Agora presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), o ministro Dias Toffoli se emocionou por diversas vezes durante seu discurso de posse no plenário da Corte (leia íntegra abaixo). Ele recorreu a diversas personalidades, juristas e pensadores (“Habermas, Hannah Arendt e Celso Lafer”, entre outros), mas nenhum deles provocou aplausos e comoção como seu irmão José Eduardo, portador da Síndrome de Down, que se dirigiu ao posto da presidência e trocou carinhos com Toffoli.
“Aos familiares presentes e ausentes de que tanto me orgulho e às amizades sinceras que aqui se fazem presentes. O que aprendi e aprendo com meus pais, com meus familiares e amigos, tenham certeza, é o que baliza minha vida pessoal e profissional. Agradeço a todos na pessoa de meu irmão mais novo, José Eduardo”, disse Toffoli, muito emocionado.
Veja no vídeo:
Indicado em 2009 pelo ex-presidente Lula (2003-2010), Toffoli também fez de sua fala uma homenagem a cada um de seus colegas de STF, em especial ao decano da Corte, ministro Celso de Mello, e aos colegas Luiz Fux, seu vice-presidente, e Luís Roberto Barroso. Em pontos de seu discurso, o tom conciliador de que falou ao Congresso em Foco, momentos antes da cerimônia de posse, o ex-ministro Carlos Ayres Britto.
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“É dever do Judiciário pacificar os conflitos em tempo socialmente tolerável. Porque o tempo, ‘o tempo não para’, já dizia Cazuza. É a hora e a vez da cultura da pacificação, da harmonização social, do estímulo às soluções consensuais, à mediação e à conciliação. Hora de valorizar entendimento e diálogo. Modernização, dinamismo e interatividade”, discursou o magistrado.
O momento de maior emoção para Toffoli veio com a homenagem à sua família, mais para o final do discurso. Depois de agradecer aos colegas, a membros do Ministério Público, advogados e demais operadores do Direito, além de servidores, jornalistas e demais autoridades, ela fez um regresso às raízes.
Muito emocionado, passou a mencionar parentes e, dizendo-se filho de Marília, município de São Paulo, classificou-se como “caipira, de sangue latino, de alma não cativa”. Nesse momento do discurso, pediu proteção para Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil.
Leia a íntegra do discurso:
Agradeço em meu nome e em nome do Ministro Luiz Fux os discursos aqui proferidos, que integrarão a história e os anais do Supremo Tribunal Federal.
Senhoras e Senhores,
DEMOCRACIA E EDUCAÇÃO: OS ALICERCES
1905, Manoel Bomfim, em sua obra A América Latina: males de origem, denunciou a visão preconceituosa que inferiorizava nossa histórica miscigenação.
Nossos males eram outros!
Dizia ele: “Uma democracia não tem razão de ser senão para dar a todos liberdade e consciência de si”[1].
E qual o caminho?
A educação de base.
Uma revolução na educação era o que profetizava.
Disse ele: “Um povo não pode progredir sem a instrução, que encaminha a educação e prepara a liberdade, o dever, a ciência, o conforto, as artes e a moral”[2].
Era uma afronta ao discurso predominante.
Talvez por isso, suas ideias foram silenciadas (e esquecidas) por tantos anos no Brasil.
A ausência de uma educação de qualidade e abrangente sempre foi o grande obstáculo à construção de nossa cidadania.
Um permanente fator de exclusão e desigualdade social, política e econômica.
Só para relembrar:
Colônia-Império: voto indireto, censitário, elitista. Excluídas as mulheres e os escravos.
Até a Lei Saraiva (1881), era permitido o voto aos analfabetos.
Festejada, liberal, ela instituiu o voto direto, mas só para os letrados.
A abolição da escravatura era questão de tempo!
Convinha, portanto, manter os analfabetos longe do sufrágio.
Os escravos, em regra, eram iletrados.
