Para barrar a primeira e a segunda denúncia apresentadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o presidente Michel Temer (PMDB) na Câmara, o governo abriu os cofres e acelerou o pagamento de emendas parlamentares impositivas a deputados e senadores. Desde que a primeira denúncia, por corrupção passiva, foi apresentada em junho deste ano, foram liberados R$ 6,6 bilhões. O dinheiro é usado por parlamentares em suas bases eleitorais.
Conforme dados levantados pela ONG Contas Abertas, de janeiro a maio foram empenhados R$ 102,6 milhões. O valor é bem inferior às cifras liberadas após a denúncia. Em junho, quando a primeira denúncia passou a tramitar no Congresso, foram empenhados R$ 2 bilhões. Em julho, R$ 2,2 bilhões. Em agosto, quando a denúncia foi barrada, o empenho foi de apenas R$ 199,2 milhões. Todo o montante liberado entre janeiro e maio não chega sequer ao valor pago em agosto, que teve o registro de menor quantia liberada após a denúncia.
Já em setembro, com a nova denúncia em andamento, o governo liberou mais R$ 1 bilhão. Neste mês de outubro, até o dia 23, foram R$ 1,2 bilhão.
De acordo com o secretário-geral da Associação Contas Abertas, Gil Castello Branco, “a cronologia dos empenhos orçamentários demonstra, claramente, que as emendas estão sendo utilizadas como moedas de troca”. Para ele, “ainda que sejam obrigatórias, o governo realiza os empenhos estrategicamente às vésperas das votações do seu interesse”.
As emendas parlamentares são recursos previstos no Orçamento, cuja aplicação é indicada por deputados e senadores. O dinheiro é empregado em projetos e obras nos estados e municípios. O movimento acelerado de liberação foi registrado nas duas denúncias contra Temer, sendo que a primeira, por corrupção passiva, chegou à Casa em junho deste ano.
De acordo com levantamento da Rede Sustentabilidade, o governo Temer liberou R$ 65 milhões em emendas exatamente no dia em que a PGR apresentou a segunda denúncia contra o presidente e os ministros Eliseu Padilha, da Casa Civil, e Moreira Franco, da Secretaria de Governo. O aumento da liberação de emendas também ocorreu durante a negociação entre Congresso e Palácio do Planalto na primeira acusação. Pelas regras, cada parlamentar pode apresentar até 25 emendas parlamentares individuais, no valor total de R$ 15,3 milhões.
PMDB, PT e PP
Entre os dez partidos que mais receberam, o PMDB do presidente Temer lidera a lista, com R$ 801 milhões. Curiosamente, o PT aparece em seguida, com repasses que totalizam R$ 600 milhões. O PSDB, partido que tem sua base rachada desde a primeira denúncia, recebeu R$ 547 milhões. Em seguida vem o PP com R$ 487, PR com R$ 400, PSD com R$ 371, PSB com R$ 319, DEM com R$ 262, PTB com R$ 212 e PDT com R$ 190 milhões.
Para o líder do PT na Câmara, deputado Carlos Zarattini (SP), a legenda, na condição de oposição, apenas aparece em segundo lugar entre os partidos que mais receberam por ter a segunda maior bancada na Casa. “Logicamente que se você pegar ao longo do ano, começou sendo liberado mais para partidos da base e menos do PT e dos partidos de oposição. A medida que chega o fim do ano, eles são obrigados a igualar [os repasses por meio de emendas impositivas]. Não pode deixar de igualar. Nós já estamos em novembro. Então, se você tirar essa média, você vai ver que elas estão se aproximando. O PT, pelo número de deputados na bancada, está se aproximando dos partidos da base exatamente porque eles são obrigados a liberar as emendas”, ressaltou.
De acordo com ele, a aceleração da liberação das emendas coincidiu com o período de votações das denúncias exatamente para “acalmar” os parlamentares. No entanto, o deputado petista alerta que o grande problema na questão do apoio negociado a Temer está na verba de programação, uma espécie de cota extra que o governo libera aos parlamentares como moeda de troca.
Entre as bancadas estaduais que mais receberam, a do Rio Grande do Norte lidera a lista com R$ 122 milhões em recursos disponibilizados. A de Roraima aparece em seguida, com R$ 120 milhões e a do Rio de Janeiro logo atrás, com R$ 113 milhões.
Jogo de empurra
A primeira denúncia contra Temer foi apresentada pela PGR no dia 26 de junho. Na ocasião, Temer foi acusado de corrupção passiva. A segunda denúncia, por organização criminosa e obstrução da Justiça, foi feita no dia 14 de setembro. As duas denúncias foram motivadas pela delação dos empresários Joesley e Wesley Batista, donos da holding J&F.
A reportagem entrou em contato com o Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão para saber como se dá o processo de liberação das emendas e se houve ingerência política na liberação. Como resposta, a pasta apenas respondeu que as “emendas parlamentares compõem despesas obrigatórias” e sugeriu que a Casa Civil fosse procurada para se manifestar sobre questionamento de possível ingerência política na liberação dos recursos. Procurada, a Casa Civil indicou a Secretaria de Governo para responder os questionamentos.
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