No último debate entre Dilma Rousseff (PT) e Aécio Neves (PSDB), realizado na noite desta sexta-feira (24) pela Rede Globo, o tucano não perdeu tempo. Na primeira fala do programa, recorreu à reportagem de capa da revista Veja desta semana. Normalmente estampadas nas bancas aos sábados, a manchete mostrava já nesta quinta-feira (23), pela internet, a denúncia de que o ex-presidente Lula e Dilma “sabiam” do esquema de corrupção na Petrobras.
Diante da maior audiência entre os debates de TV, Aécio iniciou a indagação dizendo que a campanha eleitoral de 2014 ficará marcada com uma das mais “sórdidas” da história, devido à tática de ataques do PT aos adversários. Em seguida, fez coro à revista e se dirigiu a Dilma, citando o “petrolão” – apelido que usou para definir o esquema de corrupção descoberto na estatal pela Operação Lava-Jato, da Polícia Federal: “A senhora sabia, candidata, da corrupção na Petrobras?”, indagou.
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Dilma respondeu nos termos do conteúdo veiculado nesta sexta-feira em sua última propaganda eleitoral na TV: “É fato que o senhor tem feito uma campanha extremamente agressiva a mim, e isso é reconhecido por todos os eleitores. Agora, essa revista, que fez e faz sistemática oposição a mim, faz uma calúnia, uma difamação do porte que ela fez hoje, e o senhor endossa a pergunta”, respondeu a petista, lembrando que a revista não apresentou prova das acusações.
“Essa revista tem o hábito de, nas retas finais da campanhas, tentar dar um golpe eleitoral. Não é a primeira vez que ela fez”, continuou Dilma, enumerando, como fez seu programa eleitoral, os anos em que a Veja teria publicado “golpes” em suas manchetes. “O povo não é bobo, sabe que está sendo manipulada essa informação, porque não foi apresentada nenhuma prova. Eu irei à Justiça para me defender. Tenho certeza de que o povo vai mostrar sua indignação no domingo, votando e derrotando essa proposta que o senhor representa, e que é um retrocesso no Brasil.”
Na tréplica, Aécio se manteve na ofensiva. “Eu apenas dei à senhora a oportunidade de apresentar a sua defesa. Não acredito que acusação à revista ou à tentativa, que seu partido fez hoje, de tirá-la de circulação seja a melhor resposta”, emendou o tucano, lembrando que, nas chamadas delações premiadas, o réu só tem o direito ao benefício da redução da pena se apresentar provas.
O senador mineiro continuou a intervenção mencionando outra revista, a IstoÉ, cuja capa classifica o pleito atual como “a campanha da mentira”. Aécio diz que, ontem (sexta, 24), “boletins apócrifos” foram distribuídos no Rio de Janeiro com ataques à sua campanha. Disse também que, no Nordeste, carros de som circulam com a informação de que beneficiários do Bolsa Família, principal programa de Dilma, dizem que eventuais eleitores de Aécio perderiam o benefício.
Publicidade“Jamais persegui jornalistas, sempre defendi a liberdade de imprensa, porque vivi os tempos escuros desse país. Agora, o senhor cita duas revistas que nós sabemos para quem fazem campanha”, rebateu a candidata, garantindo investigação sobre as acusações.
Mensalão
Aécio também provocou Dilma com uma pergunta sobre mensalão. O tucano disse que, na verdade, a petista deveria responder a um questionamento que não teria sido respondido por ela em entrevista recente ao Jornal Nacional, sobre como ela vê os personagens do caso. Para Aécio, todos tratados como “heróis nacionais” pelo PT.
“Eu acho que eles foram condenados porque cometeram irregularidades. Para a candidata Dilma Rousseff, o senhor José Dirceu [ex-ministra da Casa Civil, no governo Lula, e um dos condenados a prisão], por exemplo, ele foi punido adequadamente, ou é também um herói nacional?”, quis saber Aécio.