Houve um corte de 90% do eleitorado.
Apenas 0,8% da população votou nas eleições parlamentares de 1886.[3]
A exclusão de grande parcela da população brasileira foi duradoura.
Perdurou por mais de um século.
República: o voto deixou de ser baseado na renda.
Mas ainda era restrito aos letrados e excluídas as mulheres.
1932: a conquista do voto feminino.
1945: eleições para Presidente da República e Congresso constituinte.
Pela primeira vez na história, 13% da população brasileira votou.
1985: finalmente o sufrágio universal!
Após um século de exclusão, mais de 65% da população elegeu nosso Congresso Constituinte.
Conquistou o direito de voto, passou a ter voz!
Mas, nas pertinentes palavras de José Murilo de Carvalho, “precisamos continuar a democratizar a república pela inclusão social.”[4]
Somos todos agentes da inclusão social e do bem-estar; do desenvolvimento social, cultural e econômico.
Temos, no entanto, um grande obstáculo!
Segundo o estudo “Um Olhar sobre a Educação”, divulgado nesta terça-feira, pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), mais da metade dos brasileiros (52%) com idade entre 25 e 64 anos não concluíram sequer o ensino médio.
Promover o desenvolvimento e a inclusão econômica sem educação é “pretende[r] colher os frutos, sem preparar a sementeira”, na lição, mais uma vez, de Manoel Bomfim.[5]
No mundo fragmentado de hoje, precisamos de pontes culturais, o que só o conhecimento pode nos oferecer.
A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ E O PODER JUDICIÁRIO
Novos atores sociais.
Inserção de uma massa de cidadãos até então excluídos do processo político.
Um povo com sede de direitos e garantias!
Ampla proclamação de direitos individuais, coletivos, sociais, econômicos, culturais e de minorias.
Para garantir seu cumprimento e efetividade, ampliaram-se os meios de acesso à Justiça.
Ações coletivas.
Direitos transindividuais.
O Judiciário como um novo canal de mobilização, expressão e deliberação públicas.
Na expressão de Werneck Vianna, o Poder Judiciário saiu da “estufa”[6].
Eis que surge um “novo” Judiciário no Brasil, com papel ativo na vida do país.
O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Guarda supremo da Constituição.
Tribunal da Federação.
Moderador dos conflitos políticos, sociais e econômicos.
Garantidor dos direitos fundamentais e da dignidade da pessoa humana.
Protetor dos vulneráveis e das minorias.
O timoneiro seguro e prudente deste novo Poder Judiciário!
Nas precisas palavras do decano, Ministro Celso de Mello, eis a nossa MISSÃO:
Incumbe, ao Supremo Tribunal Federal, no desempenho de suas altas funções institucionais e como garantidor da intangibilidade da ordem constitucional, o grave compromisso – que lhe foi soberanamente delegado pela Assembleia Nacional Constituinte – de velar pela integridade dos direitos fundamentais, de repelir condutas governamentais abusivas, de conferir prevalência à essencial dignidade da pessoa humana, de fazer cumprir os pactos internacionais que protegem os grupos vulneráveis expostos a injustas perseguições e a práticas discriminatórias, de neutralizar qualquer ensaio de opressão estatal e de nulificar os excessos do Poder e os comportamentos desviantes de seus agentes e autoridades, que tanto deformam o significado democrático da própria Lei Fundamental da República.
VIVEMOS OS 30 ANOS DA CONSTITUIÇÃO DE 1988
Vida longa a nossa Constituição!
Como bem lembra o querido professor Eros Grau, “A Constituição do Brasil de 1988 não é, em verdade, de 1988. É a Constituição de hoje, aqui, agora, tal como a expressam, como norma jurídica, os juízes e os nossos tribunais”.
