O Ministério Público Federal (MPF) ajuizou ação civil pública contra o SBT por conta de declarações dadas por Rachel Sheherazade, apresentadora de telejornal na emissora, a favor de um grupo de “justiceiros” que agrediu, despiu e acorrentou a um poste um jovem de 15 anos, acusado de praticar pequenos furtos no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro (RJ).
O MPF pediu que a Justiça, antes da sentença, determine que o SBT veicule um quadro com retratação do comentário da jornalista, sob pena de multa de R$ 500 mil por dia. A ideia é que a emissora diga aos telespectadores que a postura de violência em questão não tem legitimidade no ordenamento jurídico e configura atividade criminosa ainda mais grave do que os crimes de furto atribuídos ao adolescente agredido.
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Na ação, o MPF pediu que o SBT seja condenado a pagar indenização de R$ 532,1 mil por dano moral coletivo. A quantia, segundo o órgão, foi calculada com base nos valores de inserção comercial praticados pelo canal de TV.
Após reportagem que mostrou a violência contra o jovem, exibida no telejornal “SBT Brasil” em fevereiro deste ano, a apresentadora fez o seguinte comentário: “(…) o que resta ao cidadão de bem que ainda por cima foi desarmado? defender-se, é claro! o contra-ataque aos bandidos é o que eu chamo de legítima defesa coletiva de uma sociedade sem Estado contra um estado de violência sem limite (…)”.
Para o procurador Pedro Machado, Sheherazade defendeu a tortura praticada, que é proibida pela Constituição, e violou o princípio da dignidade humana. Além disso, segundo o MPF, a âncora considerou o jovem culpado e condenado, ignorando a presunção de inocência prevista na legislação.
Gravidade
O MPF destaca ainda a idade da vítima da barbárie e que a Constituição prevê que é dever prioritário do Estado, das famílias e da sociedade assegurar às crianças e adolescentes o direito à vida, dignidade, respeito e liberdade, além de protegê-los de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. Na avaliação do órgão, a obrigação de preservar esse direito foi negligenciada nas declarações de Rachel Sheherazade.
A procuradoria também considerou que o tipo de comentário feito pela jornalista tende a estimular a prática de crimes, como os de tortura, e de se fazer justiça com as próprias mãos, ainda mais em canal de TV aberta.
“As declarações da apresentadora, por possuírem forte poder de influência e repercussão social, são inspiração para inúmeras pessoas que assistiram ao programa – dentre as quais grupos radicais de perseguição e extermínio, conhecidos como ‘justiceiros/ vingadores’, que também formam sua opinião a partir do que é veiculado na mídia, o que pode aumentar de modo exponencial a violência contra jovens pela mera suspeita de cometimento de crimes de menor potencial ofensivo”, escreveu Pedro Machado.
Concessão pública
Na ação, o MPF diz que o SBT abusou do direito à liberdade de expressão e violou também as diretrizes da comunicação social. De acordo com a Constituição, a produção e a programação de rádio e TV devem dar preferência a conteúdo educativo, artístico, cultural e informativo. Também diz que Sheherazade contrariou o código de ética dos jornalistas porque o jornalismo não pode ser usado para incitar a violência, a intolerância, o arbítrio e o crime.
O procurador Pedro Machado ressaltou que não se trata de censura, que o direito à liberdade de manifestação jornalística não é absoluto e que os veículos de comunicação devem ser responsabilizados caso violem outros direitos. A pedido do MPF, a Justiça poderá determinar que a União, responsável pelas concessões de radiodifusão, fiscalize o “SBT Brasil”. A ação foi divulgada nesta quarta (24).
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