O ex-ministro Geddel Vieira Lima, ex-braço-direito de Michel Temer que dava expediente na Secretaria de Governo da Presidência, foi preso preventivamente nesta segunda-feira (3) pela Polícia Federal, na Operação Cui Bono, que apura desmandos na Caixa Econômica Federal. A prisão tem como fundamento elementos reunidos a partir de informações originadas em depoimentos recentes do doleiro Lúcio Bolonha Funaro, ligado ao PMDB, do empresário Joesley Batista e do diretor jurídico Francisco de Assis e Silva, ambos do Grupo J&F (controlador da JBS), os dois últimos sob acordo de colaboração premiada. No pedido enviado à Justiça, os investigadores afirmaram que o político tem agido para atrapalhar as investigações.
Na linha das suspeitas da Procuradoria-Geral da República (PGR), a missão de Geddel seria evitar que o ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que cumpre pena de 15 anos e quatro meses de prisão imposta pela Operação Lava Jato, e o próprio Lúcio Funaro firmem acordo de colaboração judicial. Operador financeiro de Cunha, Funaro disse a investigadores que Geddel abocanhou R$ 20 milhões em propina da JBS, parte dela para o ex-deputado peemedebista cassado no ano passado.
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Para assegurar o silêncio dos presos Cunha e Funaro, segundo a investigação, Geddel tem atuado no sentido de assegurar que ambos recebam vantagens indevidas, além de “monitorar” o comportamento do doleiro para constrangê-lo a não fechar o acordo – ou seja, trata-se da manutenção, mesmo sem atividade pública, do caráter “operativo” que sempre norteou a vida de Geddel e sua relação com os correligionários.
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Na petição apresentada à Justiça, foram citadas mensagens de WhatsApp enviadas recentemente (entre os meses de maio e junho) por Geddel à esposa de Lúcio Funaro. Para provar tanto a existência desses contatos quanto a afirmação de que a iniciativa partiu do político, Funaro entregou à polícia cópias de diversas telas do aplicativo. Nas mensagens, o ex-ministro, identificado pelo codinome “Carainho”, sonda a mulher do doleiro sobre a disposição dele em se tornar um colaborador do MPF. Para os investigadores, os novos elementos deixam claro que Geddel continua agindo para obstruir a apuração dos crimes e ainda reforçam o perfil de alguém que reincide na prática criminosa. Por isso, eles pediram a prisão “como medida cautelar de proteção da ordem pública e da ordem econômica contra novos crimes em série que possam ser executados pelo investigado”.
“Com a prisão de Geddel, passam a ser cinco os presos preventivos no âmbito das investigações da Operação Sépsis Cui Bono. Já estão detidos os ex-presidentes da Câmara, Eduardo Cunha e Henrique Eduardo Alves [PMDB-RN], o doleiro Lúcio Funaro e André Luiz de Souza, todos apontados como integrantes da organização criminosa que agiu dentro da Caixa Econômica Federal (CEF). No caso de Cunha, Alves e Funaro, já existe uma ação penal em andamento. Os três são réus no processo que apurou o pagamento de propina em decorrência da liberação de recursos do FI-FGTS para a construção do Porto Maravilha, no Rio de Janeiro. Além deles, respondem à ação Alexandre Margoto e Fábio Cleto”, informa o Ministério Público Federal (MPF).
“O teor das mensagens indicam que Cunha e Geddel atuavam para garantir a liberação de recursos por vários setores da CEF a empresas, que, após o recebimento, pagavam vantagens indevidas aos dois e a outros integrantes do esquema, entre eles Fábio Cleto. Cleto, que ocupou por indicação de Eduardo Cunha a vice-presidência de Fundos de Governo e Loterias, foi quem forneceu as primeiras informações aos investigadores. […] Entre os beneficiados do esquema ilícito aparecem companhias controladas pela holding J&F”, acrescenta o MPF.
“Agatunado”
Aos 57 anos, Geddel coleciona suspeitas. As últimas o deixam na mira da Lava Jato, que o investiga como beneficiário de propina das construtoras Odebrecht e OAS. Quando ocupava o cargo de ministro, tinha foro privilegiado e os seus casos estavam sendo apurados pela Procuradoria-Geral da República.
Agora, sem o foro privilegiado, passam para a alçada do juiz Sérgio Moro ou de outro magistrado de primeira instância casos como o da pressão sobre o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero, para liberar a construção de um prédio em Salvador, onde diz possuir imóvel que começou a ser construído em área tombada pelo patrimônio histórico. O Tribunal de Contas da União também já investigou Geddel por desmandos no Ministério da Integração, cargo que ocupou no segundo governo Lula.
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Geddel começou a carreira política cedo em Brasília, como assessor do pai, o ex-deputado Afrísio Vieira Lima, falecido neste ano. Com este “pistolão”, no começo da década de 1980 foi nomeado diretor do antigo Banco do Estado da Bahia (Baneb) pelo então governador Antônio Carlos Magalhães, de quem ele e a família eram aliados. Pouco tempo depois foi demitido pelo próprio ACM depois de ser acusado de repassar informações privilegiadas para investidores aliados.
Geddel respondeu processo na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), mas o caso terminou arquivado pelo Banco Central. Os processos judiciais também não andaram. Depois disso, Geddel só ganhou poder. Junto com a família, rompeu com ACM e se elegeu deputado federal pelo PMDB. Em 1993 foi investigado na CPI que apurou o escândalo dos chamados “anões do orçamento” e acusado, junto com outros parlamentares, de beneficiar empreiteiras ao apresentar emendas superfaturadas ao Orçamento da União.
Chorou no depoimento à comissão e terminou escapando da cassação com a ajuda do então presidente da Câmara, Luís Eduardo Magalhães. Contra a pressão do pai, o filho de ACM cobrou em troca a lealdade de Geddel para suas pretensões políticas.
Alguns anos depois, o falecido senador produziu e exibiu vídeos sobre Geddel. Um deles, intitulado “Geddel vai às compras”, conta a história da compra de 12 fazendas e casas pelo ex-deputado em apenas um ano. Em outro, “O Agatunado”, o agora ex-ministro é acusado de façanhas com o dinheiro público. Na resposta, Geddel acusa ACM de ter tomado Viagra demais e Lexotan de menos. O antigo senador chegou a chamar Geddel de “ladrão” durante um depoimento prestado a uma das CPI que o investigava.
O bate-boca ferino é um das características do ex-ministro. Quando era líder do PMDB, em 2002, Geddel chamou o ex-presidente Itamar Franco, então governador de Minas Gerais, de “desleal” e “nômade partidário”. O mineiro respondeu chamando o baiano de “percevejo de gabinete”, “vendedor de sigla” e “anãozinho do orçamento”. A língua ferina Geddel continua se exercitando no Twitter, onde tem mais de 24 mil seguidores. Nesta rede social, não dispensa agressões e até xingamentos a mães de desafetos, como fez com o ator José de Abreu.