A deputada Carla Zambelli (PSL-SP) admite responsabilidade no clima de polarização instalado no país desde as últimas eleições. “Eu mesmo tenho culpa da polarização. A gente não faz com a intenção de polarizar ou de esticar a corda”, afirma, admitindo também a existência de uma polarização que divide a própria direita. “A esquerda não briga com ela mesma. Já nós estamos comprando muita briga entre nós mesmos”, complementa.
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Surgida a partir dos movimentos de protesto que tomaram as ruas do país a partir da Copa das Confederações em 2013, a deputada Carla Zambelli mistura hoje sentimentos de urgência e de preocupação. Defensora da instauração de uma monarquia parlamentarista no Brasil, acredita que nas monarquias “não existe uma preocupação com a eleição, com a próxima eleição. É a próxima geração com que você se preocupa”, afirma.
Escolhida a Melhor Deputada na votação popular do Prêmio Congresso em Foco 2019, Carla Zambelli concedeu uma entrevista a Revista Congresso em Foco na ocasião da sua premiação. Confira a entrevista na íntegra:
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O que mudou da militância de rua para o parlamento?
Mudou que antes eu era expulsa dos lugares e presa, e agora eu não sou mais. Acho que essa é uma diferença boa. Mas existe uma frustração, porque quando a gente é militante, a gente acha que vai entrar no Congresso e, como deputada, vai conseguir fazer tudo e não é bem assim. Aí, você se sente frustrada. Mas, também é um exercício diário de tentar agregar pessoas e conversar.
O que mais frustra a senhora?
São principalmente nas votações de derrubada de vetos, por exemplo, que a gente vê que o veto era importante de manter, um abuso de autoridade, projetos que passaram, e um voto não faz diferença. Isso causa frustração. Você sai dali com a sensação de que ser um em 513 não é suficiente.
Qual é o seu principal orgulho até agora?
De conseguir transmitir para o público o que eu vejo aqui dentro e ver que as pessoas estão felizes por saber, ainda que a notícia seja ruim, de saber por uma fonte segura, saber que tem alguém fazendo algo diferente, fazendo algo para mudar alguma coisa.
A senhora tem um grande protagonismo na internet. Mas aquele é um ambiente muito radicalizado. Uma grande polarização. É saudável a manutenção desse grau de polarização e radicalismo? A senhora acredita que os próprios movimentos dos quais a senhora faz parte têm uma parcela de responsabilidade por essa polarização?
Têm, sim. Eu mesmo tenho culpa da polarização. A gente não faz com a intenção de polarizar ou de esticar a corda. Eu já errei várias vezes e vou errar outras mais. Mas a gente erra tentando acertar. Mas há realmente uma polarização muito grande. E muita briga entre nós mesmos. Não acho que haja briga nesse nível da esquerda contra a esquerda. A esquerda não briga com ela mesma. Já nós estamos comprando muita briga entre nós mesmos justamente porque não estamos nem aí com o que pensam as outras pessoas. Estamos mais preocupados em afirmar o nosso ponto do que juntar as coisas.
E qual o risco disso?
Vai ser preciso um aprendizado muito grande nos próximos anos. Porque ou nós começamos a nos juntar e a nos unir em torno de objetivos comuns ou a gente vai assistir a essa autofagia acontecendo e destruindo a classe política da direita. A gente está perdendo várias batalhas por essa desunião. Eu faço a mea-culpa e acho que está errado, não está certo, não. A gente deveria ser mais cuidadoso.
Então, falando de Bolsonaro, qual é o principal mérito e o maior erro cometido por seu governo?
Acho que o principal mérito é não haver nenhum caso de corrupção envolvendo o governo até agora. É um governo que está cumprindo com o que prometeu em campanha, esse é o principal mérito. Quanto a erro… É difícil apontar erro do Bolsonaro, porque eu trato o Bolsonaro como se fosse meu filho. Assim: eu relevo. No governo, de uma forma geral, acho que o erro foi ter falado de contingenciamento. Ninguém havia notado que tinha havido um contingenciamento até se falar sobre ele. Se não falasse, ninguém teria percebido. Porque foi um contingenciamento pequeno. Falar que houve um contingenciamento na educação acabou provocando uma ira que não precisava. Acho que esse foi um erro.
Qual o projeto que mais move a senhora no momento?
