Em ano de Copa do Mundo e eleições gerais, tradicionalmente o Congresso reduz o ritmo da produção legislativa e evita votar temas polêmicos, como acabou por acontecer com a reforma da Previdência. De olho no eleitorado, parlamentares dizem acreditar que, daqui até o fim do ano, o governo Michel Temer, um dos mais impopulares da história do país, só terá mais um mês para tentar emplacar ao menos três temas de sua pauta prioritária. Mas nem isso é certo, avaliam os congressistas.
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Alguns parlamentares avaliam que nem nesse espaço de tempo de menos de um mês haverá avanço na pauta de interesse do governo. Na oposição e na base aliada, líderes de bancada disseram ao Congresso em Foco que é improvável, devido ao contexto e à falta de tempo hábil, aprovar a privatização da Eletrobras na Câmara e no Senado, por exemplo, uma das principais aspirações do governo para 2018.
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Além dos líderes, consultores legislativos ouvidos pela reportagem apontaram três proposições prioritárias para o governo até o fim do ano: a medida provisória (MP 814/17) e o projeto de lei (PL 9463/19) que promovem a capitalização e a privatização da Eletrobras; a reoneração da folha de pagamentos (Projeto de Lei 8456/18); e a nova lei de falências (Projeto de Lei 10.220/18).
Líder do PT na Câmara, Paulo Pimenta (RS) disse considerar que, em termos de Congresso, o governo Temer acabou. “Acho que esse governo não aprova mais nada de relevância aqui [Congresso]. Mais nada que seja mais relevante”, declarou o petista, para quem o Palácio do Planalto “não vai nem tentar” votar a reoneração da folha de pagamentos, outra prioridade do Executivo.
Para Paulo Pimenta, a oposição vai se manter em obstrução não só como forma de protesto contra a prisão do ex-presidente Lula, a quem trata como preso político, mas como maneira de manifestar indignação contra a própria pauta reformista de Temer. “Mais três ou quatro semanas e não conseguem votar mais nada. Um governo sem legitimidade, que não tem capacidade de oferecer qualquer projeto que possa trazer algo de bom. Todos os projetos apresentados por esse governo ou foram para tirar direitos de trabalhadores e trabalhadoras ou para reduzir a soberania do país”, acrescentou o petista, dizendo ser “zero” a chance de a oposição aceitar votar proposições governistas.
Governo a quatro mãos
Líder do MDB no Senado, Simone Tebet (MS) disse à reportagem que não vê a gestão Temer em estado terminal, embora também vislumbre os próximos dias como os últimos para votações importantes em 2018. Alheia às críticas oposicionistas, a senadora organizou, nessa quarta-feira (16), uma reunião para discutir a economia com o ex-ministro da Fazenda Henrique Meirelles, que se diz disposto a tentar a sucessão de Temer em outubro próximo. Para a emedebista, que está à frente da maior bancada da Casa (18 membros), a dificuldade da pauta existe e o próprio Executivo já a conhece, mas ela é superável.
“Acho difícil [avançar na pauta], mas o governo tem essa consciência. Em uma reunião que tivemos lá [Palácio do Planalto] com o próprio presidente e com os líderes da base, eles declararam que têm consciência de que o calendário eleitoral, acumulado com a Copa, e nos pediram apenas que a Câmara agilizasse essas medidas provisórias todas que ele [Temer] já mandou. Acho que são cinco ou seis que estão vencendo em junho”, declarou Simone, sem descartar que “alguma coisa pode surgir pelo caminho”.
Mas a senadora admite que, caso algumas MPs sejam aprovadas, o segundo semestre andará na marcha lenta em relação aos interesses legislativos do governo, mas sem abdicar das políticas de Estado – lista que inclui a possibilidade, segundo intenção manifestada pelo próprio Temer, de suspensão da intervenção federal no Rio de Janeiro para votar a reforma da Previdência ainda em 2018. “Dependendo de quem seja o próximo presidente. Vai depender desse período de transição de quatro meses”, acrescentou a emedebista, para quem Temer não deverá tentar a reeleição.
Simone diz ainda que, depois do recesso parlamentar (18 a 31 de julho), serão duas gestões em curso no país até as eleições – e, nesse sentido, a pauta vai depender “muito mais” do próximo chefe do Executivo do que do atual. “Acho que nós teremos dois governos no segundo semestre, Nós teremos um governo que vai estar conversando com o próximo presidente da República que, seja do MDB ou não, eu tenho certeza de que vai estar disposto a colocar em pauta para o próximo Congresso as medidas necessárias para o desenvolvimento do país”, concluiu. “Não podemos esperar por quatro meses, até o próximo presidente assumir, sem agilizarmos os projetos necessários.”