“Candidato, se o senhor me responder por que o chamado mensalão tucano-mineiro até hoje não foi julgado, por que o senhor Eduardo Azeredo pediu renúncia de seu cargo [de deputado] para o processo voltar para a primeira instância, o senhor estaria, de fato, sendo uma pessoa correta”, replicou a petista, em seguida enumerando processos tucanos que “não foram julgados”. “É necessário dizer que eles [petistas] foram condenados e foram para a cadeia. O mensalão do seu partido não teve nem condenados nem punidos.”
“Além da negação da resposta ao que perguntei, a senhora traz agora duas afirmações muito perigosas. A primeira delas é em relação a essas denúncias, porque a senhora era dona da mesa e da gaveta ao longo desses 12 anos. Se existe alguma irregularidade, a obrigação do governante era mandar abrir investigação”, arrematou o tucano, para quem o “mensalão mineiro” deve ser julgado antes de ser comentado. “O principal acusado é o coordenador de sua campanha em Minas Gerais: o senhor Walfrido Mares Guia, que voou no avião presidencial com a senhora nesta semana.”
“O senhor precisa estudar mais. Processos arquivados, encerrados por vocês passaram o tempo para o julgamento. Não sei se o senhor sabe, mas só o Ministério Público abre processos engavetados e arquivados. E vocês arquivaram todos os processos”, treplicou a presidenta.
Na apresentação do debate, os candidatos foram recebidos com uma salva de palmas puxada pelo mediador, o jornalista William Bonner – que por diversas vezes teve de pedir silêncio a correligionários de Dilma e Aécio, que se manifestavam a cada declaração considerada forte ou polêmica, ou mesmo para protestar pelo desrespeito aos respectivos tempos de resposta. O debate durou quase duas horas, e foi dividido em quatro blocos intercalados por perguntas entre os candidatos e de “eleitores indecisos” que, segundo Bonner, foram selecionados nas pesquisas Ibope.
Bancos públicos
Dilma também partiu para o ataque quando criticou a política de subsídios dos governos tucanos em relação aos programas de transferência de renda. Mencionando o Bolsa Família, um dos principais programas de seu governo, Dilma citou declarações recentes de Aécio e seus conselheiros econômicos . “Vocês falaram o tempo todo que os bancos públicos iam ser redefinidos. Agora, o senhor vem aqui e quer que as pessoas acreditem que vocês vão manter o subsídio? Eu não acredito, porque vocês foram sistematicamente, ao longo do governo Fernando Henrique, foram contra os subsídios”, fustigou.
“Bancos públicos serão fortalecidos, não serão aparelhados em nosso governo, candidata”, disse Aécio, em seguida mencionando denúncias contra dirigentes de bancos na gestão Dilma. “Nós não vamos apenas manter o programa [Bolsa Família], vamos também aprimorá-lo”, déficit de moradias e camadas mais humildes da população que, segundo o tucano, ainda não foram atendidas.
Aécio passou ao contra-ataque com declarações de má gestão do governo petista. “O seu governo deve à Caixa Econômica mais de R$ 10 bilhões; deve ao Banco do Brasil R$ 10 bilhões do crédito safra. Por quê? Porque o seu governo descontrolou a economia do país, candidata”, declarou. Dilma rebateu. “Quero reiterar que vocês quebraram os bancos públicos no Brasil, minguaram a Caixa, que era um dos bancos mais rentáveis do país. Vocês eram contra fazer política social com subsídio.”
“Meu Banho, Minha Vida”
A questão da escassez de água em São Paulo foi debatida entre os dois, pela primeira vez nesta campanha, e com mais ênfase por parte da presidenta Dilma. Ela perguntou a Aécio se seu correligionário tucano Geraldo Alckmin, governador reeleito de São Paulo, pecou na gestão do setor por “falta de planejamento”.