Como vértice do Poder Judiciário e Guarda Supremo da Constituição, já apontava Hannah Arendt que a autoridade da Suprema Corte “é exercida através de uma formulação contínua da Constituição, pois a Suprema Corte é, de fato, nas palavras de Woodrow Wilson, ‘uma espécie de assembleia constitucional em sessão permanente’”.[7]
Se exercemos, nas palavras de José Afonso da Silva, em artigo publicado em 1985, “um papel de verdadeiro equilíbrio entre os demais poderes”, essa função deve ocorrer “sem predomínio”[8].
A harmonia e o respeito mútuo entre os Poderes da República são mandamentos constitucionais.
Não somos mais nem menos que os outros Poderes.
Com eles e ao lado deles, harmoniosamente, servimos à Nação brasileira.
Por isso, nós, juízes, precisamos ter PRUDÊNCIA.
NÃO ESTAMOS EM CRISE, ESTAMOS EM TRANSFORMAÇÃO.
“O futuro já não é mais como era antigamente”, cantava Renato Russo.
na síntese de Jorge Forbes, Miguel Reale Júnior e Tercio Sampaio Ferraz Junior, “Somos passageiros de uma mudança histórica sem precedentes”[9].
Ou, como disse Umberto Eco: estamos vivendo “uma espécie de balsa que nos levará a um presente ainda sem nome”[10].
A modernidade líquida de Baumann[11].
Hoje usarei a denominação de Jorge Forbes: “Terra Dois”, nome do programa por ele apresentado na TV Cultura.
Terra Um é passado!
Hoje, vivemos em Terra Dois!
Em Terra Dois, os padrões estão diluídos.
As referências são múltiplas e se contrapõem.
Sociedade horizontal.
Sem valores hierárquicos.
Informação difusa.
Não há espaço para as explicações formais.
Nesse mundo em transformação, diz ele, “O líder atual é o melhor articulador das diferenças, e não o guia de um caminho único”[12].
Há uma multiplicidade de caminhos a seguir.
Somos todos líderes de nossas vidas e senhores de nossas escolhas.
Pessoas políticas e formadoras de opinião.
Insistir no modelo de Terra Um é manter os velhos conceitos e práticas.
É insistir no mundo da corrupção.
É uma forma falida de viver, de pensar e de agir, que não mais encontra espaço em Terra Dois.
Sem as fronteiras e os padrões de antes, precisamos criar novos espaços.
Novos limites.
Precisamos ser criativos.
Criatividade – esse é o graal da sociedade contemporânea.
E, para tanto, precisamos perder o medo de tomar decisões entre as tantas possíveis.
O medo escraviza.
Cria muros e barreiras.
Isola.
Desconfia.
Desumaniza!
Embala o ódio,
O ovo da serpente!
Habermas, Hannah Arendt e Celso Lafer, cada qual, a seu modo, aponta que o Poder tem sua fundação na pluralidade.
O Poder que não é plural é violência!
Disse o primeiro: “O fenômeno fundamental do poder não é a instrumentalização da vontade de outros, mas a formação de uma vontade comum numa comunicação direcionada para atingir um acordo”[13].
Os pactos se dão constantemente.
Daí a necessidade de diálogo.
Do olho no olho.
E o medo nos afasta!
E se a política falha?
Resta o pacto fundante: a autoridade da Constituição e do Direito.
E nós, o Supremo, somos os Garantes deste Pacto!
Voltando a Forbes, como, em Terra Dois, nos salvar do medo do outro?
Se não há mais uma moral universal a orientar a sociedade, precisamos viralizar a ética intersubjetiva.
A ética de quem se preocupa com o próximo, mesmo que ele pense, aja e viva diferentemente de nós.
“A verdadeira liberdade não é a fantasia sem regras”, disse Manoel Bomfim[14].
Precisamos nos conectar cada vez mais com o outro.
Afetividade.
Sensibilidade.
Empatia.
Voluntariado.
Gentileza e cordialidade com o próximo.
Amor.
