Fábio Góis
O presidente do Conselho de Ética, Paulo Duque (PMDB-RJ), arquivou nesta sexta-feira (7) quatro representações e três denúncias que foram protocoladas no colegiado contra o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), e ainda aguardavam apreciação. Os despachos, que foram entregues por um assessor do peemedebista à Secretaria Geral da Mesa, foram distribuídos aos 15 membros titulares do conselho. Das sete restantes, duas representações eram do Psol e outras duas do PSDB, além de três denúncias feitas pelo líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM) – duas das quais subscritas por Cristovam Buarque (PDT-DF).
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A partir da data do protocolo na Secretaria Geral, os responsáveis pela apresentação das ações têm dois dias úteis para contestar o arquivamento. Segundo o regimento interno, as representações, uma vez acatadas pelo presidente e aprovadas pelo plenário do Conselho, levam imediatamente à abertura de processo contra o representado, cujo rumo é decido em plenário. No caso das denúncias, um processo de investigação é iniciado no âmbito do colegiado, podendo não resultar em abertura de processo.
Para contestar a procedência regimental das peças, os despachos de Duque se valem do argumento-modelo segundo o qual “não foi anexado nenhum documento de qualquer espécie na representação/denúncia e todas as informações nela contidas são atribuídas a notícias de jornal”. Em todos os sete casos, Duque justifica os arquivamentos com duas fundamentações jurídicas:
– a ilicitude das provas apresentadas – inadmissibilidade de sua produção em juízo (ou perante qualquer instância de poder); idoneidade jurídica da prova resultante de transgressão estatal ao regime constitucional dos direitos e garantias individuais;
– e a doutrina jurídica dos frutos da árvore envenenada – a questão da ilicitude por derivação.
A oposição recebeu a notícia do arquivamento com naturalidade, e já deu o tom do que os despachos de Duque provocarão na próxima semana. “Não é surpresa nenhuma. Seria surpresa se ele tivesse um pouco de bom senso naquela cabeça. Aí seria uma surpresa agradável”, disse Demóstenes Torres (DEM-GO), membro titular do Conselho de Ética e presidente da Comissão de Constituição e Justiça, onde tramitam projetos sobre votação aberta, no plenário do Senado, em processos sobre quebra de decoro parlamentar.
O senador Alvaro Dias (PSDB-PR) não é membro do Conselho, mas, na condição de um dos principais críticos de Sarney no Senado, esteve em Brasília hoje e diz também não ter ficado surpreso com a conduta de Duque. “Nenhuma surpresa, já era esperado. Ele cumpre uma missão de botar panos quentes em todas as denúncias. A oposição vai recorrer e, se precisar, ao plenário do Senado”, disse o tucano, lembrando que, no plenário do colegiado, a votação é aberta. “Temos que ir até as últimas consequências, até o julgamento.”
Na audiência da última quarta-feira (5), quando o Conselho de Ética arquivou as primeiras representações e denúncias, Duque reagiu da seguinte maneira ao senador Renato Casagrande (PSB-ES), que o chamou de “arquivador-geral do Senado”. “Arquivador, eu? Isso não foi nada! Ainda tem mais umas 20 representações para despachar.”
Teor
Os sete pedidos de investigação arquivados têm teor próprio, embora alguns se assemelhem no tipo de denúncia (objeto). No primeiro despacho, que trata da representação apresentada pelo Psol ao Conselho, aponta-se “supostas irregularidades cometidas” por Sarney “com relação ao seu patrimônio e à administração” da Fundação José Sarney, no Maranhão, da qual o presidente do Senado é patrono. “(…) Assim como o Supremo Tribunal Federal [STF], o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara Alta do Congresso Nacional não pode ser utilizado como instrumento para aparelhar representações vazias com mera pretensão eleitoral, baseadas apenas em recortes de jornal cuja fonte e intenção ninguém sabe qual é”, diz trecho do despacho, citando jurisprudência do STF.
A segunda representação, ajuizada no Conselho pelo PSDB, dispunha sobre o “substrato fático” do suposto envolvimento de Sarney na edição de atos administrativos secretos no Senado, que teriam beneficiado o senador e seus aliados. “(…), o presente pedido encarna uma nulidade, uma vez que se baseia, também, em gravações de conversas telefônicas que constam de processo que tramita em segredo de justiça e cuja divulgação é absolutamente ilícita”, defende Duque, entre outros argumentos.
No terceiro arquivamento, Duque contesta a procedência da representação apresentada também pelo PSDB, cujo teor é semelhante à primeira peça (Psol): a suposta participação de Sarney em desvio de recursos públicos pela Fundação José Sarney, em que verba da Petrobras teria sido repassada à instituição, na forma de patrocínio, sem que tivesse recebido a devida destinação. “(…) se busca, aqui, o julgamento de um parlamentar por seus pares – parlamentar esse que foi ungido pela vontade popular e que, por isso mesmo, deve ter asseguradas todas as garantias formais e materiais, a fim de evitar a perseguição arbitrária ao exercício de suas atividades”, justifica Duque.
A quarta pela rejeitada por Duque é a denúncia em que, individualmente (sem chancela do partido), o líder do PSDB no Senado, Arthur Virgílio (AM), e Cristovam Buarque (PDT-DF) acusam Sarney de fraude fiscal na venda de terras de sua propriedade, em 2002. “(…) os atos supostamente praticados pelo denunciado eventualmente poderiam caracterizar desvios de natureza fiscal, matéria que não é da competência deste Conselho”, diz trecho do despacho.
Na quinta peça, denúncia individualmente apresentada por Virgílio, Sarney é acusado de envolvimento na nomeação, por meio de ato clandestino (“não publicado”), de Henrique Dias Bernardes. Lotado no serviço médico do Senado, Henrique namorava uma das netas de Sarney à época da contratação. A exemplo da segunda representação (PSDB), Duque aponta a “nulidade” do requerimento com base na divulgação ilegal de diálogo telefônico, constante de processo que tramita em segredo de justiça.
Na sexta peça rejeitada, também subscritas por Virgílio e Cristovam, Duque considera inconsistente a denúncia de que Sarney teria utilizado um servidor da Polícia Federal para fraudar informações sigilosas, referentes a investigações sobre negócios da família Sarney. “Não pode este Conselho ser nem instrumento de ação político-partidária, nem substituir o eleitor em sua decisão soberana como titular do poder, do qual o Congresso Nacional nada mais é do que delegado”, considera Duque, também destacando violação de segredo de justiça.
Por fim, Duque rejeita a representação do Psol segundo a qual Sarney teria participado de diversas irregularidades administrativas no Senado e, como demonstrariam “degravações de supostas conversas (…) com seus familiares”, cometido ingerência na nomeação de servidores. A peça foi apensada à primeira apresentada pelo partido. “O presente pedido (…) não sana os vícios da representação inicial, uma vez que se limita a solicitar a juntada de recortes de jornal, (…)”, argumento o despacho, com nova menção à quebra de privacidade judicial.
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