Magistrados federais promovem paralisação nesta quinta-feira (15) em todo o país. Mas o motivo não é apenas o auxílio-moradia, benefício pago a juízes e procuradores, além de outras autoridades, que será julgado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no próximo dia 22. É o que alegam representantes das categorias. Eles querem mais do que isso: a correção do que consideram uma defasagem salarial e o que chamam de “dignidade remuneratória”.
A Justiça Federal deverá funcionar em regime de plantão, analisando apenas casos urgentes, como habeas corpus e demandas que envolvam risco de morte.
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Além da paralisação, a Associação dos Juízes Federais (Ajufe) promove nesta quinta, ao lado da Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra), da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT), atos públicos em Brasília (DF) e outras cinco capitais do país – Porto Alegre (RS), São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ), Salvador (BA) e Belém (PA). Em nota, assinada em conjunto pelos presidentes das entidades, as categorias convocam uma mobilização nacional em defesa da “dignidade remuneratória”, “pela independência e pelas garantias constitucionais”.
PublicidadeO presidente da ANPT, Ângelo Fabiano Farias da Costa, afirmou ao Congresso em Foco que o objetivo das manifestações não é influenciar a decisão do STF quanto ao auxílio-moradia, mas sim chamar a atenção para as perdas inflacionárias impostas à categoria nos últimos anos. Segundo ele, magistrados e procuradores acumulam hoje um déficit de subsídios de mais de 40%. Enquanto isso, outras carreiras jurídicas, como advogados da União, defensores públicos e delegados da Polícia Federal, obtiveram “reajustes significativos”.
“Não nos cabe interferir no julgamento do Supremo. Nossa mobilização se volta para a sociedade para mostrar o valor da nossa classe, para o próprio Congresso Nacional, para que ouça a nossa voz, e para o poder Executivo, que precisam sancionar e aprovar projetos, que estão no Parlamento Nacional, que restauram a nossa dignidade remuneratória. O contexto não é o auxílio-moradia. O nosso debate é pelo restabelecimento de uma política remuneratória que preserve o poder aquisitivo da nossa remuneração, só isso”, disse.
Já o presidente da Anamatra, Guilherme Guimarães Feliciano, acrescentou que a reivindicação de juízes de procuradores é a imposição de um modelo remuneratório uniforme, o que vale também para o auxílio-moradia. O salário inicial de um juiz ou procurador hoje é de R$ 27,5 mil. Com uma série de penduricalhos, vários deles recebem acima do teto constitucional, que é de R$ 33,7 mil, remuneração de um ministro do Supremo.
“O que nós queremos é o Supremo diga de uma vez só, a respeito de tudo isso, se pode, se não pode, como é que pode e como é que não pode. Um modelo remuneratório uniforme para toda a magistratura. Se não pode, não pode para ninguém. E se pode, como é que vai funcionar. Queremos um modelo coerente, racional, claro, transparente, que o cidadão possa compreender, e que não haja, de fato, essas assimetrias e diferenças entre o que se paga na União e nos estados”, avaliou.
Benefícios equiparados
Essa é também uma das reclamações feitas pela Ajufe. Em nota, o presidente da entidade, Roberto Carvalho Veloso, defendeu um tratamento igualitário para toda a magistratura nacional. Ele criticou a pauta de julgamentos do STF, que inclui a questão do auxílio-moradia para juízes federais, mas deixa de fora a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4.393, que trata da Lei dos “Fatos Funcionais da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro”. O processo questiona benefícios como auxílios de saúde, de alimentação, pré-escolar e gratificações concedidas a magistrados do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ).
“Não basta apenas julgar as ações que tratam do auxílio-moradia, que atingirão apenas os juízes federais, deixando sem resolução os diversos pagamentos realizados nos âmbitos dos demais segmentos do Judiciário”, salientou o juiz.
Vale lembrar que desde setembro de 2014, os juízes federais do país têm direito a receber um auxílio-moradia de R$ 4.378, exceto nos casos em que haja uma residência oficial à disposição na localidade em que atuam. Isso também vale para outras carreiras jurídicas e até mesmo para a cúpula do Judiciário. Mesmo com um salário mensal de R$ 32.075, um dos mais altos da República, ministros de tribunais superiores também embolsam o auxílio.
Tudo isso tem um alto custo. Um cálculo feito pela ONG Contas Abertas aponta que, de setembro de 2014 até dezembro do último ano, o auxílio-moradia custou à União e estados R$ 5,4 bilhões. Já anualmente, cerca de R$ 919 milhões dos cofres públicos são gastos para o pagamento do benefício a 17.094 magistrados, segundo dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Desse montante, R$ 98 milhões se destinam à juízes federais.
Crise econômica
O procurador Ângelo Fabiano reconheceu que, em face da crise econômica que o país enfrenta, boa parte da população brasileira pode não ver com bons olhos a reivindicação do Ministério Público por reajustes salariais. Ainda assim, ele considera a causa justa.
“É claro que a gente entende completamente a eventual discordância da população ou de algumas pessoas da sociedade, porque somos vistos até de maneira que, ao meu ver, é indevida, como marajás do serviço público, como se fosse uma das categorias mais elitizadas, quando na realidade dos fatos não é isso que acontece. Esse debate é legítimo, e nós estamos abertos a críticas, mas precisamos, sobretudo para a imprensa, passar a realidade sobre a nossa percepção, e tentar mostrar que as coisas não são da forma como, muitas vezes, são divulgadas”, considerou o presidente da ANPT.
