Cezar Barbosa, Uniceub
Os problemas da superlotação
Segundo o Infopen — Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias — de 2014, a população prisional brasileira era de 607.731 internos para uma área com capacidade para 376.669 pessoas.
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No Distrito Federal, existem seis centros penitenciários com capacidade para 7.395 internos. Mas estão, atualmente, nos presídios, 15.742 pessoas. Alan Guimarães Esteves, 29 anos, experimentou a vida no Centro de Detenção Provisória e na Penitenciária do DF II (PDF II), quando condenado, em 2010.
Preso no regime semiaberto, Alan conta que direitos são restringidos pela superlotação: “É por causa da administração. Rigoroso, extremamente rigoroso. Rigoroso mesmo. É superlotado, banho de sol limitado”. Ele ficava em uma cela de aproximadamente sete metros por 10, oito camas para 23 pessoas. O único banheiro da cela, em frente ao corredor dos policiais, deixava o preso exposto na hora do uso. Nesse regime, os internos ficam presos o dia todo, com saídas a cada 48 horas, para o banho de sol de 30 minutos.
“Entre as muitas coisas, eu vi preso que tinha tiro no pulmão, com dificuldade na respiração passar mal, e policial, em dia de domingo, quando eles jogam não atender, mandar ele parar de reclamar. Ele só precisava ir pro posto de saúde da própria prisão”, relembra Alan sobre a experiência com um colega de cela.
No PDF II, às vezes, a comissão de Direitos Humanos da OAB, outras vezes, o conselho de Direitos Humanos do Distrito Federal entram nos presídios para verificar se os direitos dos internos estão sendo respeitados. Os presos são convidados para conversar com o conselheiro ou advogado, na tentativa de expor parte do que se passa nos centros de detenção. Segundo Alan, alguns agentes penitenciários descobrem quem se levantou e, após a saída dos defensores dos direitos, levam o preso ao pátio. O detento afirma que eles usam um bastão de madeira escrito “Direitos Humanos”, para deixar marcas no corpo do interno e lembrá-lo de não relatar novamente os problemas.
Pela Constituição, o responsável pela fiscalização dos casos de tortura dos agentes penitenciários é o Ministério Público, titular do controle externo da atividade policial. Segundo a professora Carolina Ferreira, há brecha para tortura nos presídios por diversos motivos, e um deles é o fato de os representantes do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) não irem aos centros penitenciários para ouvir os detentos.
O MPDFT, em nota, informou que faz vistorias mensais, sem agendamento prévio, nos centros penitenciários. “Sempre que o preso é ouvido pelo MPDFT e relata riscos à sua integridade física, a instituição entra em contato com o sistema prisional e pede que seja resguardada a sua integridade”.
Alan acredita que a tortura e a violência arbitrária têm o aval da administração, porque a prática é indiscriminada e não velada dentro da prisão: “Todos que estão lá dentro sabem o que acontece. E isso continua acontecendo, a tortura ainda existe. A administração sabe e deixa esses casos acontecerem”.
Atualmente, há agentes penitenciários denunciados por tortura. Existem processos em andamento contra eles, mas o MPDFT não divulgou quantos são esses processos, tampouco quem são os policiais denunciados.
Hoje, Alan Guimarães mora no Areal. De sua casa, a vista da região é muito mais ampla que a limita pelas grades.
Tantos mil à espera da Justiça
A falência do sistema passa pela demora em julgar o acusado. No Brasil, 84% dos presos são provisórios, ou seja, ainda não foram condenados à prisão, apesar de estarem no local.
No Distrito Federal, entre junho e agosto deste ano, 30 mil pessoas foram detidas pelas Polícias Civil e Militar. Muitas fazem parte dos 3.648 internos do CDP. Enquanto são detidos e presos pelas autoridades policiais, o Tribunal de Justiça do DF demora em julgar os casos. No mesmo período da atuação das polícias, foram concluídos 3.821 casos, com 2.961 pessoas condenadas, 642 absolvidas e 218 absolvidas/condenadas em parte.
De acordo com o ministro Cezar Peluso, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 70% dos internos são reincidentes. Este número, segundo a professora Carolina Ferreira, dificilmente é comprovado, porque a rotatividade é muito grande. Em Brasília, por exemplo, um camburão com presos provisórios é levado, às segundas e sextas-feiras, da Delegacia de Policia Especializada ao Centro de Detenção Provisória. Trata-se de um dado que varia o tempo todo, e cada recorte de tempo e espaço é muito específico, o que dificulta a clareza da informação.
Um grupo de pesquisa da Universidade de Brasília fez um estudo sobre reincidência criminal no ano de 2008, e acompanhou a vida de 261 pessoas julgadas pelo sistema de justiça. O resultado mostra que o retorno ao crime é maior quanto mais grave for o regime.
A experiência na prisão não fez de Alan um homem melhor: “Na verdade é uma escola do crime, né. Porque a pessoa entra sem saber algumas coisas e sai mais malicioso. Na verdade, ela entra uma pessoa e sai outra, pior do que entrou”. Esse é o motivo dele acreditar que o encarceramento não dá mais segurança à sociedade, e que o atual sistema penitenciário se vinga de quem cometeu o crime ao invés de preparar a pessoa para ser reinserida na sociedade.
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