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Segundo os promotores do Ministério Público, a dupla usava os atestados médicos falsificados para abonar suas próprias faltas e se apropriava de remédios que deveriam ser distribuídos pelo posto de saúde à população. Os dois se utilizavam de carimbos de médicos da Secretaria para falsificar atestados médicos e de comparecimento, além de receitas de medicamentos.
De acordo com o promotor de Justiça da Saúde, Luis Henrique Ishihara, a dupla teria falsificado, no início do ano, assinatura de um médico que deixou a rede pública em 2001. A operação investiga os suspeitos a cerca de três meses e já concluiu que os dois atuam no esquema há pouco mais de dois anos. Em seis meses, a dupla abonou, com atestados médicos e de comparecimentos, emitidos por eles mesmos, cerca de 17 faltas para cada um. Como atestado de comparecimento pode ser assinado por enfermeiros, um assinava o atestado do outro e grande parte das bonificações eram realizadas por atestados de comparecimento.
No caso da falsificação com carimbo e assinatura de médicos, a prática também era facilitada pela ausência de fiscalização. Os atestados, por serem de comparecimento, não são encaminhados para fiscalização da corregedoria. “O documento fica na origem, no local de trabalho dele, e não há necessidade de ser investigado. Por isso a dificuldade em ser fiscalizado, pois não há exigência de emissão do documento para a corregedoria. Isso justifica a prática maior com atestados de comparecimento”, justificou.
Para Maurício Miranda, promotor de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários dos Serviços de Saúde (Pró-Vida), a emissão dos atestados dentro do próprio local de trabalho já evidencia a fraude. “Temos certeza de que muitos profissionais se afastam com justificativa, mas uma grande quantidade se afasta através da fraude. Se todos esses profissionais trabalhassem dentro da legalidade não haveria carência na prestação de serviços de saúde à população”.
De acordo com os promotores, há outras pessoas envolvidas e que ainda estão sendo investigadas. Pelos crimes até então identificados, a dupla poderá responder por falsidade ideologia, inserção de dados falsos no sistema de informática, uso de atestado falso e peculato.
Os médicos que constavam nos atestados já foram chamados para prestar esclarecimento e negaram que o carimbo e a assinatura fossem deles. Durante os depoimentos, apenas um dos médicos reconheceu sua assinatura e assumiu ter emitido o documento sem realizar o atendimento. “Isso configura fato grave administrativamente e a nível penal e ético”, disse o promotor de Justiça Criminal.
Horas extras e política
Apesar da quantidade de faltas justificadas por atestados, a enfermeira Daniela Toledo registrou 402 horas extras em cinco meses de trabalho. “Isso gera um passivo enorme ao patrimônio do DF. A falta de fiscalização é o que leva à prática do tipo de conduta”. De acordo com o delegado Alexandre Nicolau, que acompanha o caso, “todos os indícios apontam para uma prática generalizada, que se dissemina pela ausência de uma fiscalização mais efetiva”.
Sobre as receitas, Miranda afirmou que há evidências da utilização de receitas na última campanha política do Distrito Federal. “Foram distribuídos medicamentos para eleitores. Isso é um fato grave, que foi descoberto hoje. Nós já temos provas de que medicamentos do Sistema de Saúde foram utilizados na campanha passada”. De acordo com ele, o fato sugere a participação de médicos e políticos. A polícia investiga ainda se os remédios retirados do posto de saúde também eram revendidos.
A operação desta quinta-feira (8) foi batizada de Trackare em alusão ao nome do sistema informatizado da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, software onde são lançados os serviços de atendimentos médico e enfermagem. A ação está sendo conduzida pela 4ª Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde (Prosus) e da Promotoria de Justiça Criminal de Defesa dos Usuários da Saúde (Pró-Vida), com apoio da Delegacia de Combate aos Crimes contra a Administração Pública (Decap).