A autorização judicial para o deputado preso Celso Jacob (PMDB-RJ) conciliar o cumprimento da pena de sete anos e dois meses de reclusão com o exercício do mandato expõe mais que uma situação insólita na política brasileira. Assim como Jacob, o senador Ivo Cassol (PP-RO) e os deputados Paulo Maluf (PP-SP), Paulo Feijó (PR-RJ) e Roberto Góes (PDT-AP) foram condenados à prisão pelo Supremo Tribunal Federal (STF). O catarinense João Rodrigues (PSD) está pendurado em um recurso no Supremo para reverter a condenação imposta pela Justiça Federal.
Entre os condenados, apenas Góes teve a pena de prisão convertida em prestação de serviços à comunidade e pagamento de multa. Embora recorra, ele não corre o risco de ser preso, ao menos nesse caso. O pedetista é o parlamentar com mais acusações criminais no Supremo: 18, entre inquéritos (investigações preliminares) e ações penais (processos, de fato).
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Todos eles recorrem à mais alta corte do país em liberdade e no exercício do mandato. Ontem o juiz Valter Bueno Araújo, da Vara e Execuções Penais de Brasília, determinou que Jacob, por ter sido condenado a cumprir a pena inicialmente em regime semiaberto, exerça suas atividades parlamentares até o fim da tarde e se recolha para dormir no Complexo Penitenciário da Papuda. Ou seja, à luz do dia, parlamentar; à noite, preso comum. Dos cinco parlamentares com condenação, apenas Maluf e Feijó também tiveram a perda do mandato como punição.
Em 2013 a Câmara teve pela primeira vez um deputado atrás das grades. Enquanto cumpria a pena de 13 anos de prisão por peculato e formação de quadrilha na Papuda, Natan Donadon (ex-PMDB-RO) escapou da cassação no plenário em votação secreta. Só foi cassado quando a Casa fez um segundo julgamento, dessa vez aberto. Nenhum deputado votou a favor dele. A perda do mandato ocorreu apenas sete meses após a prisão dele.
Ivo Cassol
Em agosto de 2013, o também rondoniense Ivo Cassol se tornou o primeiro senador da história da República a ser condenado à prisão pelo STF. Quase quatro anos depois, ele exerce o mandato enquanto o Supremo não analisa o seu recurso derradeiro. O tempo da apelação já se aproxima da pena imposta pelos ministros, de quatro anos e oito meses de reclusão, além do pagamento de multa no valor de R$ 201 mil. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu aos ministros, em dezembro de 2014, que o senador fosse preso. Mas nenhuma decisão foi tomada até o momento. Cassol alega, em sua defesa, que não houve má-fé nem desvio de dinheiro público.
O Supremo concluiu que, quando era prefeito de Rolim de Moura (1997-2001), Cassol direcionou licitações a cinco empresas de parentes e amigos. Depois de deixar a prefeitura, ele exerceu dois mandatos de governador e se elegeu senador em 2010. O STF interrompeu em setembro do ano passado o julgamento daquele que é considerado o último recurso do senador. Na ocasião, o revisor da ação, Dias Toffoli, propôs a redução da pena para quatro anos de detenção mais o pagamento de multa. Nesse caso, o regime prisional, inicialmente semiaberto, passaria a ser aberto, o que levaria à substituição da prisão pela prestação de serviços à comunidade.
A posição de Toffoli foi acompanhada pelos ministros Gilmar Mendes, Marco Aurélio Mello, Celso de Mello e Ricardo Lewandowski. A divergência foi aberta pela presidente da corte, Cármen Lúcia, que votou pela manutenção da pena de prisão em regime semiaberto. Também se manifestaram nesse sentido Edson Fachin, Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux. O julgamento, porém, foi suspenso a pedido de Teori Zavascki, que solicitou mais tempo para analisar o caso. O ministro faleceu em um desastre aéreo em janeiro deste ano. Em seu lugar deve votar Alexandre de Moraes, que assumiu a vaga. Não há data para a retomado do julgamento.
Paulo Maluf
Devido ao seu histórico de denúncias de corrupção, o deputado Paulo Maluf ganhou da ONG Transparência Internacional o singelo apelido de “Senhor Propina”. A primeira condenação do ex-prefeito e ex-governador de São Paulo no Supremo só ocorreu em maio. Aos 85 anos, Maluf foi condenado a sete anos de prisão em regime fechado e à perda do mandato por lavagem de dinheiro. Ele não foi julgado por corrupção porque o crime prescreveu. Ainda é réu em outros dois processos na corte.
Os ministros concluíram que houve superfaturamento e desvio de dinheiro da prefeitura nas obras da Avenida Água Espraiada (hoje Jornalista Roberto Marinho), construída por um consórcio de empreiteiras na gestão de Maluf, entre 1993 e 1997.