Congresso às moscas
Durante e até depois da Copa do Mundo da Rússia, que se desenrola entre 14 de junho e 15 de julho, as atenções de deputados e senadores se voltam para os festejos juninos. Na sequência, entram em campo as movimentações eleitorais, em que o mandato parlamentar é dominado pelas articulações e atividades de campanha, entre outros compromissos em redutos eleitorais.
Até o campeonato de futebol, são 13 as sessões deliberativas previstas na pauta, em quatro semanas de votação – tempo curto para aprovar matérias de impacto social, além do que patrocinadas por um governo enfraquecido e com poder de mobilização enfraquecido. Mas a pauta encontra resistência inclusive entre membros da base aliada. Além disso, pesa no calendário reduzido o recesso de julho, que só é assegurado se deputados e senadores aprovarem o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) até 18 de julho.
Depois do recesso parlamentar do meio do ano, até o primeiro turno das eleições (7 de outubro) serão oito as semanas em que poderá haver votações de plenário na Câmara e no Senado, nos meses de agosto e setembro, com média de três dias de sessão deliberativa por semana – ou seja, 24 dias de votação no período, na melhor das hipóteses. Mas, em ano eleitoral, o Congresso costuma ficar às moscas nesse período, com movimentação reduzida inclusive de servidores e profissionais de imprensa.
Em 16 de agosto, a Justiça Eleitoral passa a permitir a realização de propaganda eleitoral com comícios, carreatas, distribuição de material gráfico e propaganda na internet (sem custeio), entre outras, o que mobiliza a quase totalidade do Congresso nos diversos redutos eleitorais Brasil afora. Além disso, debates por meio de rádio e televisão transcorrem até 4 de outubro, quando também chega ao fim a propaganda política em reuniões públicas ou veiculada em comícios. O pleito só se encerra em 28 de outubro, nos casos de segundo turno.
O envolvimento de parlamentares no processo eleitoral diminui no segundo turno, mas não o desinteresse na pauta legislativa. Com a cabeça no próximo governo e na próxima legislatura, deputados e senadores, reeleitos ou não, terão sete semanas de votação até a semana do Natal, quando tem início o segundo recesso parlamentar e as férias de fim de ano. Com as três sessões deliberativas de praxe por semana, seriam mais 21 dias para votação de proposições legislativas.
Somados os períodos e mantidas as condições de normalidade institucional no país, deputados e senadores poderiam realizar sessões de plenário, ressalvadas as semanas de feriado, em 45 dias de sessão. Mas isso é algo pouco provável. Além da obstrução oposicionista, que tem conseguido prolongar ou mesmo retirar de pauta a análise de temas polêmicos, a falta de acordo para votações e até o imponderável podem reduzir ainda mais as chances de avanço na pauta.
Com dois inquéritos ativos contra si na Procuradoria Geral da República (PGR), Temer poderá ser alvo de terceira e até uma quarta denúncia criminal, repetindo-se o roteiro de 2017, quando duas acusações contra o presidente paralisaram o Congresso por meses. Denunciado por corrupção, obstrução de Justiça e participação em organização criminosa, o emedebista conseguiu mobilizar a base governista no ano passado, à custa da liberação bilionária de emendas parlamentares e da distribuição de cargos em órgãos estratégicos, e barrou ambos os processos enquanto perdurar seu mandato. A repetição da tormenta, analisam observadores da cena política, teria efeitos imprevisíveis às vésperas das eleições.
Metas remotas
Há ainda a possibilidade, embora remota, de votação na Câmara do novo marco legal das agências reguladoras (Projeto de Lei 52/2013), texto já aprovado no Senado, além da proposta de reformulação da Lei de Licitações (Projeto de Lei 6814/17) ora discutida em comissão especial da Câmara. Neste caso, a exemplo de reformas como a política e a eleitoral, trata-se de proposição que pouco avança quanto é incluída na pauta, por desinteresse dos próprios parlamentares.
Líder do governo na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB) admitiu ao Congresso em Foco que o “tempo curto” de fato atrapalha os planos do governo, mas que a situação pode ser revertida com a ajuda do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), na definição da pauta, Mas isso também pode esbarrar nos interesses pré-eleitorais de Maia, presidenciável do DEM, que já manifestou objeção à paralisação da intervenção federal para votar a reforma da Previdência.
