Patrícia Marins
Especial para o Congresso em Foco
Então tá! Todo mundo me cobrando para escrever sobre o South By South West (SXSW). Muita calma, minha gente, pois minha cabeça ainda está em modo PT (perda total, antes que algum engraçadinho pense no partido político, aff!!!). Foi a semana em que o meu cérebro e o meu eu deram um nó.
Trata-se do maior evento de economia criativa e inovação do mundo. Está na sua 25ª edição (sempre em Austin, no Texas) e reúne milhares de criativos de uma vasta e diversificada gama para descobrir as tendências, fazer novas conexões, numa espécie de reprodução real de De volta para o futuro ou Perdidos em Marte.
São tantas opções, programações, agendas de inovação e gente interessante que por um segundo você fica parado, com uma sensação de espanto e pura adrenalina. Um misto de “como eu nunca pensei nisso antes” com “meu Deus, que velocidade toda é esta? Como estamos atrasados”.
O SXSW tem três programações principais: interatividade, filmes e música. Além de uma vasta agenda dedicada a gaming e Comédia, tudo se misturando com um conceito de questionar, avançar as fronteiras do pensamento e ampliar o conhecimento sobre como a tecnologia se insere na transformação do mundo.
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PublicidadeMal pisei em Austin, cidade que exala uma atmosfera universitária e cool, já fui impactada com um workshop sobre agricultura no espaço. Enquanto muita gente ainda discute vida em outro planeta, um biólogo espacial falava sobre como um asteroide é usado como ecossistema no espaço.
Sabe aquela plantinha que aparece no filme Wall-e como algo totalmente inusitado? Então, o papo foi sobre as tecnologias do laboratório de plantas de código aberto do programa da Agência Espacial Europeia. Eles estão coletando dados científicos para criar um ecossistema capaz de garantir oxigênio, água e comida aos astronautas nas longas missões.
O clima do SXSW é assim: uma massa imensa de jovens profissionais, de diferentes tipos e estilos, ávidos para ouvir e trocar conhecimento sobre o que estamos vendo no mundo da comunicação e da economia criativa e as tendências da inovação global.
“It’s a pushing brain’s event”, um alemão me disse na fila de uma palestra, enquanto seus colegas (um grupo de três CEOs de multinacionais de engenharia de Berlim) apostavam comigo em quanto tempo será possível o ser humano ter a opção de morar em outro planeta.
Gente!!!! Aquele filme de ficção científica da sessão da tarde já é o nosso futuro presente. A previsão é que haja gente morando em outros lugares fora da Terra em 8 a 10 anos, segundo abordado nos painéis que assisti. Ver muito menos do que gostaria é um aspecto frustrante do evento, decorrente da imensa oferta de painéis, palestras e experiências das mais incríveis acontecendo no mesmo horário.
O genial Elon Musk, da SpaceX, falou sobre a nova geração no espaço e as possibilidades de negócio que o advento do transporte e da mobilidade espacial podem nos trazer. Não sei você, mas eu nunca tinha parado para pensar como se dá a regulamentação de espaços públicos e privados no espaço. E há várias profissões que devem surgir apenas em torno das questões que envolvem os aspectos legais dos negócios espaciais.
Veja a sessão de perguntas & respostas com Elon Musk (em inglês):
Há um mercado enorme (novas empresas e negócios) explorando os desafios que envolvem infraestrutura para a vida, o trabalho e a exploração no espaço. E a expectativa é que esses novos negócios representem um boom semelhante ao surgimento da internet, décadas atrás.
Não é a toa que a revista Forbes já considerou o SXSW como o maior e mais diverso evento focado em conexão de pessoas e de tecnologias. Foi lá que o Twitter, o Foursquare e o Medium foram apresentados pela primeira vez, anos atrás, como lançamentos e tendências.
“Essa revolução tecnológica que estamos vivendo é histórica, gera incertezas e está afetando a economia, a política, a sociedade e a nossa forma de viver”, disse o prefeito de Londres, Sadik Khan, durante disputada palestra.
Aqui, toda a palestra de Sadik Khan, em inglês:
Uma das marcas que o SXSW 2018 deixou em mim é a percepção clara de a grande revolução desta década não está centrada nas novas formas de tecnologia, mas na evolução dos relacionamentos.
E essa ficha caiu quando assisti a um debate, no espaço da Dell Technologies, sobre os avanços da inteligência humana versus o dos robôs. Lá , estudiosos de tecnologia e professores PHDs de laboratórios de universidades renomadas, como o MIT, dividiam o palco com um robô. Foi quando perguntaram se é possível um robô ser preconceituoso. A resposta unânime foi que o preconceito do robô existe, pois ele é programado por humanos.
Então, de um lado, a revolução tecnológica avança em velocidade assustadora e produz mudanças de comportamentos e de produtividade, trazendo ganhos imensuráveis para todos com novos usos de robótica, inteligência artificial, realidade virtual, “machine learning”, tecnologias de blockchain etc. etc.
E, na direção contrária, as relações humanas são cada vez mais caóticas, irracionais e em grandes transformações. A psicoterapeuta Esther Perel, durante a palestra mais elogiada no SXSW da semana passada, previu que as “relações humanas passarão por mudanças ainda mais significativas nos próximos anos”. Ela defende que “a qualidade dos nossos relacionamentos é o que determina a qualidade da nossa vida. E as conexões e os limites que estabelecemos com as outras pessoas é o que nos dá o senso de existir, de felicidade, de bem-estar”.
Dialogar exige negociação, e negociação é a base dos relacionamentos modernos.
“As conversas se tornaram a peça central dos relacionamentos. E esse é um desafio muito difícil pois somos testados o tempo todo a falar sobre algo que nunca tínhamos falado, de assuntos que não sabemos como tratar, que não dominamos o vocabulário certo e que na maioria das vezes nem tratamos dessas coisas conosco antes”, afirmou Perel, durante a sua exposição no South By.
Veja toda a palestra de Esther Perel (em inglês):
E no meio desse emaranhado todo, surgem três palavrinhas que eu escutei exaustivamente no SXSW: clareza, simplicidade (com consistência) e disponibilidade.
Daí você vai me perguntar. E isso é novidade? E você está certo: não é. Mas eu devolvo a pergunta a você: nós estamos construindo relacionamentos baseados nessas três palavrinhas mágicas? Aposto que não. É só olharmos o noticiário de hoje que veremos a grande confusão pautando tudo que nos cerca.
O desafio que está posto é o da necessidade de estabelecer conexões verdadeiras. E isso significa ir até as pessoas e não transferir essa responsabilidade para os meios meramente tecnológicos.
É possível voltar à vida normal depois de uma semana no SXSW?
Ainda estou tentando me entender… e encontrar, veja a pretensão, formas de contribuir para que todas aquelas coisas incríveis exibidas no festival sejam um dia aplicadas no Brasil. Como? Quando? Para quem? Saio com mais perguntas do que respostas. Tudo que vivi em Austin abriu portas inexploradas em labirintos da minha mente que eu mesmo desconhecia. Percorrê-los às vezes me apavora, mas se tornou irresistível.
* Patrícia Marins, jornalista, sócia-diretora da In Press Oficina, publica a coluna Cenas da Semana.
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