“Se não tivesse havido, a dois anos atrás, a enxurrada de aprovação de reajuste de outras categorias, eu seria o primeiro a dizer ‘não é hora’. Se é crise econômica, não é hora de ter reajuste para ninguém. Mas teve para todo mundo, todas as carreiras jurídicas do serviço público federal, e não teve reajuste para a nossa. São carreiras importantíssimas, mas as nossas também são. Não podemos aceitar que sejamos colocados em uma vala comum de que somos marajás, privilegiados do serviço público, quando na verdade a gente vê que, nos últimos cinco anos, temos sofrido perdas muito maiores do que as de outras categorias, e as outras categorias têm se tornado muito mais atrativas do que magistrados e Ministério Público”, justificou.
O presidente da Anamatra, por sua vez, acrescentou que a reivindicação dos juízes federais e do Trabalho não é um aumento salarial, mas sim a reposição de perdas causadas pela inflação. “Se isso é uma garantia constitucional, não precisaria nem ser pedido, e é para isso que nós queremos chamar atenção”, ressaltou Guilherme Guimarães.
Perseguição
Na nota, assinada em conjunto pelos presidentes da Ajufe, Anamatra, ANPT e ANPR, as entidades destacam também que estaria em curso uma perseguição às respectivas classes, por parte da imprensa e de políticos envolvidos em escândalos de corrupção.
“Deve o cidadão se indagar porque todos os ataques midiáticos às Magistraturas, e bem assim os esforços para submetê-las a uma progressiva asfixia, ocorrem justamente neste momento histórico, quando se intensificam as operações de combate à corrupção ─ em sua imensa maioria operadas pelas Magistraturas federais ─ ou logo após as Magistraturas brasileiras ocuparem a linha de frente na defesa de direitos sociais ‘stricto’ e ‘lato sensu’, seja na Reforma Trabalhista, seja na Reforma da Previdência”, diz o texto. “Apenas com largas doses de cinismo se pode negar o caráter de retaliação ínsito à situação que experimentamos”, acrescenta.
Para o presidente da Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho, a discriminação e retaliação às carreiras da magistratura e do Ministério Público é evidente.
“O nosso trabalho, de certa forma, incomoda, porque é um combate a irregularidades e ilegalidades trabalhistas, no nosso caso, ou de outros tipos, como irregularidades com relação à corrosão do patrimônio público por corrupção. A gente incomoda pessoas e agentes detentores do poder político e econômico, e com isso estamos sofrendo uma retaliação que não se reveste tão somente na questão da remuneração, e que tem por objetivo enfraquecer a independência de juízes e procuradores no desenvolvimento das suas funções”, apontou Ângelo Fabiano.
“Que autonomia, que independência, terá o juiz se ele, enfrentando os interesses dos poderosos, de repente se vir na iminência de sofrer uma redução de vencimentos, ou de ser, de alguma forma, retaliado porque ele combate a corrupção? Ou porque ele reconhece inconstitucionalidades em uma determinada lei aprovada pelo Congresso?”, questionou o presidente da Anamatra.
“A sua garantia de independência é exatamente a garantia de que ele não sofrerá reduções naquilo que ele ganha, isso é o que está na Constituição”, adicionou Guilherme Guimarães.
Paralisação X mobilização
O presidente da ANPT explicou ainda ao Congresso em Foco que a presença da categoria nos atos públicos marcados para esta quinta-feira e a defesa de pautas em comum não significa uma paralisação entre os procuradores do Trabalho.
“É bom deixar claro: a nossa orientação e o nosso ato da ANPT, por parte dos procuradores do Trabalho, é de mobilização. Não é paralisação, nem de um dia. Não estamos paralisando nada, continua o trabalho normal dos procuradores, com audiências, com o funcionamento do Ministério Público do Trabalho (MPT) da forma como sempre acontece”, afirmou. “Não há qualquer indicativo de paralisação da nossa parte, e muito menos se fala em greve. Mas é claro que, se, eventualmente, a situação acabar por piorar mais à frente, isso pode ser rediscutido”, frisou o procurador Ângelo Fabiano.
Já entre os juízes do Trabalho, a mobilização inclui a presença nos atos públicos e a redesignação de audiências marcadas para essa data. Os fóruns trabalhistas, no entanto, não irão fechar, e o atendimento ao público continuará sendo feito normalmente.
“Nossa expectativa é de que essa mobilização alcance muitos de nós. Temos feito esse acompanhamento dia a dia, e posso dizer que pelos números atuais, 25% dos juízes da ativa na Justiça do Trabalho já decidiram aderir de alguma maneira à mobilização. Os atos públicos nacionalmente coordenados acontecerão em seis capitais, e além disso teremos outros atos regionais, com o mesmo conteúdo e manifesto”, informou o presidente da Anamatra, Guilherme Guimarães.
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O Brasil tem muitos desafios a enfrentar. Um deles está relacionado à elite do funcionalismo, que há muito perdeu o contato com a realidade. Essa bolha está prestes a estourar. As mudanças que observamos são o prenúncio de tempos melhores. Os juízes cometeram um erro brutal. Contavam com o apoio de grande parte da população, mas quando falam em dignidade salarial recebendo contracheques superiores ao teto, jogam esse apoio no lixo. Os juízes não são melhores ou mais importantes do que qualquer outro cidadão de bem que trabalha, embora a existência de inúmeros privilégios indique o contrário, isso é uma ilusão, resquício de tempos que ficarão para trás. Todos sabemos o que é certo e razoável, basta usarmos uma pequena dose de bom senso e de respeito à sociedade.
Schibeta acredito em momentos melhores se a população intensificar a demonstração de indignação nos moldes que vem ocorrendo com a classe política e mesmo com membros do STF. Não deve ter lugar na sociedade pra estas criaturas.
“[…]somos vistos até de maneira que, ao meu ver, é indevida, como marajás do serviço público, como se fosse uma das categorias mais elitizadas, quando na realidade dos fatos não é isso que acontece.”
Dizer o que depois dessa fala?!