O deputado Alberto Fraga (DEM-DF) é conhecido como defensor das famílias. Mas dedica atenção especial à própria. Para ajudar ainda mais os seus familiares, o parlamentar burlou a lei que proíbe o nepotismo até o quarto grau e criou uma fórmula engenhosa para empregar a filha Bruna Brasil Fraga e o genro João Ribeiro da Silva Neto no próprio gabinete. Até um disfarce é utilizado para encobrir a ilegalidade.
O casal dá expediente no gabinete de Fraga, mas seus registros funcionais são de outros lugares. A filha Bruna é lotada oficialmente no gabinete de outra Casa legislativa, o Senado. O seu registro de trabalho, com direito a crachá e tudo, é na primeira-secretaria, como assistente parlamentar júnior. O cargo parece de estagiário, mas tem salário de R$ 10 mil.
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O gabinete onde Bruna conseguiu ser registrada é dirigido pelo senador Vicentinho Alves (PR-TO). Amigo do deputado Fraga, o senador exerceu o cargo de primeiro-secretário nos últimos dois anos, uma espécie de prefeito da instituição (a próxima composição da Mesa Diretora, depois da eleição de Eunício Oliveira como presidente do Senado, ainda está indefinida). O parlamentar cuidava de toda a infraestrutura para o funcionamento dos gabinetes, comissões e plenário.
Em nota, o Senado afirmou que Bruna Brasil “encontra-se lotada na Diretoria-Geral, com exercício na Primeira-Secretaria do Senado Federal”. Ressaltou, ainda, que “aos servidores do Senado é permitido prestar serviços em qualquer órgão ou unidade da Administração Pública, desde que formalmente requisitados e cedidos”. Bruna, porém, é lotada em um cargo comissionado.
O chefe de gabinete da Primeira-Secretaria do Senado à época em que Vicentinho Alves ainda chefiava o órgão, Fernando Damasceno – identificado por Bruna Brasil como seu superior no Senado – afirmou ao Congresso em Foco que “não é permitido a ela trabalhar nas dependências da Câmara dos Deputados, exceto quando estiver tratando de demandas institucionais da Primeira-Secretaria”. Damasceno ressaltou, porém, que Bruna “eventualmente cuida de demandas institucionais da Primeira-Secretaria junto a órgãos da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados”.
Codinome
PublicidadeEm várias oportunidades a reportagem procurou Bruna no seu local oficial de trabalho no Senado, sem sucesso. Bruna é encontrada diariamente no gabinete do pai. E vai secretamente. Para não deixar rastros do seu drible na lei que proíbe o nepotismo, quando está trabalhando no gabinete do pai Bruna assume a personalidade de Andressa.
Quando atende eleitores e até pessoas que não a conhecem e vão ao gabinete do pai Bruna se identifica como Andressa. Ao telefone também. Mas a personagem de Bruna existe. É Andressa Lilian Nascimento Delporto Arantes e está registrada na Câmara como secretária parlamentar e salário de R$ 2,2 mil. Para não criar muita confusão no disfarce, Bruna manda Andressa realizar intermináveis trabalhos externos.
A reportagem do Congresso em Foco acompanhou a rotina no gabinete do parlamentar por duas semanas. Bruna chega segunda-feira cedo na Casa. Ela não costuma andar com seu marido pelos corredores. Em uma terça-feira (13 de dezembro), dia da votação em segundo turno da PEC do Teto de Gastos no Senado, Bruna ficou no gabinete até às 12h30, quando saiu para almoçar com seu pai (veja vídeo abaixo). João Ribeiro saiu depois da esposa pela escada de emergência do quinto andar do Anexo 4 da Câmara dos Deputados.
Assessor informal
Bruna e João Ribeiro se casaram no dia 20 de agosto do ano passado. Até então, Ribeiro era funcionário do gabinete de Fraga. Após o matrimônio, no dia 23 do mesmo mês, ele, que é formado em Administração de Empresas, foi exonerado do cargo de secretário parlamentar – que lhe rendia cerca de R$ 12 mil mensais na Câmara dos Deputados.
João, porém, continua frequentando a Casa como assessor informal do deputado. Ele tem mesa de trabalho, computador e acesso livre às dependências da Casa. Segundo a assessoria de Fraga, Ribeiro frequenta a Câmara dos Deputados porque “cuida dos negócios e da fazenda do parlamentar”.
Após ser formalmente exonerado do cargo de confiança na Câmara, João Ribeiro deu lugar à funcionária Cristiane Silva. Ao contrário de Ribeiro, tido como um dos mais dedicados funcionários do gabinete ainda nos dias de hoje, Cristiane não costuma dar expediente na Casa. Vai ao gabinete principalmente às terças e quartas e fica até 21h. Cristiane e o casal recém-casado são amigos próximos. As redes sociais dos três provam a relação.
