Expostos na linha de frente do combate à pandemia, profissionais da saúde reivindicam no Congresso melhorias salariais, mas esbarram na resistência de prefeitos e governadores. É o caso de enfermeiros, técnicos em enfermagem e parteiras das redes pública e privada, que postulam a aprovação do PL 2564/2020, do senador Fabiano Contarato (Rede-ES), que estabelece um piso nacional para as três categorias.
A proposta, de autoria da deputada Zenaide Maia (Pros-RN), prevê piso salarial de R$ 7.315,00 para os enfermeiros, R$ 5.120,00 para técnicos de enfermagem e R$ 3.657 para auxiliar de enfermagem e parteiras. Hoje não existe um padrão nacional de piso para os enfermeiros. Os novos valores foram calculados com base na jornada de trabalho de 30 horas semanais. Atualmente a carga semanal é de 40 horas.
Caso o projeto seja aprovado, os custos serão arcados pela União, por estados, municípios e empresas privadas. A proposta tem sido alvo de críticas por parte dos gestores municipais, que alegam que o piso dessas categorias é superior ao que os respectivos cofres públicos podem pagar. Em vários casos, destacam, esse servidores serão mais bem remunerados do que os próprios prefeitos.
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De acordo com o presidente da Associação dos Municípios de Pernambuco, José Patriota, o impacto financeiro do projeto pode chegar a R$ 48 bilhões para as prefeituras. “O Congresso quer jogar nas costas do município pagar 100% de um impacto de R$ 48 bilhões. Além disso, o município também tem de respeitar a Lei de Responsabilidade Fiscal, que só permite 15% para algumas áreas”, disse José Patriota ao Congresso em Foco.
Além de palmas
A senadora Zenaide Maia afirma que a pandemia escancarou as condições precárias de trabalho dos profissionais da saúde. “Chamamos essas pessoas de heróis e heroínas. Batemos palmas para elas. Prestamos homenagens, mas na hora de dar valorização salarial e uma jornada de trabalho menos estafante, alega-se o impacto econômico como obstáculo”, observa Zenaide, que é médica.
Segundo ela, as ações do governo para desafogar o sistema financeiro na pandemia, como o “orçamento de guerra”, poderiam ser estendidas para remunerar profissionais da saúde.
“Os enfermeiros, técnicos, auxiliares de enfermagem que estão dando as suas vidas para salvar as nossas. Se não houvesse de onde tirar recursos, tudo bem, mas não é o caso. Existem mecanismos para melhorar a arrecadação e ter recursos para financiar a justa valorização das categorias de enfermagem”, considera a relatora.
Enfermeiros e técnicos em enfermagem ensaiam paralisar as atividades no dia 30 de junho em todo país. A manifestação pretende voltar os olhares para o projeto em trâmite no Senado. Conforme os sindicalistas, a paralisação deve durar 24h.
A senadora afirma que o projeto de lei está pronto para votação em plenário. No entanto, ainda não há um consenso em torno do documento. “Dependemos da decisão do presidente do Senado e do colégio de líderes para colocar a proposta em pauta”.
Justo, mas inviável
Gestores públicos no geral demonstram apoio à proposta de fixar o piso dos enfermeiros, mas cobram uma fonte de financiamento dos recursos para arcar com o aumento salarial. Este é um dos impasses para a aprovação do projeto. Para José Patriota, o aumento do salário da classe é justo, mas o projeto de lei falha em não estimar uma fonte de recursos para o novo valor a ser pago.
“É mais do que justo a reivindicação da categoria, mas qual a fonte dos recursos face ao aumento dos custos com pessoal? A forma como o Congresso está adotando, redigiu e está colocando em discussão, é equivocada e não é culpa dos profissionais. O movimento municipalista pede a federalização desses profissionais com contrapartida dos municípios”, afirmou.
O vice-presidente da Associação Brasileira de Municípios (ABM), Gilmar Dominici, destaca a importância e a necessidade do estabelecimento do piso nacional, mas revela a preocupação financeira com o gasto.
“As reivindicações salariais são justas, a nossa preocupação é que quando você está com piso nacional, quer dizer, independente da condição financeira do município, todos têm que arcar com aquele custo. Nós temos muita diferença entre municípios. Alguns têm uma arrecadação muito boa e outros vivem apenas de transferências governamentais. Isso é um complicador”, aponta Dominici.
Para Gilmar, caso aprove o piso, o Congresso poderia estipular a implantação do novo salário de maneira gradativa. “Ampliando ano a ano, de forma que a prefeitura pudesse encontrar uma forma de suportar esses valores de transição. O piso seria criado e estabelecido faixas para o crescimento”.
Valorização da categoria
De acordo com o Conselho Federal de Enfermagem (Cofen), cerca de 2,4 milhões de enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem trabalham em árduas rotinas de trabalho. Os profissionais contam com dois desafios nos últimos meses: a pandemia ocasionada pela covid-19 e as desigualdades salariais.
O vice-presidente do Cofen, Antônio Marcos Freire, afirma que a pandemia acentuou a necessidade de reconhecimento e regulamentação da classe, com jornadas e salários correspondentes.
“A pandemia trouxe à tona esse importante trabalho realizado pelos profissionais de enfermagem já há décadas no Brasil. São 75% da mão de obra na área da saúde. Trabalhamos 24h dentro dos hospitais brasileiros. Muitos profissionais sucumbiram e inclusive, morreram na exposição direta no combate à covid-19. Todo esse trabalho realizado na pandemia trouxe a luz, a luz sob a necessidade de regulamentar esse piso e essa jornada”.
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