Viralizar a ideia do mais profundo respeito ao outro, da pluralidade e da convivência harmoniosa de diferentes opiniões, identidades, formas de viver e conviver uns com os outros.
Essa é a essência da Democracia!
Imagino que seja isso que precisamos para viver em Terra Dois.
SEGURANÇA JURÍDICA
“O grande sonho humano hoje é a segurança”, disse Leandro Karnal[15].
Como ter segurança jurídica nesse mundo em transformação?
Como ter segurança jurídica em um mundo sem padrões?
Como sermos a “balsa segura” de que nos fala Eco?
Esse é o desafio do Poder Judiciário do Século XXI!
Não podemos substituir “o governo das leis pelo imponderável do governo dos homens”, disse Celso Lafer em sua coluna no Jornal O Estado de São Paulo. Ele alerta:
“O Direito, na sua aplicação, não é um dado que comporte apenas uma interpretação. (…) [M]as existem parâmetros para a latitude e o escopo da interpretação. São os provenientes do Direito posto e positivado, a lei, da qual provém a dogmática jurídica. (…) Ensejam o controle da consistência e da coerência da jurisprudência, e não custa lembrar, com Bobbio, que a coerência é uma virtude jurídica.”[16]
Em Terra Dois, o Judiciário precisa resgatar a segurança jurídica dentre as diferenças.
Mas dentro dos “parâmetros para a latitude e o escopo da interpretação”.
Aqui, muita vez, tradição é ruptura.
Não se trata de um guia, de um caminho único.
Plurais são e devem ser os tribunais, com a natural convivência, em seu seio, de juízes com concepções de mundo e de Direito diversas.
Não é à toa que não só no Brasil, mas nos Estados Unidos e em outras Supremas Cortes, as principais decisões são proferidas por maioria, e não por unanimidade.
Em um colegiado, não existem vencedores e vencidos, nem vitórias ou derrotas.
Existe o plural.
Existe o outro, que sou eu também!
A Justiça precisa ser dinâmica, cooperativa e participativa.
Mais próxima do cidadão e da realidade social.
Mais acessível: novos atores, novas agendas, novas redes e canais de comunicação.
Espaços públicos e privados de diálogo.
Trocas de experiências.
Espaços centrais de interlocução que digam respeito a todos, é o que defende Renato Janine Ribeiro[17].
Precisamos estar atentos.
Já advertia Hannah Arendt,
[a]s soluções totalitárias podem muito bem sobreviver à queda dos regimes totalitários sob a forma de uma forte tentação que surgirá sempre que pareça impossível aliviar a miséria política, social ou econômica de um modo digno do homem.[18]
O jogo democrático traz incertezas.
A coragem de se submeter a essas incertezas faz a grandeza de uma nação!
Não podemos ficar presos ao passado.
Não podemos deixar o medo e o ódio entrar em nossas vidas, como na metáfora do clássico “O Segredo de Seus Olhos”.
Temos que olhar para o futuro e manter a esperança no caminho da liberdade, da igualdade e da fraternidade, como na “Trilogia das Cores”.
Magistradas e magistrados,
Nesse mundo de Terra Dois, a Justiça também precisa se transformar.
A segurança jurídica será decorrência de nosso agir, e não de uma relação de comando.
O agir do Poder Judiciário deve ser um agir socialmente responsável, na medida em que ele pensa no todo e em todos, não apenas nos casos subjetivos.
Nossa legitimidade será consequência da qualidade de nossa atuação.
Eis as chaves dessa transformação:
EFICIÊNCIA, TRANSPARÊNCIA, RESPONSABILIDADE;
E vejam Senhoras e Senhores,
CONTEMPORANEIDADE!
Os conflitos surgem em um ritmo cada vez mais intenso.
Tudo passa a ser regido pelo tempo.
É dever do Judiciário pacificar os conflitos em tempo socialmente tolerável.
“Porque o tempo, o tempo não para”, já dizia Cazuza.
