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Novamente, Demóstenes falou para um plenário praticamente vazio. Como aconteceu ontem (segunda, 2), menos de dez dos 81 senadores testemunharam o pronunciamento: Pedro Simon (PMDB-RS), Pedro Taques (PDT-MT), Paulo Paim (PT-RS), Paulo Davim (PV-RN), João Capiberibe (PSB-AP), Lídice da Mata (PSB-BA) e Sérgio Petecão (PSD-AC). O deputado Francisco Escórcio (PMDB-MA) também estava em plenário durante o discurso. Somente depois que Demóstenes terminou seu pronunciamento é que começaram a chegar outros senadores, como o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), Gim Argello (PTB-DF), José Pimentel (PT-CE) e Flexa Ribeiro (PSDB-PA). Demóstenes repetiu a estratégia de deixar o plenário pelo elevador privativo do cafezinho, sem falar com a impresa.
Para o senador, as gravações que o incriminam e constam dos autos encaminhados ao Supremo Tribunal Federal (STF) são ilegais, porque não haviam sido autorizadas previamente pela corte, como determina a Constituição. Além disso, argumentou o senador, as escutas telefônicas estão editadas, montadas e até mesmo adulteradas, o que desqualificaria a acusação.
“O que o policial decidiu que era certo, virava certeza indiscutível. Para dar um exemplo prosaico, se, numa conversa de terceiros, alguém se referisse a outrem com apelido de ‘gordo’ ou ‘gordinho’, o policial que transcreveu colocava na frente, entre parênteses: Demóstenes, em maiúsculas. Se a alcunha fosse ‘doutor’, escrevia Demóstenes também. Se falasse a palavra ‘professor’, nem vacilava, Demóstenes entre parênteses”, apontou o congressista goiano, que trocou o tom emotivo do discurso de ontem pela retórica orientada por expressões técnicas como “tira hermeneuta”, que se refere ao policial que interpreta textos e contextos segundo orientações pré-estabelecidas.
“O tira hermeneuta, de propósito, só colocou no papel o que julgou conveniente para a campanha de demolição da minha honra”, acrescentou Demóstenes, dizendo-se confiante na sua absolvição, em julgamento que se dará por meio de voto secreto.
Publicidade“Bola da vez”
A certa altura do discurso, Demóstenes fez lembretes velados ao lembrar que, se atualmente é ele a enfrentar a “estratégia de moer reputação”, um dia pode ser qualquer um que exerça cargo eletivo. “Hoje eu sou a bola da vez. Se a tramoia der certo comigo e me amputar o mandato, daqui a pouco pode se repetir com outra vítima, um outro senador”, avisou o parlamentar, em menção que remete à absolvição da deputada Jaqueline Roriz (PMN-DF), que se livrou da cassação em agosto de 2011, em julgamento de quebra de decoro movido depois da divulgação de vídeo em que ela aparece recebendo dinheiro de propina. À época, deputados recorreram ao sigilo do voto para salvar a deputada, como moeda de troca para retribuição caso a situação se invertesse, eventualmente.
Demóstenes apelou também para o espírito de corpo que também salvou o mandato de Renan Calheiros (PMDB-AL), em setembro de 2007 (relembre). “Foi dito à exaustão que fica mal para o Senado me absolver. A leitura atenta dos autos indica o contrário. O que fica mal para o Senado é validar agressões à Constituição e ao seu guardião, o Supremo Tribunal Federal”, argumentou o senador, promotor público licenciado e ex-secretário de Segurança Pública de Goiás.
Por fim, Demóstenes voltou a pedir para ser julgado por seus atos como parlamentar, e não por suas palavras grampeadas pela PF ou pelo que tem sido veiculado na imprensa. E voltou a atacar os procedimentos investigatórios partilhados por autoridades policiais e membros do Ministério Público Federal – ele se queixou da falta de atenção conferida por parlamentares do Conselho de Ética do Senado e da CPI do Cachoeira à perícia encomendada pela defesa em alguns dos áudios do inquérito.
“Perícia não é uma modalidade de enrolação da defesa, não é uma filigrana para postergar julgamento. Perícia é uma ciência a serviço da Justiça. Como avançou a tecnologia de grampear telefone, houve significativas melhoras no pessoal, nas técnicas e nos equipamentos de perícia. Para me investigar ilegalmente se utilizou tecnologia de ponta. Para me punir estão sendo usados métodos medievais. Existir bode expiatório é indigno do Senado da República”, concluiu o parlamentar goiano, que teve processo de cassação contra si aprovado por unanimidade no Conselho de Ética, no último dia 25.
Colaborou Mariana Haubert.