Entrevista de Dilma ao Jornal Nacional, da TV Globo, em 27 de outubro de 2014:
William Bonner – Às 8h46 da noite desta segunda-feira, a presidente Dilma Rousseff nos acompanha ao vivo em Brasília e vai nos conceder uma entrevista agora. Presidente, parabéns, boa noite, muito obrigado pela sua presença.
Patrícia Poeta – Boa noite, presidente, e parabéns.
Boa noite, William. Boa noite, Patrícia. Boa noite vocês que nos acompanham aqui, a essa hora.
Bonner – Presidente, o Brasil viveu ontem o momento mais importante de qualquer democracia e a vitória de um candidato pela maioria absoluta de votos numa eleição livre. Foi uma campanha agressiva de ambas as partes, com o resultado mais apertado da história da nossa República e no seu discurso de ontem a senhora disse que é preciso reconciliar a nação. Que passos a senhora vai dar nesse sentido, presidente?
Olha, William, eu queria te dizer que eu acredito que a democracia, ela é um dos mais importantes fatores para que um país não só possa mudar, mas o faça de forma pacífica e ordeira. Nessa eleição, mesmo com visões contraditórias e posições contraditórias, havia algo em comum no conjunto das pessoas e do sentimento que elas tinham: a busca por um futuro melhor para o Brasil. E eu acho que essa, essa busca é a grande base para que nós tenhamos uma união. Numa democracia madura, união não significa unidade de ideias ou uma ação monolítica conjunta, significa muito mais a abertura, a disposição para dialogar, a disposição para construir pontes, a disposição para que nós possamos garantir de fato o que uma eleição sempre exige, na democracia: mudança. Nós temos de ser capazes de garantirmos as mudanças que o país precisa e exige, juntamente com as reformas que o país precisa e exige. E isso fica muito claro nessas eleições. Eu acho que é essa a base comum entre nós. E aí a grande palavra nesse momento é diálogo, é dialogar com todas as forças: as forças sociais, as forças produtivas, de todos os segmentos, do segmento industrial, da agricultura, de serviços, do setor financeiro e, também, com todos os clamores da população. A população quer continuar melhorando de vida. E aí nós temos um compromisso, William, que é assegurar que nós tenhamos um país mais moderno, mais inclusivo, mais produtivo, e que tenha como base valores fundamentais. Por exemplo, oportunidade para todos, esse é um valor moral e ético. O outro valor moral e ético é o combate sem trégua à corrupção. Não é possível que o nosso país seja um país que mantenha a impunidade daqueles que cometem atos de corrupção.
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Patrícia Poeta – Presidente, também no discurso de ontem a senhora deu um grande destaque à realização de uma consulta popular, de um plebiscito para promover a reforma política, e logo após as manifestações do ano passado a senhora tinha proposto o mesmo, mas na época enfrentou críticas de juristas e da oposição no Congresso, a quem cabe fazer as reformas. O que leva a senhora a insistir nessa proposta?
Sabe o quê, Patrícia? É a certeza, porque eu recebi durante essa eleição um conjunto de segmentos que vai desde a CNBB até… passando pela OAB, por todos os movimentos sociais e, justamente, também, um grande clamor da juventude que, inclusive, me entregou uma lista que vai ser – é obvio que a lista que me foi entregue a cópia – que vai ser entregue ao Congresso, propondo, justamente, que se faça um processo de consulta popular. Esse processo de consulta popular, ele é essencial para se fazer uma reforma política. Muitos setores têm como base dessa reforma política a proibição de contribuições empresariais nas campanhas. A partir da reforma só seria possível contribuições privadas individuais, não seria possível empresarial. Tem várias propostas na mesa. A oposição fala muito no fim da reeleição. Enfim, tudo isso tem de ser avaliado pela população. Eu acredito que o Congresso vai ter sensibilidade para perceber que isso é uma onda que avança, eles captaram se eu tenho… se eu não estou equivocada, mais de 5 milhões de assinaturas.
William Bonner – Agora, presidente, perdão. A senhora falou em financiamento de campanha, no primeiro mandato a senhora conviveu aí com o julgamento do caso do mensalão. Agora a senhora vai governar em meio a investigações sobre corrupção na Petrobras. Pelo que foi falado até agora, políticos poderão vir a sofrer processos judiciais e até de cassação de mandatos, inclusive, do PT e de partidos que apóiam a senhora, isso, claro, pode causar instabilidade política, presidente. Como é que a senhora pretende enfrentar essas possíveis dificuldades?
Olha, William, eu não acredito em instabilidade política por se prender e condenar corruptos e corruptores. Eu acredito que o Brasil tem uma democracia forte e tem uma institucionalidade forte. Acho que a sociedade brasileira exige uma atitude que interrompa a sistemática impunidade que ocorreu neste país ao longo da nossa história, e isso significa: doa a quem doer, se faça justiça. E fazer justiça nesse caso é: punir, se alguém errou tem que ser punido. Essa… esse fator não pode levar à instabilidade política. O que deve levar à instabilidade política é a manutenção na impunidade. Eu acho que o Brasil amadureceu nestes últimos 12 anos. E eu, você pode ter certeza, eu não falei contra a corrupção e a impunidade só durante a eleição, eu não só falei durante a eleição como você pode ter certeza que eu farei o possível para colocar às claras o que aconteceu neste caso da Petrobras e em qualquer outro que apareça. Não vou deixar pedra sobre pedra, vou investigar e não é aí apenas divulgando seletivamente informações. Eu vou fazer questão que a sociedade brasileira saiba de tudo, eu não concordo que isso leva à crise. Acho que o que leva à crise no Brasil é as suposições, as ilações, e as insinuações.
