacoete de tribuna – o porquê da queda pela política.
“Sendo jovem, eu tenho uma visão muito ampla do que eu quero para o meu Brasil. Eu tenho noção que, daqui a uns cinco anos, quem vai estar vivendo tudo isso sou eu. Vou estar vivenciando, fazendo parte. Eu tenho uma idade-limite para ser vereadora, e eu penso em me candidatar, porque, participando ativamente, vou ter oportunidade de mostrar o que eu quero passar, que é a igualdade”, destacou Fernanda, dizendo-se identificada com o PT e o PMDB. “Mas eu gosto mais do PT.”
Aula de História
Samira da Silva, pernambucana de 17 anos, participou da sessão como integrante de comissão temática. E, em plenário, demonstrou desenvoltura ao defender seus pontos de vista na votação dos projetos em pauta. Ela comentou à reportagem como se sentiu diante das câmeras da TV Senado, que registrava tudo ao vivo, em transmissão para todo o país. “No começo, eu fiquei mais nervosa. Mas depois você vai se acostumando, porque você conhece todo mundo e se sente mais à vontade”, declarou a jovem senadora, também afinada com a ideologia do PT.
“Gostei muito mesmo, porque nos deu oportunidade para vermos como são realmente feitas as leis de nosso país. Até porque são elas que vão determinar nossa vida, nosso futuro. Como eu comentei ontem com outras pessoas, é uma aula de história, sendo que real. Uma coisa é você ver pela televisão, você imagina uma coisa. Mas aqui, você vivencia e muda o conceito”, acrescentou a parlamentar por um dia, considerando a hipótese de, em um futuro próximo, “estar aqui como uma senadora de verdade”.
Primeira-secretária, Jéssica Peres, estudante sul-matogrossense de 17 anos, disse que a experiência foi “única”. “Eu não queria mais ir embora. Deveria ter um projeto desse todo mês, pra gente vir representar nosso estado durante um ano inteiro, e poder acompanhar as coisas”, disse a jovem congressista, agradecendo a Deus pela oportunidade desta tarde.
Ela também considera a “possibilidade” de tentar uma cadeira no Parlamento mais para frente, mas com respeito ao curso das coisas. No entanto, Jéssica demonstra a vontade manifestada por milhões de brasileiros todos os anos, de olho na estabilidade profissional. “Vamos devagar. Acho que eu preferia trabalhar como concursada aqui do que como parlamentar”, avaliou, acrescentando não ter preferência partidária. E falou como quem acompanha o fazer político no país.
“Tem alguns que eu apoio por causa das decisões, principalmente aqueles são de bases socialistas. Depende do tema. Vamos equilibrar todo mundo, se não, se colocar só um, o Brasil não tem chance.”
Do bom para o ótimo
Já o vice-presidente da Mesa Diretora, o mineiro Matheus Faria, 16 anos, disse que se sentia reconhecido por seus esforços como estudante. “Foi ótimo, muito bom mesmo, muito gratificante. É o reconhecimento de todo um trabalho da gente. Desde pequeno a gente vem procurando esse reconhecimento, e agora chegou. E chegou pra valer mesmo”, disse o estudante, membro da Comissão de Assuntos Sociais.
“Foi tudo muito intenso, um período de grande aprendizagem, de obtenção de conhecimento, e de fazer muitas amizades”, acrescentou Matheus, também sem querer adiantar o que fará no futuro. “Gostar [da atividade parlamentar], eu gostei. Mas ainda não decidi, é apenas uma possibilidade”, completou, resumindo em uma frase como tem visto a cena política brasileira. “Tudo o que é bom pode ficar ótimo. A gente está nesse estágio do bom, mas podemos melhorar e ficar ótimos. A pobreza acabando já será um grande passo para a democracia.”
Se Matheus não sabe se será político um dia, o mesmo não acontece com sua colega rondoniense. Atenta ao desenrolar da entrevista, Rosilene da Silva, presidente da Comissão de Assuntos Sociais aos 17 anos, não teve dúvida ao responder sobre uma eventual carreira política. “Quem quiser votar em mim para presidente [da República], eu estou aceitando votos”, brincou a estudante, que “inventou” o partido político de que faria parte, o PNN – ou “Partido do Norte-Nordeste.
O projeto
Os alunos selecionados cursam os últimos anos do ensino médio em escolas públicas. Eles participaram de um concurso de redação cujo tema foi “O Brasil que a gente quer é a gente quem faz” – o primeiro colocado foi o mineiro Matheus, que escreveu uma fábula (“Beija-flores brasileiros”) sobre o pequeno pássaro solitário no combate a um incêndio, enquanto outros animais fugiam. As redações escolhidas serão publicadas em livreto produzido pelo Senado.
Além de atuar como senadores, os estudantes ganharam também notebooks e deram às suas escolas computadores, livros e DVDs. Eles também participaram de atividades culturais em Brasília, como visitação à Feira do Livro e passeio pelo Centro Cultural Banco do Brasil.