É a hora e a vez da cultura da pacificação e da harmonização social, do estímulo às soluções consensuais, à mediação e à conciliação.
Hora de valorizar o entendimento e o diálogo!
Modernização, dinamismo, interatividade.
Revolução digital.
Sociedade globalizada e digitalmente conectada.
Cidadania digital.
Novas ferramentas tecnológicas – julgamentos virtuais, comunicação processual por meio de redes sociais, programas de inteligência artificial, arquitetura de computação em nuvem.
Adaptemo-nos às novas tecnologias e às novas mídias.
O virtual agora é real.
É certo que as novas mídias e as redes sociais ampliaram o espaço da praça pública, e isso coloca em foco a transparência, a comunicação e as formas de participação da sociedade.
Accountability.
Juízes e tribunais devem prestar contas do exercício de suas funções estatais, sejam elas jurisdicionais ou administrativas.
Publicidade e informação.
Trazer condições necessárias ao exercício da cidadania.
Instrumentos de fiscalização e de cobrança da previsibilidade e da coerência das decisões judiciais.
Repito Bobbio: “A coerência é uma virtude jurídica.”[19]
Integração, sistematização e modernização da coleta e da análise estatística de dados pelo Poder Judiciário.
Intercâmbio preciso, eficaz e ágil de informações.
Comunicação do Poder Judiciário Nacional.
Precisamos nos comunicar mais e melhor com a mídia e a sociedade.
Democratização da linguagem jurídica.
As decisões judiciais devem verdadeiramente chegar à sociedade, e não apenas aos atores processuais.
TV Justiça adentrou o lar das famílias brasileiras.
Julgamentos televisionados.
Decisões submetidas não apenas aos controles recursais, mas ao escrutínio público.
Aplaudidas por uns, desaprovadas por outros, como é próprio das democracias.
Como órgão de cúpula do Poder Judiciário, o Supremo Tribunal Federal não é mais “esse outro desconhecido” daqueles tempos de Aliomar Baleeiro.
Modernização da programação da Rádio e da TV Justiça.
Sair dos círculos dos magistrados, promotores e advogados.
Servir à cidadania.
Missão: conscientizar brasileiros – crianças, jovens, adultos e idosos – de seus direitos e deveres.
Informação, educação, cultura, consciência cidadã, liberdade.
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA
Agente dessa transformação.
Gestor do Poder Judiciário Nacional.
Organizar, planejar, coordenar, indicar caminhos, horizontes e metas no aperfeiçoamento e na modernização da gestão dos tribunais.
Quem ganha não é só o jurisdicionado, mas o próprio Judiciário, o Estado e a Nação brasileira!
No Conselho Nacional de Justiça, vamos dar continuidade aos programas criados nas gestões que nos antecederam, bem como lançar novos programas e desafios, como já venho anunciando.
Essa atuação se pautará pela plena confiança nos Conselheiros do CNJ e pelo desenvolvimento de um trabalho conjunto, os quais bem representam os vários segmentos da magistratura brasileira e das funções essenciais à Justiça – a advocacia e o ministério público -, o povo e os estados da Federação, por meio de representantes indicados, respectivamente, pela Câmara dos Deputados e pelo Senado da República.
Procuraremos atuar, ainda, em comunhão com o Conselho Nacional do Ministério Público, com o Conselho da Justiça Federal, com o Conselho da Justiça do Trabalho e com as escolas de formação da magistratura nacional.
Não cabe, nesse discurso de posse, apresentarmos todos os programas e projetos, mas faço alguns destaques:
Celeridade na resolução de políticas públicas judicializadas.
Individualização e identificação biométrica de todos os presos no país.
DEFESA DAS VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA:
Dar continuidade e aperfeiçoar o relevante trabalho já desenvolvido pela ministra Cármen Lúcia no combate à violência doméstica.
O Judiciário não pode fechar os olhos à epidemia de violência contra crianças e adolescentes.