Patrícia Poeta – Presidente, falando aí de futuro, o presidente reeleito não tem tempo de esperar a posse para tomar as medidas necessárias. Na economia, há desafios importantes como, por exemplo, a inflação, o baixo crescimento, são desafios que demandam decisões, que demandam sinalizações da senhora para aumentar a confiança do empresário e do consumidor. Que medidas a senhora vai tomar para enfrentar esses problemas? A política econômica vai mudar e, se sim, em que direção?
Olha, eu inclusive externei ontem que eu não ia esperar a conclusão do primeiro mandato para iniciar todas as ações no sentido de transformar e de melhorar o crescimento da nossa economia. Agora, o que eu quero dizer também é que outra coisa que disse que eu vou praticar: eu vou abrir o diálogo com todos os segmentos. Eu acho que a palavra-chave agora é diálogo, eu quero dialogar com setores empresariais, com setores financeiros, com o mercado, fora do mercado, para discutir quais são os caminhos do Brasil. Acho que nós temos de passar por esse processo…
William Bonner – Presidente, a senhora falou já em…
Eu pretendo colocar de forma muito clara, muito clara, quais são as medidas que eu vou tomar. Agora, não é hoje.
Patrícia Poeta – Quando será?
Antes do final do ano. Eu vou fazer isto entre o mês… esse mês que inicia na próxima semana.
Bonner – A senhora mencionou que vai promover grandes reformas e já falou, inclusive, na reforma política aqui mesmo nessa entrevista. E aí despertou a nossa curiosidade para saber se entre as reformas que a senhora pretende promover está a tributária, por exemplo, que é reclamada aí há tanto tempo por tanta gente.
Olha, William, se tem uma coisa que eu procurei fazer foi a reforma tributária. Inclusive tem, até, ainda hoje no Congresso tem toda uma legislação sobre ICMS. Mas eu acredito que nós agora temos de fazer essa discussão a fundo. Por quê? Nós fizemos uma série de reformas, até fomos muitos criticados por isso. Nós eliminamos, por exemplo, reduzimos e desoneramos a tributação sobre folha de pagamento. Tentamos, inclusive, fazer uma discussão sobre PIS/Cofins. Tem, no Brasil, um conflito redistributivo. Quando se começa a discutir uma reforma tributária, há quem perde, quem acha que vai perder, não é nem necessariamente que vai perder, acha que vai perder e quem acha que vai ganhar. E esses, essas posições, elas não se coadunam. Nós fizemos uma grande reforma tributária com o SuperSimples. Inclusive, universalizamos para micro e pequeno empreendedor toda a legislação de unificação, simplificação e redução de tributos. E ampliamos, ao universalizar, um conjunto de pessoas que passaram a ter o direito a esse processo de simplificação, que eu acho que é o início da reforma tributária. Eu tenho a convicção de que o Brasil precisa de uma reforma tributária, precisa de simplificar tributos. É impossível continuar com a sobreposição e com a guerra fiscal. Nós, eu acho que reduzimos, e muito, a guerra dos portos, mas a guerra fiscal ainda ela permanece. É um dos desafios que eu vou ter de encarar.
Patrícia Poeta – Entendi. Antes da gente encerrar, qual é a mensagem que a senhora gostaria de deixar aqui para os brasileiros que estão nos assistindo neste momento?
Olha, a minha mensagem é a seguinte: eu acredito que depois de uma eleição, nós temos de respeitar todos os brasileiros, os que votaram em mim e os que não votaram em mim. E respeitá-los significa abrir e construir, através do diálogo, pontes para que nós possamos, juntos, fazer com que o Brasil tenha um caminho de crescimento, um caminho de futuro. Isso significa um Brasil moderno, mais competitivo, mais inclusivo. Eu falei isso ao longo de toda a campanha. Acho que esse Brasil é o Brasil da solidariedade, é o Brasil que dá importância também à criação de oportunidades e, também, um Brasil focado na educação, na cultura, na ciência e na inovação. Agora, que cuide das pessoas, em especial dos mais pobres e daqueles que são segmentos que mais emergiram nos últimos 12 anos: as mulheres, os jovens e os negros. E para isso tudo, nós precisamos de nos dar as mãos e caminhar juntos para construir esse futuro que todos nós queremos.
Patrícia Poeta – Presidente, muito obrigada pela entrevista aqui, ao vivo, no Jornal Nacional e, mais uma vez, parabéns pela vitória de ontem.
William Bonner – Sucesso no novo mandato, presidente. Muito obrigado.
Muito obrigada, Patrícia. Muito obrigada, Bonner. Boa noite a todos.
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