O da cannabis medicinal. Aí, é um projeto meu. Eu acho até que pode parecer uma coisa fora da forma como eu e meu grupo pensam. É uma coisa que eu nem tenho falado com o presidente que é para não ouvir um não dele. Se a gente conseguir desenvolver melhor o raciocínio para que chegue a ele de forma completa, acho que ele vai comprar essa briga também. Acho que quem conhece as mães e as famílias das pessoas doentes e sabe o que elas estão passando compra o projeto. Também o projeto da opção da cesárea para a mulher, eu também comprei. Existem muitas crianças com deficiência decorrente de parto normal mal feito.
Se o presidente dissesse para a senhora parar o projeto da cannabis, a senhora obedeceria?
Não. Aí, eu vou contrariar o presidente. Eu espero que ele não me peça isso. Espero que ele entenda que é um projeto que pode ajudar muita gente.
O Psol, o deputado Marcelo Freixo, apoia esse projeto também. É possível estabelecer essa relação entre opostos?
Há pautas que têm que estar acima da ideologia. Pautas humanitárias. Eu não me importo se tem gente falando que eu me aliei com o Freixo. Não há uma aliança. Existe uma concordância num tema específico. Mas tem pessoas com quem eu não consigo conversar. Gleisi Hoffman (presidente do PT), não vão me pedir pra eu sentar com ela pra conversar alguma coisa, que eu não vou. Mas o Marcelo Freixo é uma pessoa respeitosa. Dá para conversar com ele respeitosamente, divergindo sem precisar atacar pessoalmente.
O Psol é considerado um partido de extrema esquerda. E o PSL é colocado na extrema direita. A senhora concorda? A senhora se considera de extrema direita?
Eu não me vejo como extrema direita. Eu acho que a palavra extrema remete a uma pessoa que não consegue debater nada, que tem a mente fechada. Eu não consigo me ver como uma pessoa extremista. Consigo me ver como conservadora. Também não acho que o Psol seja extrema esquerda, não. Acho que há pessoas que são extremistas lá, né?
As mulheres ainda estão longe de ter uma representação proporcional ao seu tamanho na sociedade. A senhora defende cotas para mulheres? Como aumentar a representatividade feminina dentro do Congresso?
A primeira coisa para a representatividade feminina aumentar é as mulheres passarem a votar em mulheres. Porque mulher não vota em mulher. Meu público é 80% masculino. Porque mulher não confia em mulher. A mulher em geral ela é muito competitiva com a outra mulher. A primeira coisa é a própria mulher deixar de ser preconceituosa. A mulher quando tem um problema de autoconfiança, autoestima ou autoafetividade ou afetividade com outra pessoa, ela normalmente não gosta de outra mulher. E aí, não vai ser uma cota que vai resolver, obrigar a mulher a se candidatar não vai resolver. Em 2016, nós tivemos 600 vereadoras no Brasil que não votaram sequer em si próprias. Ou seja, eram laranjas mesmo. Então você colocar cotas só vai aumentar o número de laranjas. Mas a mulher tem um instinto mais maternal, mais de família, de lar. A mulher não vem para a política porque é difícil ser mulher na política. Ou ser política sendo mulher. Tenho filho e, querendo ou não, meu filho fica para segundo plano, e aí é uma coisa que dói, entendeu?
A senhora é muito próxima da família Orleans e Bragança. A senhora é monarquista?
Eu sou monarquista. Mas eu acho que a gente precisa ainda evoluir muito pra implantar a monarquia no Brasil.
A monarquia seria parlamentarista?
Parlamentarista. Seria primeiro o parlamentarismo. Mas a gente não tem ainda a cultura para isso. A gente precisa fazer muitas reformas eleitorais antes de chegar ao parlamentarismo. A gente está vendo que até o presidencialismo como a gente tem hoje, com ministérios técnicos, foi difícil de implementar. Hoje um parlamentarismo no Brasil, ele não daria certo, por enquanto. A gente teria que primeiro mudar algumas coisas eleitorais, mudar o Congresso. A gente tem que aumentar o combate à corrupção, diminuir a impunidade. Aí, com um parlamento limpo, podemos ter o parlamentarismo implementado. Aí, ter um chefe de Estado, que vai cuidar da diplomacia e da ligação entre os poderes. Aí, podemos falar de um chefe de Estado monarca.
E esse chefe de Estado não se muda?
Sim. Porque o grande ponto da monarquia é que o chefe de Estado monarca não precisa ser mudado de quatro em quatro anos. Então, não existe uma preocupação com o poder. Não existe uma preocupação com a eleição, com a próxima eleição. É a próxima geração com que você se preocupa. A gente tem 19 monarquias no mundo que estão entre as 25 maiores economias. Entre as 25 maiores economias do mundo, 24 são parlamentaristas. Só uma é presidencialismo, que são os Estados Unidos.