Para Aguinaldo, o último mês antes da Copa do Mundo será de dificuldades para o governo, que ainda poderia apostar na reoneração da folha, por exemplo. “Temos um prazo curto. Mas, se fizermos um esforço concentrado nessas últimas semanas, dá para votar”, acrescentou Aguinaldo, enquanto negociava a aprovação da MP 811 (pré-sal) em plenário.
“De nossa parte haverá um esforço ou para obstruir ou para derrotar qualquer projeto que venha do governo”, advertiu Paulo Pimenta.
Colegas comunistas do petista reforçam o coro. “O governo está com grande dificuldade para ganhar as eleições. E eles estão com acordo do golpe para cumprir”, disse à reportagem a vice-líder do PCdoB na Câmara, Jandira Feghali (RJ), referindo-se ao impeachment da presidente Dilma Rousseff.
Para Jandira, a aprovação de temas como o “pacote do veneno”, referência ao projeto de lei que facilita o uso de agrotóxicos no agronegócio, e a própria reforma da Previdência será algo difícil para o governo. E a razão, segundo a deputada, é efeito justamente da eleição de outubro.
“Os caras já vão se alinhando com o governo seguinte. Não é tão fácil para o governo aprovar esse tipo de matéria”, acrescentou Jandira, reforçando que a tática da oposição será obstruir todas as votações das próximas medidas provisórias, de maneira a evitar a chegada da MP da Eletrobras na pauta.
Sepultamento
Representante da Rede no Senado, Randolfe Rodrigues (AP) também disse à reportagem que o governo terá chegado ao fim, em termos legislativos, caso a MP que capitaliza a Eletrobras, por exemplo, não tenha tramitação concluída na Câmara e no Senado até 1º de junho, quando terá perdido a validade em caso de não aprovação. Para Randolfe, o próprio excesso de medidas provisórias vai dificultar a vida dos governistas.
“Temos dez MPs para serem votadas e duas semanas antes de 1º de junho. As dez MPs vencem em 1º de junho. E ainda temos o compromisso do presidente [do Senado] Eunício Oliveira [MDB-CE] de não aceitar medida provisória sem o devido respeito ao prazo de interregno”, ponderou o senador, para que, só um “milagre” desata o nó da pauta governista.
“Então, a Câmara teria que fazer um milagre de votar MPs hoje [quarta, 16], amanhã e sexta para dar tempo. E eu acho muito pouco provável que, em um período já de pré-campanha eleitoral, deputados fiquem quinta e sexta para votar MP. Diante disso, mesmo que se vote uma ou duas MPs de hoje para amanhã, ficariam outras oito faltando, e só teríamos semana que vem para votá-las, e em relação à da Eletrobras não há acordo [para votação]”, analisou Randolfe, acrescentando ser essa a medida com mais chances de perder validade.
O senador falava enquanto deputados aprovavam em plenário a MP 811/17, que permite à Pré-Sal Petróleo S/A vender diretamente a parte de óleo que cabe à União na exploração de campos de pré-sal. Ele disse ainda que a prova definitiva de que o governo chegou ao fim virá com a derrota em torno da capitalização da Eletrobras, o que dificultaria o processo de privatização, via projeto de lei.
“Acho que o governo já acabou antes disso, mas o sepultamento vai ser na votação desta MP da [Eletrobras]”, arrematou.
Vice-líder do governo na Câmara, Beto Mansur (MDB-SP) ironizou a previsão do senador. “Ele dirige alguma coisa?”
Para Mansur, itens da pauta governista terão o apoio de Eunício Oliveira para serem levados à votação em plenário. Mesmo assim, o governista também diz considerar difíceis avanços significativos na pauta depois da Copa do Mundo. “Acho difícil. Nós temos uma previsão de votar, possivelmente até o dia 20 de junho. A Copa começa no dia 14, aí temos as festas juninas, que todos nós sabemos que esvaziam o Congresso em função de os parlamentares, principalmente os do Nordeste, irem para a festa”, vislumbrou.
“Agora, tenho a percepção de que terminaremos [a votação] o cadastro positivo, coloca para votar a Eletrobras – e já temos relatório pronto e acessível para que se possa votar –, reoneração da folha [de pagamento], que é algo mais difícil. Temos um prazo exíguo, mas temos condições de votar se houver boa vontade, logicamente, tanto da Câmara quando do Senado”, acrescentou o deputado.
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