Não podemos compactuar com a impunidade!
Essa é uma luta especial a ser travada e que deve envolver todo o Sistema de Justiça, o Estado e a sociedade brasileira, incluindo famílias, educadores e setores de comunicação.
Que a doce voz de nossas crianças – a exemplo do Coral Ecumênico da Legião da Boa Vontade, que hoje nos emociona com essa bela apresentação do hino nacional – ressoe para além deste Plenário!
Prezadas Senhoras, prezados Senhores,
Os desafios são muitos! Não apresento soluções prontas. Ponho-as em mesa para o debate.
Conclamo todos aqui presentes, aproveitando a pluralidade e a ampla representatividade deste Plenário: Senhor Presidente da República; Senhor Presidente do Senado Federal e do Congresso Nacional; Senhor Presidente da Câmara dos Deputados; Ministras e Ministros desta Casa e das Cortes Superiores; conselheiros do CNJ e do CNMP; parlamentares; governadores; juízes; membros do ministério público, das advocacias pública e privada, das defensorias públicas, dos tribunais de contas; políticos; gestores públicos; militares; membros do corpo diplomático; universidades; partidos políticos; servidores; juristas; acadêmicos; filósofos; antropólogos; economistas; ambientalistas; imprensa; sindicatos; associações de classes; representantes do sistema financeiro, da indústria, do comércio e da prestação de serviços; agropecuaristas e lavradores; médicos; estudantes; artistas; esportistas; organizações de combate à corrupção; representantes da sociedade civil, de diversas religiões, cultos e crenças aqui presentes, dos indígenas, dos negros, dos grupos LGBT, de defesa da mulher, da infância e juventude, dos portadores de necessidades especiais.
Antes de tudo somos todos brasileiros!
Vamos ao diálogo! Vamos ao debate plural e democrático! Não somos apenas passageiros dessa mudança histórica. Somos também construtores do caminho a seguir.
O Brasil é maior que o Estado.
Proponho a elaboração de uma agenda comum – mantida a integridade das esferas de poder, mas parceiros de um objetivo maior.
De partida, nada de novo. Apenas cumprir o preâmbulo de nossa Constituição:
“assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias”.
Que todos – independentemente de profissão, gênero, cor, crença, ideologia política e partidária, classe social – estejamos juntos na construção de um Brasil mais tolerante, mais solidário e mais aberto ao diálogo.
Afinal, fomos forjados na heterogeneidade de nosso povo, de nossos costumes, de nossas tradições, ideias e sentimentos. Diferentes? Sim! Mas unidos por um sentimento de brasilidade “quase espiritual”, transcendente. Esse é nosso valor. Essa é nossa grande riqueza!
E,
Nesta balsa,
Desta travessia,
O Direito e a dogmática serão os faróis.
E este Supremo, a autoridade atenta a sua razão de ser.
Com prudência.
Mas firme!
Altaneiro!
Garantindo a democracia e seus pactos fundantes.
Cumprindo sua Missão.
AGRADECIMENTOS
Agradeço, sensibilizado:
A todos os Ministros desta Casa, de ontem, de hoje e de sempre.
À Ministra Cármen Lúcia, a quem tenho a honra de suceder nesta presidência. Para mim, é uma grande responsabilidade.
Registro, ainda, a alegria de assumir a Presidência desta Corte no momento em que a Ministra Rosa Weber exerce a Presidência do TSE – nosso Tribunal da Democracia – e em que a Procuradoria-Geral da República e a Advocacia-Geral da União, funções essenciais ao Estado Democrático de Direito e à Justiça, têm à frente duas notáveis mulheres: a Dra. Raquel Dodge e a Ministra Grace Mendonça. No nome delas cumprimento todos os membros do Ministério Público e da Advocacia Pública.
Assumo com a esperança de ver a participação feminina ampliada até o ponto de não mais precisarmos invocar a necessidade dessa igualdade.