Fantasma
Cristiane trabalha como bibliotecária em um colégio particular no Lago Norte, bairro nobre de Brasília, nos turnos matutino e vespertino – segundo o departamento de Recursos Humanos da instituição. A reportagem foi até a escola e comprovou a presença da secretária parlamentar na biblioteca no horário em que deveria estar na Câmara dos Deputados.
Procurada, Cristiane confirmou que faz duplo expediente. Um na Câmara e outro na biblioteca da escola onde trabalha. E explicou: “Realmente eu trabalho no gabinete. Entrei em setembro pra trabalhar nas mídias sociais junto com a Camila (Calazans) e Agência Xeque Mate, e como faltavam poucos meses pras (sic) férias, combinei de ficar trabalhando online e pós expediente até o fim do ano…que no caso é agora.”
Disse que seu horário é “flexível” e que sai da escola onde trabalha quando precisa. “Se não precisar, fico lá (na Câmara) o dia todo sim, mas meu contrato é de 6h”, disse. Cristiane sabe que não é legal o que está fazendo. E avisou: “Vou sair e ficar apenas com o deputado. Faço pesquisas, monitoro o nome dele na mídia e etc e também recebo as demandas do deputado às terças/quartas”.
Sobre o alto salário (cerca de R$ 13 mil), fora dos padrões de quem monitora de redes sociais na Casa, Cristiane respondeu: “O que eu recebo pelo serviço que eu presto é de acordo com a minha capacidade”. Há suspeita de que ela repasse parte da verba para o genro do deputado, porém a reportagem não confirmou a versão.
Reincidente
Político em franco crescimento no cenário local e aspirante a cargos mais altos nas eleições de 2018, Fraga já se envolveu em caso parecido em 2009. Na ocasião, foi denunciado pelo jornal Folha de S. Paulo que Fraga, enquanto foi secretário de Transportes do DF, usava o suplente para empregar parentes. À época, João Ribeiro da Silva Neto também esteve envolvido.
Fraga é um dos maiores opositores do governador do Distrito Federal, Rodrigo Rollemberg. Com o bordão “governador, respeita o povo”, o parlamentar – integrante da bancada da bala no Congresso Nacional – pede melhorias principalmente na segurança da cidade.
Outro lado
A assessoria do deputado Fraga confirma que Bruna Brasil “está sempre” pelo gabinete do pai. Porém, prefere não comentar as funções dela no Senado, que são de responsabilidade da Primeira-Secretaria.
Em nota, Fraga comentou também a situação de Cristiane Silva, nomeada logo depois da saída de João Ribeiro. “Cristiane Silva contribui com as atividades parlamentares internas e externas, cumprindo jornada de 8 horas diárias”, diz o texto. “A servidora trabalha com o parlamentar desde a sua primeira campanha, em 1998, coordenando a equipe externa e auxiliando no monitoramento das redes sociais do deputado”, complementa.
Veja a íntegra da nota do deputado Alberto Fraga:
“O deputado Alberto Fraga (DEM-DF) informa que não há nada de ilegal na nomeação da referida servidora ou que desabone sua conduta. Cristiane Silva contribui com as atividades parlamentares internas e externas, cumprindo jornada de 8 horas diárias – conforme artigo 9o. Ato Mesa Nº 72, DE 16/09/1997. O ato diz que a jornada de trabalho dos ocupantes de cargo em comissão de Secretário Parlamentar é de 40 horas semanais, cumpridas em local e de acordo com o determinado pelo titular do gabinete.
A servidora trabalha com o parlamentar desde a sua primeira campanha, em 1998, coordenando a equipe externa e auxiliando no monitoramento das redes sociais do deputado”.
Leia a nota da Primeira-Secretaria do Senado à época em que era comandada pelo senador Vicentinho Alves:
“1. A servidora BRUNA BRASIL FRAGA, Matrícula 275211, é lotada na Diretoria-Geral com exercício na Primeira-Secretaria, onde exerce função administrativa e eventualmente cuida de demandas institucionais da Primeira-Secretaria junto a órgãos da Mesa Diretora da Câmara dos Deputados.
2. Não é permitido a ela trabalhar nas dependências da Câmara dos Deputados, exceto quando estiver tratando de demandas institucionais da Primeira-Secretaria”.
Veja a íntegra da nota do Senado:
“A referida servidora encontra-se lotada na Diretoria-Geral, com exercício na Primeira-Secretaria do Senado Federal. Aos servidores do Senado é permitido prestar serviços em qualquer órgão ou unidade da Administração Pública, desde que formalmente requisitados e cedidos.”