A noite de ontem (19) já estava perto de terminar quando a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, divulgou uma nota à imprensa. Na nota, ela dizia não ter qualquer responsabilidade pelo fato de o senador Vital do Rego (PMDB-PB) ter incluído em seu relatório uma proposta feita por ela quando era senadora, que visava beneficiar Santa Catarina, entre outros estados, na partillha dos royalties de petróleo. A proposta acabou retirada ao final da votação de ontem, em que foi aprovado um novo critério de distribuição dos royalties, que beneficia os estados não produtores, em detrimento daqueles onde se encontram os poços de petróleo. A preocupação de Ideli Salvatti dá a medida da temperatura política em que o tema foi aprovado no Senado. Responsável pela negociação do governo com o Congresso, Ideli não queria de jeito nenhum passar a impressão de que pretendia de alguma forma se beneficiar com a discussão.
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Na nota, Ideli dizia três coisas: não teve “responsabilidade e nem gerenciamento pelo acolhimento de um projeto de sua autoria quando era senadora da República”; “nunca solicitou” que a proposta fosse incluída, e “o tema não foi tratado no governo”. Administrar a inclusão de seu projeto no relatório de Vital do Rego foi uma das dores de cabeça de Ideli durante a confusa e tensa discussão do projeto sobre a distribuição dos royalties do petróleo. O substitutivo de Vital do Rego, ao projeto original do senador Wellington Dias (PT-PI), que estabelece critérios para uma paulatina modificação da distribuição dos royalties do petróleo para que passe a ser nacional em 2020, nos mesmos moldes da distribuição dos recursos dos Fundos de Participação dos Estados (FPE) e dos Municípios (FPM), foi aprovado ontem à noite no Senado e segue agora para a Câmara num clima há muito tempo não visto de disputa regional. Maioria, os estados que não produzem petróleo conseguiram impor no Senado sua vontade. Mas os estados produtores prometem levar a briga até as últimas consequências. E isso pode significar respingos em outras votações de interesse do governo. Daí a preocupação de Ideli.
Os representantes dos estados produtores – especialmente Rio de Janeiro e Espírito Santo – prometem apelar à presidenta Dilma Rousseff para que vete o projeto. Caso não consigam, prometem ir até o Supremo Tribunal Federal lutar por seus direitos. Para o governo, porém, o risco maior é de retaliações que atinjam a tramitação de outros projetos de seu interesse. Na Câmara, antes mesmo de o projeto chegar para a apreciação, deputados dos estados produtores já iniciaram uma tática de obstrução, que obrigou o governo a convocar suplentes de comissões para que discussões não ficassem prejudicadas. Está na pauta hoje uma votação complicada: a PEC que prorroga a vigência da Desvinculação das Receitas da União (DRU). E é nesse clima de guerra de secessão que ela será apreciada.
Divisão da base
A discussão dividiu a base do governo. A tal ponto que o principal líder da resistência ao projeto foi um senador do PT, Lindbergh Farias (RJ). E do outro lado da linha, como autor original da proposta, estava outro senador do PT, Wellington Dias. O governo fez de tudo para não se posicionar na discussão, mas agora terá um pepino pela frente. Se não houver modificação na Câmara, caberá a Dilma decidir se manterá ou vetará a regra de distribuição proposta pela dupla Vital do Rego/Wellington Dias. Se Dilma mantiver a regra, levará seus aliados do Rio e do Espírito Santo a irem ao STF contra a sua decisão. “Fizemos de tudo para evitar a judicialização do processo, mas não quiseram nos dar ouvidos”, afirmou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ). Na avaliação dos representantes dos estados produtores, a perda estimada para estes estados com a proposta de Vital do Rego/Wellington Dias é de R$ 3,6 bilhões apenas no ano que vem.
Entenda a briga
O texto apresentado pelo senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) propõe a alteração do quanto é cobrado das petroleiras e de como esse dinheiro recolhido deve ser distribuído entre a União, Estados e municípios. Até hoje, essa distribuição beneficia fortemente os estados nos quais estão localizados os poços de petróleo. Partia-se do princípio de que a exploração do petróleo afeta esses estados, ambientalmente e em outros aspectos. A descoberta da imensa reserva do pré-sal levou à ideia de que tais critérios precisavam ser rediscutidos. Essa imensa riqueza – com potencial para tornar o Brasil um dos maiores produtores de petróleo do mundo – precisava ser dividida de outra forma. Tratava-se, por esse entendimento, de um patrimônio nacional, e não apenas dos estados em cuja costa está o pré-sal. Por esse critério, os estados não-produtores passam a receber um percentual maior, enquanto os produtores perdem parte do que ganham atualmente. Para explorar o petróleo no país, as empresas petrolíferas pagam os royalties e também a chamada participação especial à União, uma porcentagem dos lucros cobrada das empresas com maior produção.
O senador Wellington Dias (PT-PI), autor do PLS, sustenta que hoje 80% dos recursos ficam com os estados produtores e que, pela Constituição, esses recursos pertencem a todos os estados e municípios. De acordo com o relator, em 2010, os royalties e a participação especial geraram, em conjunto, quase R$ 22 bilhões. Em sua estimativa, esse número pode chegar a R$ 60 bilhões em 2020. “Cenários mais otimistas chegam a prever até R$ 100 bilhões anuais na virada da próxima década. Não se pode permitir que esse volume de recursos seja concentrado em poucos estados e municípios”, alegou Vital do Rêgo Filho.
O problema é que, por enquanto, o petróleo do pré-sal é uma aposta de futuro, que no momento continua no fundo do mar sem possibilidade de exploração. A proposta de Vital do Rego faz previsões de faturamento futuro que, na avaliação dos estados produtores, não se sustentam, estão superestimadas. Daí, o risco de grande perda de receita com o qual os estados produtores não querem arcar.
Uma das estratégias da bancada fluminense foi a apresentação de um contra-projeto do senador Francisco Dornelles (PP-RJ), que garantiria mais recursos para estados não-produtores, mas retiraria recursos da União e das petroleiras, ao invés de retirar dos estados produtores. Aí, foi a vez do governo não querer a versão que lhe garante menos recursos. Assim, a proposta foi rejeitada pelo plenário por 45 votos contrários e 20 a favor. Os produtores receberam o apoio do PSDB e o DEM nesta questão.
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Colaborou Fábio Góis
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