Em segundo lugar aparece o grupo Odebrecht, com duas empresas que negociam o pagamento de R$ 292,3 milhões – são R$ 175,7 milhões pela Construtora Norberto Odebrecht S.A. e R$ 116,6 milhões pela Odebrecht Ambiental S.A. A EIT Empresa Industrial Técnica S.A., com R$ 285,4 milhões, e a Andrade Gutierrez S.A, com R$ 157,3 milhões, completam a lista dos grupos que estão na mira tanto do Carf, objeto de CPI no Senado, quanto da Operação Lava Jato. Juntas, elas tentam baixar dívidas que somam mais de R$ 1,88 bilhão com o governo federal.
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Essas empresas fazem parte da lista dos 400 maiores devedores, entre pessoas jurídicas e físicas, com a União, que têm débitos acima de R$ 100 milhões com a União. Segundo investigações da Operação Zelotes, que desvendou um esquema de corrupção no âmbito do Carf, o total das dívidas paralisadas no Conselho pode alcançar R$ 250 bilhões. Desse total, o Ministério da Fazenda já determinou a execução de R$ 70 bilhões. A ideia do governo é utilizar os recursos nos esforços do pacote de ajuste fiscal.
O fato de as empresas acima listadas terem pendências sob exame do órgão não quer dizer que elas cometeram algum tipo de irregularidade. Em resposta aos contatos feitos pela reportagem, todas elas negaram haver qualquer suspeita de negociata em busca de redução – ou mesmo eliminação total – dos débitos com a União (leia abaixo). Nos próximos julgamentos do Carf, as corporações esperam que suas respectivas pendências sejam revistas ou mesmo eliminadas.
No último dia 28 de julho, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, comandou a abertura da sessão de retomada dos julgamentos do Carf, paralisados desde a reestruturação promovida como resposta aos desdobramentos da Zelotes. O exame dos processos recomeçou neste mês. Os procedimentos foram suspensos justamente depois que a PF, auxiliada por diversos órgãos de investigação, descobriu que grandes empresas subornaram membros do Conselho para diminuir dívidas.
Propina
PublicidadeOs trabalhos da Zelotes foram iniciados em 2013 e se debruçaram sobre processos administrativos abertos desde 2005. Um dos principais indícios de manipulação de julgamento por meio de pagamento de propina, em acertos negociados entre conselheiros e representantes de corporações, envolve a Mitsubishi no Brasil. A empresa conseguiu junto ao Carf a redução de uma dívida em 99,62%, em que uma autuação com valor inicial de R$ 266 milhões teve sua cobrança revista para R$ 1 milhão ao final do processo administrativo.
Em outro caso, uma multa de R$ 150 milhões foi extinta sem fundamentação legal. Os diversos casos sob apuração da PF, com auxílio do Ministério Público, levaram à instalação de uma comissão parlamentar de inquérito (CPI) no Senado, a CPI do Carf.
O Carf é a última instância administrativa decisória para dívidas fiscais com a União. Segundo a PF, a teia de corrupção nos julgamentos do Conselho provocou desvios de R$ 6 bilhões nos últimos anos, mas a estimativa é de que o rombo possa chegar a R$ 19 bilhões com a apuração dos casos restantes. O esquema consistia na elaboração de votos sob encomenda para beneficiar devedores que recorreram ao Carf para contestar multas aplicadas pela Receita Federal.
De acordo com a PF, ex-conselheiros do Carf e consultores na ativa procuravam empresários com grandes dívidas e lhes apresentavam a possibilidade de reduzi-las ou anulá-las por meio de pagamento de propina, que variava entre 1% e 10% do débito. No cardápio, pedidos de vista dos processos, emissão de pareceres favoráveis aos grupos empresariais e exames de admissibilidade de processos, entre outros favores. Nomes e valores estão sob sigilo judicial, mas as investigações da PF e da CPI já sugerem alguns investigados, devido a convocações já aprovadas pelos senadores.
Nas últimas audiências da CPI, manifestou-se a certeza de que, em resumo, os pequenos contribuintes se submetem às decisões do Carf e arcam com seus débitos a duras penas, dentro da legalidade. Por outro lado, empresas mais ricas pagavam propina aos conselheiros para se livrar total ou parcialmente das sanções do Fisco.
Ao todo, mais de 70 empresários, companhias e entidades estão no foco das investigações. Além da Mitsubishi, a lista reúne, por exemplo, Petrobras, Embraer, o Partido Progressista (PP) e instituições financeiras como Bradesco, Santander, Safra e Boston Negócios, cada um com seu grau de envolvimento ou apenas com “elementos consideráveis de irregularidade”, segundo a PF.
Outro lado
Em e-mails enviados à redação, três das cinco empresas procuradas se manifestaram sobre seus débitos junto ao Carf. Apenas a Camargo Corrêa e a EIT não deram resposta aos contatos feitos pelo Congresso em Foco. Esta última, aliás, apresenta números de telefone que direcionam o interlocutor à caixa postal, sem que seja possível deixar recados. Alguns e-mails da empresa parecem ter sido desativados.
Em resposta encaminhada ao site em 30 de julho, a Andrade Gutierrez declarou que sua pendência diz respeito a “débito de Imposto de Renda”. “A Andrade Gutierrez esclarece que tal montante se refere a um débito de Imposto de Renda devidamente declarado que vem sendo liquidado por parcelamento. É importante ressaltar ainda que não há outra pendência relevante da companhia junto à administração tributária e que recentemente foram renovadas todas certidões negativas tributárias da empresa, o que demonstra o correto cumprimento de suas obrigações tributárias”, esclareceu a empresa.
Pertencente ao mesmo grupo empresarial, a Odebrecht Ambiental também negou qualquer tipo de relação irregular com membros do Carf. Segundo a corporação, a multa aplicada pela Receita Federal é “improcedente”. “A empresa entende que o auto de infração é improcedente e a cobrança do débito é indevida e, exatamente por isso, exerce seu direito de contestá-la junto aos órgãos administrativos competentes, dentre os quais faz parte o Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf). Vale esclarecer que o processo, apesar de estar no CARF, sequer foi distribuído”, diz o grupo.
Por fim, a Construtora Odebrecht diz que seus processos junto ao Carf “seguem os trâmites regulares do contencioso administrativo previsto na legislação vigente”. A exemplo das duas anteriores, a empresa declarou que nenhum de seus representantes procurou – ou foi procurado – por conselheiros do Carf para negociatas. Instada a comentar qual valor da dívida poderia ser considerado justo, a corporação diz que “as questões em curso são técnicas e jurídicas”.
“A Construtora Norberto Odebrecht (CNO) apresentou seus argumentos oportunamente, e entende que estes sejam suficientes para dirimir as discussões. No entanto, caberá ao próprio Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf) a análise e a decisão final no âmbito administrativo”, acrescentou a empresa.
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