A quebra de sigilo de e-mail do ex-procurador Marcello Miller revelou um manual de delação, com orientações direcionadas aos executivos e advogados da JBS, sobre como se portar para fechar acordo de delação com a Procuradoria-Geral da República (PGR). As informações foram publicadas nesta quarta-feira (8) pelo jornal Folha de S. Paulo.
Em e-mail datado de 9 de março de 2017, do qual os repórteres Camila Mattoso e Ranier Bragon tiveram acesso, sob o assunto “segundo roteiro de reunião”, Marcelo Miller faz um questionário com perguntas que devem ser feitas pelos delatores à PGR com objetivo de conseguir sucesso nas negociações. O e-mail foi escrito dois dias depois do empresário Joesley Batista gravar o presidente Michel Temer (PMDB) em encontro secreto no Palácio do Jaburu. O passo a passo foi encaminhado pelo próprio Miller para o seu e-mail pessoal, às 8h16 daquele dia.
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“Estamos trazendo pela primeira vez BNDES, que era a última caixa-preta da República, estamos trazendo fundos, Temer, Aécio, Dilma, Cunha, Mantega e, por certo ângulo, também Lula. Temos elementos muito sólidos de corroboração”, diz trecho do e-mail escrito possivelmente por Miller, que mais adiante escreve como eles devem justificar.
“Queríamos insistir com vocês na assinatura de um acordo de confidencialidade, para detalharmos os assuntos e iniciarmos a apresentação dos anexos. Queríamos que o Brasil e o MPF saíssem na frente”, diz o texto orientado por Miller.
Sobre os e-mail, Miller afirma ter feito apenas “reparos linguísticos e gramaticais”. As delações da JBS começaram a ser questionados por advogados de Michel Temer, que apontaram suspeitas sobre Miller ter advogado para os empresários, trabalhando na delação, quando ainda estava no Ministério Público Federal (MPF).
Ao jornal, os advogados de Marcello Miller disseram que ele “nunca atuou na negociação da delação premiada, não conduziu tratativas da J&F com a PGR sobre o assunto e tampouco tinha informações privilegiadas a esse respeito obtidas no exercício da função pública”.
Gravação acidental
Em diálogo gravado acidentalmente entre Joesley Batista e o executivo Ricardo Saud, entregue à PGR – que culminou na suspensão dos efeitos das delações e nas prisões dos empresários –, os dois delatores admitem que utilizavam Miller como ponte para se aproximar do então procurador-geral da República, Rodrigo Janot. Na data da gravação, possivelmente 17 de março, Miller ainda não havia se desligado do Ministério Público.
Miller passou a atuar no escritório Trench, Rossi & Watanabe Advogados, do Rio de Janeiro, contratado pela JBS para negociar a leniência, acordo na área cível complementar à delação. A decisão de Miller de deixar o Ministério Público Federal e partir para a área privada da advocacia veio a público em 6 de março, véspera da conversa entre Joesley Batista e Michel Temer, gravada no Palácio do Jaburu.
O ex-procurador era um dos principais auxiliares de Rodrigo Janot no grupo de trabalho da Lava Jato até março deste ano. Assim que as delações vieram à tona, a PGR foi obrigada a esclarecer que Marcelo Miller, hoje advogado, não assessorou Joesley nas negociações com os antigos colegas no caso da delação premiada. No entanto, na ocasião, confirmou que ele atuou no acordo de leniência da JBS.
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