A defesa contesta o julgamento e vai recorrer para evitar a prisão dele. Em 2012, a Justiça da Ilha de Jersey, paraíso fiscal britânico, o condenou a devolver R$ 45,8 milhões à prefeitura de São Paulo por desvios de dinheiro na mesma obra. Já em junho deste ano, a Justiça francesa condenou o brasileiro a três anos de prisão por lavagem de dinheiro. Maluf é acusado de ter depositado o equivalente a R$ 6,6 milhões, entre 1996 e 2003, em duas contas bancárias na França em nome da mulher. O dinheiro, conforme a acusação, é fruto de corrupção. Há um mandado de prisão contra ele, a esposa e o filho no país.
Paulo Feijó
Em seu quinto mandato, o deputado fluminense Paulo Feijó foi condenado a 12 anos e 6 meses de prisão, em abril, e à perda do mandato, em maio, por corrupção e lavagem de dinheiro. Os crimes por fraude em licitações e formação de quadrilha, também atribuídos a ele, prescreveram. O processo é desdobramento da Operação Sanguessuga, que desarticulou em 2006 a chamada máfia das ambulâncias. De acordo com a acusação, caberia ao deputado apresentar emendas ao projeto de lei orçamentária, destinadas a municípios do Rio de Janeiro, para a compra de ambulâncias do grupo Planam, acusado de fraudes.
Cabe recurso contra a decisão no próprio STF. Paulo Feijó alega que apresentava rotineiramente emendas para a área da saúde e que só se encontrou com representantes da Planam depois de ter apresentado as sugestões ao orçamento. Ele também argumenta que não há comprovação de que recebeu propina.
João Rodrigues
O caso do deputado catarinense João Rodrigues difere dos colegas. A sua condenação não partiu do Supremo. Ele foi condenado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região pelos crimes de dispensa irregular de licitação e fraude a licitação, quando era vice-prefeito de Pinhalzinho (SC). Na época dos fatos, comandava a prefeitura de maneira transitória. Ele recorreu ao Supremo, com um habeas corpus, para derrubar a decisão do TRF-4. Ele é acusado de infringir a lei ao dispensar licitação para a alienação de uma retroescavadeira e ao comprar uma nova, custeada, em parte, com recursos da Caixa Econômica Federal.
A pena imposta a ele é de cinco anos e três meses de detenção, em regime semiaberto. Inicialmente, a defesa dele apelou ao Superior Tribunal de Justiça declarando que o processo fosse anulado, alegando incompetência da Justiça Federal para julgar o caso e a inépcia da denúncia. Argumenta ainda que não houve dano aos cofres públicos.
Por ele ser parlamentar, o STJ remeteu o recurso para o Supremo, onde correm as ações envolvendo congressistas e outras autoridades federais. Em outubro do ano passado, o ministro Luiz Fux negou o habeas corpus apresentado pelos advogados do deputado. Em março, o Supremo acolheu pedido da defesa para julgar uma nova apelação. Ainda não há data prevista para isso.
Roberto Góes
Réu em dez ações penais (916, 924, 928, 936, 949, 970, 984, 986, 992 e 994) e investigado em oito inquéritos (4295, 4255, 4254, 4253, 3950, 4049, 4067 e 4485), o deputado mais votado do Amapá nas últimas eleições é o parlamentar com mais pendências criminais no Supremo. Ele foi condenado em maio de 2016 a dois anos e oito meses de prisão por peculato, por ato de seu último ano de mandato como prefeito de Macapá. Nesse caso, porém, ele não corre o risco de ser preso. Como foi inferior a quatro anos, a pena foi convertida em trabalho voluntário e pagamento de 20 salários mínimos em gêneros alimentícios, material escolar ou medicamento. O parlamentar recorre da sentença.
Roberto Góes é acusado de participar de um esquema que desviava parcelas do salário de servidores destinadas a pagar empréstimos consignados. Segundo o Ministério Público, o então prefeito deixou de repassar ao banco Itaú mais de R$ 8 milhões devidos por servidores em consignados (empréstimos cujo pagamento é descontado automaticamente do salário). Em vez disso, usou o dinheiro em outras despesas do município.
A defesa de Góes alega que ele utilizou os valores retidos para pagar serviços essenciais e de natureza alimentar, inclusive salários dos próprios funcionários municipais. O ministro Roberto Barroso, que relatou o processo, rebateu o argumento ao considerar que a prefeitura era apenas depositária dos recursos e não poderia tratar o dinheiro como receita pública e dar a ele outro destino.
Nos processos em andamento no Supremo, Góes responde por corrupção, lavagem de dinheiro, formação de quadrilha e lesão corporal, entre outros crimes. Em dezembro de 2010, foi preso na Operação Mãos Limpas, acusado de participar de um esquema de desvio de verbas federais por servidores públicos e políticos do estado. Solto dois meses depois, reassumiu a prefeitura. Em outubro de 2014, recebeu 22.134 votos para a Câmara dos Deputados, a maior votação da bancada amapaense.
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