E às mulheres, que, brava e afetuosamente, vêm trilhando esse caminho, cito Cora Coralina, que bem traduz, em meu sentir, a distinção no caminhar feminino ao longo da vida: “Eu sou a mulher que fez a escalada da montanha da vida removendo pedras e plantando flores”.
Sigamos, todos, seu exemplo!
Agradeço, ainda, a meu querido amigo Luiz Fux. Serão dois anos de partilha de tarefas e de ações a bem da Justiça, do Supremo Tribunal Federal e do Conselho Nacional de Justiça.
Ao querido amigo Roberto Barroso, pelas palavras a mim dirigidas, fruto que são de sua generosidade e fraternidade.
Ao presidente do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Claudio Lamachia. Eu, que desta tribuna venho, agradeço o apreço de todos os advogados, os primeiros juízes de todas as causas.
A todos os ex-Presidentes da República, a quem agradeço em nome do Presidente José Sarney aqui presente.
Ao Presidente da República Michel Temer, aos Presidentes do Congresso Nacional, Senador Eunício de Oliveira, e da Câmara dos Deputados, Deputado Rodrigo Maia, em nome de quem agradeço a todos os ministros de Estado e parlamentares presentes, conclamando-os a um Pacto Nacional entre os Poderes da República, mediante um diálogo franco e propositivo. Somos parceiros no compromisso e no dever de construir, no Brasil, uma sociedade mais livre, justa e solidária.
Ao Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Humberto Martins, e aos Conselheiros do Conselho Nacional de Justiça, companheiros desta jornada de grandes desafios.
Aos Ministros dos Tribunais Superiores, permito-me cumprimentar a todos na pessoa do Presidente do Superior Tribunal de Justiça, meu amigo João Otávio de Noronha.
Vamos contar com os juízes e os tribunais, os quais levam a Justiça até os confins da nação brasileira. Não temos democracia plena sem uma magistratura nacional independente e valorizada; não temos democracia plena se não houver juízes que, com coragem e independência, digam o que é a lei e o Direito.
Ao Comandante do Exército, General Eduardo Villas Bôas, em nome de quem agradeço a presença de todos os militares.
Ao Presidente do Tribunal de Contas da União, Ministro Raimundo Carreiro, na pessoa de quem cumprimento os Ministros daquele Tribunal.
Aos Conselheiros do Conselho Nacional do Ministério Público.
Ao Núncio Apostólico no Brasil, Dom Giovanni d’Aniello, e ao Embaixador da Itália, Antonio Bernardine, em nome de quem agradeço os Embaixadores e integrantes do corpo diplomático.
Ao Arcebispo de Brasília, Dom Sérgio, Cardeal Rocha, e as autoridades religiosas de todos os credos.
Ao Defensor Público Geral da União, saudando todos os membros da Defensoria Pública da União e dos estados.
Aos Governadores de Estado e demais autoridades estaduais, distritais e municipais.
Ao Juiz Peter Messitte, que aqui representa a Suprema Corte dos Estados Unidos da América, em nome de quem agradeço todas as autoridades e amigos estrangeiros presentes.
Aos presidentes das associações nacionais da magistratura e aos representantes das entidades de classe e da magistratura.
À escola pública Gabriel Monteiro da Silva e ao Colégio Cristo Rei de Marília agradeço minha formação básica e fundamental.
Aos professores e amigos do Largo do São Francisco, a velha e sempre nova academia.
Aos jornalistas presentes, em especial aos setoristas que aqui atuam diariamente, e aos repórteres fotográficos e cinegrafistas: tenho a plena convicção de que uma sociedade só é verdadeiramente democrática se tiver uma imprensa livre e independente, o que hoje é uma realidade na democracia brasileira.
Aos servidores e colaboradores desta Suprema Corte, do Conselho Nacional de Justiça e de todo o Poder Judiciário Nacional, pessoas dedicadas e comprometidas com a causa pública. Ciente do valor e da importância das senhoras e dos senhores, externo meu respeito e meu propósito de, concretamente, atuar por melhores condições de trabalho.