“Certamente que houve, candidata. E, segundo do TCU [Tribunal de Contas da União], do seu governo, porque aciona órgãos do seu governo”, contratacou o candidato, dizendo que o problema é em toda a Região Sudeste, tanto por culpa da falta de chuvas como por suposta ineficiência da Agência Nacional de Águas (ANA).
“Infelizmente não tivemos a parceria da ANA. Por que será? Será por que as indicações da senhora Rosemary [Noronha, chefe de gabinete da Presidência da República em São Paulo demitida por suspeitas de irregularidade em setembro de 2013] levaram um diretor da ANA ao presídio, ao invés de trazê-lo a São Paulo para planejar com o governador? Ali não foram colocadas pessoas por sua qualificação, mas por sua indicação.”
“O fato é que a água é responsabilidade do estado. Nós [governo] somos parceiros. Candidato, não planejar no estado mais rico do país é uma vergonha. É uma vergonha, candidato, porque os estados do Nordeste estão enfrentando a mesma seca. E em nenhum deles há um quadro com essa gravidade”, disse Dilma, emendando com um de seus raros instantes de descontração. Foi quando ela citou o colunista José Simão (Folha de S.Paulo), que em uma de suas colunas disse que os tucanos fariam o programa “Meu Banho, Minha Vida” em São Paulo.
Recorrência
Diversos outros temas, já discutidos em debates anteriores, foram postos em duelo por Dilma e Aécio. Índices de emprego, controle da inflação, saúde e educação, infraestrutura, projetos sociais, reforma política, entre outros, tiveram números e versões diferentes postas por cada candidato, a exemplo do que aconteceu nos programas anteriores. Algumas dessas questões, como infraestrutura e educação, também foram repetidos pelos eleitores selecionados para o debate.
“Nos últimos dez anos nós mantivemos a inflação controlada dentro da meta. Quem não mantinha era o governo Fernando Henrique. Não há termos de comparação entre os que nós fizemos e o que vocês fizeram”, disse Dilma, em uma das menções a temas recorrentes nos debates. “O seu governo é o das estatísticas, desde que elas lhes sejam favoráveis”, rebateu o tucano, no momento em que contestava informações sobre resultados apresentados por Dilma em realizações como o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego).
Entre as versões desencontradas esteve a questão levantada por um eleitor de São Paulo. Ele quis saber de Dilma sobre políticas de moradia. “Meu aluguel triplicou”, disse. Dilma iniciou a resposta com promessas de aprimoramento do Minha Casa, Minha Vida, bem como deu explicações sobre a continuidade do projeto. “Vamos construir 3,75 mil moradias”, disse. Por sua vez, Aécio contestou o número divulgado de unidades entregues pelo governo.
Outra fonte de controvérsia foi provocada também por uma eleitora mineira. Ela quis saber sobre as providências do governo contra a corrupção. “Você tem toda a razão: a lei é branda; quando a lei é branda, você investiga e, na hora de punir, o corrupto se evade. Por isso que eu sugeri cinco grandes medidas de combate à impunidade”, disse Dilma, citando três, referentes ao “caixa 2”, ao enriquecimento ilícito e à criação de instância especial para que tribunais julguem com mais celeridade.
Foi a vez de Aécio se dirigir à eleitora. “Reconheço que você hoje expressa o sentimento de milhões de brasileiros que não aguentam mais abrir todos os dias os jornais e ver qual é o caso novo de corrupção”, disse o tucano, para quem Dilma apresenta propostas, mas não houve empenho do governo ou do PT no avanço delas no Congresso. “Não houve preocupação do PT no combate efetivo à corrupção.”
“Quem fala é o representante do governo que tinha uma prática, que era a de engavetar todas as investigações. Tudo o que era investigação, engavetam: de deputado, de senador, de ministro”, devolveu Dilma. “Isso levou o Brasil a sempre ter um conjunto de julgamentos que ninguém nunca viu e nem deu fé. Foram todos soltos”, completou Dilma, dizendo jamais ter compactuado “com corrupto ou com corrupção”.