O ex-procurador-geral da República Roberto Gurgel, responsável pela denúncia contra Renan Calheiros (MDB-AL) por fraude no uso da verba indenizatória, criticou a absolvição do senador no Supremo Tribunal Federal (STF) mais cedo, por insuficiência de provas. Gurgel reagiu à crítica do ministro Gilmar Mendes, um dos membros da Segunda Turma que absolveram Renan, a respeito do trabalho dos procuradores que acusaram o emedebista – para o magistrado, eles deveriam ser chamados a prestar contas.
“Graças ao STF, ninguém é mais blindado que Renan Calheiros neste país de tanta impunidade. Não tenho dúvida alguma de que a prova autorizaria a condenação de qualquer um que não fosse o senador”, rebateu Gurgel, que apresentou a denúncia contra Renan em 2013.
A absolvição, por unanimidade na Segunda Turma (Cármen Lúcia não participou do julgamento), livra Renan de uma condenação por peculato, a tipificação do crime de desvio de dinheiro público em razão do cargo. No recebimento da denúncia pelo STF, em dezembro de 2016, por oito votos favoráveis e três contrários, o ministro-relator, Edson Fachin, havia apontado “suficientes indícios de materialidade e autoria em relação à parte das imputações” constantes na acusação feita pelo Ministério Público Federal (MPF).
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Mas Fachin, a exemplo dos demais três colegas de colegiado presentes ao julgamento – Celso de Mello, Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski –, mudou a percepção a respeito da peça acusatória. “Não há como taxar de ilícita a conduta do denunciado apenas pelo fato de ter adimplido a obrigação contratual com a entrega de dinheiro em espécie, ainda que, tal forma não fosse e não é corriqueira em situações análogas”, argumentou o ministro.
Ao declarar seu voto, Gilmar Mendes lembrou que a PGR consumiu seis anos até fazer a denúncia, mas mesmo assim não conseguiu provar a acusação que fez. “A mim me parece cabalmente provado que, de fato, o contrato existiu, que o serviço foi prestado. É estranho alguém tirar recursos para pagar dessa forma, em dinheiro? Eu pago alguns empregados meus com dinheiro, retiro da minha conta”, sentenciou o ministro.
Por meio texto publicado em suas redes sociais (leia abaixo), o senador fez “uma pausa” nas postagens sobre sua campanha à reeleição ao Senado e se queixou da cobertura jornalística sobre o caso. “Provavelmente, o noticiário não vai lembrar que, por causa dessa ação, tiraram-me da linha sucessória da presidência da República, que um ministro tentou até afastar-me da presidência do Senado, faltando alguns dias para encerrar meu mandato”, reclamou o parlamentar, em menção velada ao ministro Marco Aurélio Mello, autor da ordem de afastamento imediato de Renan em dezembro de 2016.
A denúncia
Em 2007, o peemedebista foi acusado pela jornalista Mônica Veloso, sua ex-amante, de usar dinheiro do lobista Cláudio Gontijo, da empreiteira Mendes Júnior, para pagar suas despesas com a pensão da filha e o aluguel de um imóvel. Essa foi a principal de uma série de denúncias que o parlamentar alagoano enfrentou no Conselho de Ética do Senado naquele ano. Por duas vezes, ele escapou da cassação no plenário em votação secreta.
Para comprovar que tinha condições de arcar com os gastos sozinho, o senador apresentou notas fiscais de vendas de bois. Mas a Polícia Federal concluiu que os documentos não garantiam recursos para quitar a pensão e que os papéis não comprovavam a venda de gado. Havia a suspeita de que as notas eram frias.
Por esse motivo, em janeiro de 2013, o então procurador-geral da República, Roberto Gurgel, recomendou ao Supremo que abrisse ação penal contra o senador por peculato, falsidade ideológica e uso de documento. O parecer, noticiado em primeira mão pelo Congresso em Foco, foi apresentado às vésperas da eleição que marcou a volta de Renan à presidência do Senado.
Leia a postagem de Renan em suas redes sociais:
Hoje farei uma pausa na postagem sobre nossa campanha ao Senado para um desabafo…
O STF julgou hoje, por unanimidade, a única ação em que eu era réu.
Um processo que representou um massacre moral, psicológico e familiar durante 11 anos.
A cobertura jornalística desse caso durou 200 dias e os principais jornais gastavam quase a metade do noticiário a me acusar, difamar e insinuar que eu cometera ilícitos.
Não é fácil aguentar tudo isso. Mas ouvir dos ministros que o caso foi uma vergonha na história do Ministério Público Federal, que custou caro não apenas a mim, mas ao Senado e ao Brasil, me tira um peso do ombro.
Provavelmente, o noticiário não vai lembrar que por causa dessa ação tiraram-me da linha sucessória da presidência da República, que um ministro tentou até afastar-me da presidência do Senado, faltando alguns dias para encerrar meu mandato.
O preço dessa injustiça e do peso de ser taxado de réu por um crime não cometido é um horror. Mas não sou de desistir e nem de baixar a cabeça. Sigo em frente, pois acredito que um dia a justiça realmente é feita.
Aos alagoanos que confiaram em mim ao longo desse processo, minha gratidão.
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