A todos que fazem ou já fizeram parte da equipe de meu gabinete nesta Corte. Sem a contribuição indispensável dos magistrados convocados, dos assessores, dos servidores, dos colaboradores e dos estagiários, não seria possível alcançar os resultados que obtivemos.
Aos novos integrantes das equipes no STF e no CNJ, sejam muito bem-vindos! Somos parceiros no compromisso de empreender um esforço conjunto para alcançarmos a máxima qualidade e a máxima eficiência da prestação jurisdicional ao cidadão brasileiro.
Aos colaboradores que atuam nos bastidores – cerimonial, segurança, equipes de apoio, voluntários -, que fazem esta solenidade de posse acontecer, meu agradecimento! A participação de vocês é fundamental.
Aos familiares presentes e ausentes de que tanto me orgulho e às amizades sinceras que aqui se fazem presentes. O que aprendi e aprendo com meus pais, com meus familiares e amigos, tenham certeza, é o que baliza minha vida pessoal e profissional. Agradeço a todos na pessoa de meu irmão mais novo, José Eduardo.
Nas palavras de Drummond,
“O tempo é a minha matéria,
o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente.”[20].
Tenham a plena certeza de que, nesses dois anos, vou me dedicar de corpo e alma à Justiça e à Nação brasileira. A Constituição da República será meu guia.
[1] Rio de Janeiro: Biblioteca Virtual de Ciências Humanas do Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008. p. 278.
[2] p. 273.
[3] CARVALHO, José Murilo. Cidadania no Brasil: o longo caminho. Rio de Janeiro: Civilização brasileira, 2017. p. 45.
[4] p. 245.
[5] p. 139.
[6] VIANNA, Luiz Werneck; CARVALHO, Maria Alice Rezende de; MELO, Manuel Palacios Cunha; e BURGOS, Marcelo Baumann. Corpo e alma da magistratura brasileira. 3. ed., Rio de Janeiro: Revan, 1997. p. 15.
[7] ARENDT, Hannah. Da revolução. Brasília: UnB, 1988. p. 160-161.
[8] SILVA, José Afonso. Tribunais constitucionais e jurisdição constitucional. Revista Brasileira de Estudos Políticos. Belo Horizonte, n. 60/61, p. 495-524, jan./jul. 1985. p. 520.
[9] FORBES, Jorge; REALE JÚNIOR, Miguel e FERRAZ JÚNIOR, Tercio Sampaio (org.). A invenção do futuro: um debate sobre a pós-modernidade e a hipermodernidade. Barueri: Manole, 2005.
[10] ECO, Umberto. Pape Satàn Aleppe – crônicas de uma sociedade líquida. Record. 2017.
[11] BAUMAN, Zygmunt. A cultura no mundo líquido moderno. Rio de Janeiro: Zahar, 2013.
[12] Episódio Chão de Fábrica. Terra Dois. Tv Cultura.
[13] HABERMAS, Jüergen (1986). “Hannah Arendt’s Communications Concept of Power”. In S. Lukes (ed.), Power: Readings in Social and Political Theory. New York, New York University Press, pp. 75-93
[14] p. 282.
[15] Programa Café Cultural – TV Cultura, dia 10/9/18.
[16] LAFER, Celso. Incerteza Jurídica. O Estado de São Paulo, 18 mar. 2018, p. A02.
[17] RIBEIRO, Renato Janine. A boa política: ensaios sobre a democracia na Era da Internet. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
[18] Origens do totalitarismo: antissemitismo, imperialismo, totalitarismo. São Paulo: Companhia de Bolso, 2013.
[19] LAFER, Celso. Incerteza Jurídica. O Estado de São Paulo, 18 mar. 2018, p. A02.
[20] Poema Mãos dadas.
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