O deputado federal Flaviano Melo (MDB-AC) usou parte da sua cota parlamentar, referente ao mês de julho do ano passado, com fretamento de uma aeronave para visitar municípios do Acre. Em cinco dias, o deputado percorreu oito cidades dos vales do Purus e Juruá. O voo foi fretado pela empresa Ortiz Táxi Aéreo LTDA ao custo de R$ 38,6 mil. Atualmente, por mês, cada parlamentar tem direito a uma verba que varia de R$ 35 mil a 45 mil, segundo a distância de cada estado, para “custear gastos exclusivamente vinculados ao exercício da atividade parlamentar”.
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No Acre, cada deputado tem direito a R$ 44.632,46 mil de reembolso por mês. A viagem, até então, seria apenas mais uma paga pelos cofres públicos de forma regular não fosse o fato de o congressista ter levado caronas na aeronave, pessoas sem qualquer vínculo com a Câmara dos Deputados. Pelas regras do Regimento Interno da Casa, no caso de locação de aeronave com dinheiro do cotão, apenas o parlamentar, seus assessores e secretários devidamente registrados como servidores da Câmara podem usufruir do benefício.
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O deputado Flaviano deu carona à deputada estadual Eliane Sinhasique (MDB) e ao dirigente do MDB no estado Pádua Bruzugu. A locação ocorreu entre os dias 25 e 29 de julho de 2017, mesmo período em que Flaviano e Eliane Sinhasique postaram em seus perfis no Facebook, e até em sites próprios, os “feitos” nos municípios.
Pelas regras do Art. 2º, item XIV, § 1º do Regimento Interno da Câmara, que trata de despesas com fretamento de aeronaves, nesse tipo de viagem o parlamentar pode ser acompanhado “por assessores, assim entendidos os servidores efetivos, os ocupantes de cargos de natureza especial ou secretários parlamentares vinculados à Câmara dos Deputados”.
A assessoria de Flaviano Melo afirmou ao Congresso em Foco que não se tratava de uma “comitiva” e ressaltou que a única pessoa que viajou com o parlamentar e que não é lotada no gabinete dele era a deputada estadual Eliane Sinhasique. No entanto, ponderou que a deputada “é uma extensão do mandato de Flaviano Melo” no estado do Acre.
Comitiva noticiada
No entanto, no site do próprio congressista, no registro relativo à sua passagem por Santa Rosa e Jordão, o grupo é intitulado por “comitiva” de Flaviano”, como mostra a imagem reproduzida ao lado. “Flaviano e sua comitiva chegaram ao município de Jordão”, diz trecho da matéria publicada pela assessoria do deputado à época.
“A única pessoa que não é lotada no gabinete dele [Flaviano Melo], e que estava a bordo daquele voo, é a deputada estadual do PMDB, que é praticamente a extensão do mandato dele lá”, justificou a assessoria.
No entanto, além da deputada estadual, conforme registros da própria Câmara sobre funcionários do quadro, o nome de Pádua Bruzugu, na verdade Antonio de Pádua Vasconcelos da Cunha, não está entre os assessores do congressista. De acordo com informações do próprio partido, Pádua é o 2º tesoureiro do MDB no Acre.
“As outras duas pessoas que estavam com ele são lotadas, são funcionários, são articuladores políticos dele e estavam lotadas no gabinete dele”, ponderou a assessoria, que também ressaltou que o fato de ter levado a deputada estadual junto não modificaria o preço do voo.
“O valor da aeronave é o mesmo, eles não reduzem preço por pessoa. É a gasolina. Esse é o mesmo valor. Independente dele estar sozinho ou acompanhado por seus funcionários. Então a única pessoa fora do gabinete em si, sem ser funcionários, é a deputada estadual que é do mesmo partido dele e como se fosse a extensão. Ele faz aqui federal e ela faz lá regional”, justificou.
Câmara não responde
A reportagem procurou o Departamento de Finanças, Orçamento e Contabilidade da Câmara para questionar quais critérios são adotados para fiscalizar o tipo de gasto, mas até o fechamento da matéria o setor ainda não havia retornado o contato. O departamento é o responsável pela gestão da cota parlamentar.
O caso foi descoberto pela Operação Política Supervisionada (OPS), organização da sociedade civil conhecida por fiscalizar o uso de recursos públicos e, em especial, da verba indenizatória. Até o momento, segundo a própria OPS, mais de R$ 5,7 milhões já foram poupados desde o início de suas atividades, em 2013.
Nas suas andanças pelo estado do Norte, entre outras coisas, o parlamentar visitou prefeituras, participou de reuniões do MDB nos diretórios municipais por onde passou, deu entrevistas em rádios locais ao lado da deputada estadual e sua convidada na comitiva, Eliane Sinhasique, visitou associações, órgãos públicos e falou com eleitores.
Canal Pornô
Em 2014, conforme este site mostrou na época, Flaviano Melo foi um dos três parlamentares da Casa que aproveitaram as benesses da cota para contratar pacotes especiais de televisão fechada com mais de cem canais à disposição, dezenas deles em alta definição, com instalações em seu gabinete e até em sua casa. É de se imaginar que o interesse das excelências seja por notícias ou programas culturais. Mas há campeonatos de futebol e até canal pornô no conteúdo pago com o dinheiro do contribuinte.
Entre as contratações, na ocasião, os parlamentares aderiram às ofertas das operadoras, que previam até a abertura do sinal dos chamados “canais adultos”. Houve ainda compra de filmes e campeonatos de futebol no sistema pay-per-view (pague para ver, em tradução livre). Flaviano Melo, que atualmente está em seu terceiro mandato, contratou o pacote mais caro da Sky, com serviços complementares e ampla oferta em transmissões de futebol. O pacote escolhido pelo deputado foi o “Combo Sky HDTV Full Top”.
Naquele ano, o parlamentar disse ao Congresso em Foco ter havido confusão no instante em que o serviço foi instalado. O peemedebista admitiu que os canais estavam à disposição tanto na Câmara quanto em sua casa. “Já ressarci isso. Pedi à Câmara para me informar o valor que foi gasto com isso [canais extras]. Foi um erro meu? Foi. Mas foi um erro involuntário. Quando me alertaram, vi e corrigi. Nem estão debitando mais [na conta da Sky]”, declarou ao site na época.
Cotão
No Ato da Mesa Diretora nº 43, que institucionalizou a Cota para o Exercício da Atividade Parlamentar, em junho de 2009, registra-se que a verba é “destinada a custear gastos exclusivamente vinculados ao exercício da atividade parlamentar”. Entre as descrições de serviços e produtos designados como necessários a tal atividade está a assinatura de TV a cabo “ou similar”, sem restrições de canal ou tipo de programação. Os valores são pagos aos congressistas na forma de reembolso mediante apresentação de comprovantes de pagamento.
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