Isabela Rahal*
No dia de hoje, há 10 anos, entrava em vigor a Lei de Acesso à Informação (LAI). A LAI foi um dos principais marcos da transparência no Brasil: ela garante a qualquer cidadão brasileiro o direito de requisitar e receber informações de órgãos públicos ligados aos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário da administração federal, estadual ou municipal – sejam essas informações sobre orçamento, pessoal contratado, projetos, dados, entre muitas outras questões.
A LAI foi democrática: Acabou com a possibilidade de ‘sigilo eterno’ de documentos governamentais – algo que nos remete à ditadura militar –, e deve ser comemorada como um grande avanço não só em termos de transparência, mas também na nossa democracia como um todo. Nesses 10 anos, segundo dados da Controladoria Geral da União (CGU), mais de um milhão de pedidos foram enviados apenas para o governo federal, dos quais 68% foram atendidos.
Mas será que temos mesmo motivos para comemorar, diante dos ataques que o governo atual vem fazendo à transparência do orçamento público? Diante da decretação de sigilo de dados extremamente importantes para o funcionamento da nossa democracia?
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Segundo a LAI, a decretação de sigilo deve ser uma exceção – e somente em casos em que a informação deve ser restrita “para a segurança da sociedade e do Estado”. Mas não é isso que vem ocorrendo. D iante de denúncias de um gabinete paralelo no Ministério da Educação, de pagamento de propinas e favorecimento de aliados nos repasses de recursos para a educação, o Presidente Bolsonaro decretou sigilo na lista de visitantes do Palácio do Planalto por cem anos. Também houveram tentativas de sigilo para visitas de empresários e até filhos do presidente. Em uma clara afronta ao princípio da transparência, o Presidente esconde de toda a população com quem se reúne na sua função de representante do país.
Mas o descaso vai mais longe. No ano passado, Bolsonaro impôs sigilo sobre 99,6% dos gastos realizados com os chamados cartões corporativos – um total de despesas que, no período, chegou a quase 19 milhões de reais. Gastos pagos por impostos da população, e utilizados sem qualquer controle público.
PublicidadeA postura antiética e obscura do presidente tem, ainda, efeitos seríssimos em políticas públicas e no que se refere à vida dos brasileiros: no auge da pandemia, o governo promoveu um ‘apagão’ no portal do Ministério da Saúde responsável pela atualização dos dados sobre a Covid-19. Sob o pretexto de realizar uma alteração na metodologia de apuração, o site ficou fora do ar por uma semana, sendo que os dados originais só voltaram por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF).
A pergunta que não quer calar é: o que o governo precisa tanto esconder? Fica cada vez mais claro que, os dados ocultados, encobrem não só a já conhecida falta de competência na gestão pública deste governo, mas também o uso do dinheiro público para interesses que não refletem aqueles da população.
A LAI foi uma conquista importantíssima para o povo brasileiro, já que nos possibilita, entre outras coisas, exercer o direito de conhecer o que é feito com o dinheiro público, fruto da contribuição e do esforço de cada um de nós. Ela coloca em prática o princípio básico da gestão pública: o governo trabalha para a população, não o contrário. E, portanto, deve prestar contas a ela sobre seus atos.
O cumprimento da Lei de Acesso à Informação não é um favor, é um direito que deve ser garantido a todos nós, brasileiros. Se temos um chefe da nação que nos nega o direito à informação sobre o que faz e como gasta os recursos públicos, também nos retira muitos outros direitos. Não existe saúde, educação, meio ambiente, nem igualdade de gênero e raça sem transparência. Nesse aniversário de 10 anos da LAI, portanto, cabe a nós lembrar a importância da transparência na gestão pública e lutar para reverter esse quadro – inclusive, e principalmente, promovendo a mudança que desejamos nas urnas, em outubro.
*Isabela Rahal é graduada em Relações Internacionais pela PUC-SP e mestre em Desenvolvimento Econômico pela Universidade de Columbia. Atualmente é Diretora de Articulação Política na ONG Elas no Poder, e Coordenadora Legislativa na Câmara dos Deputados. Com mais de 10 anos de carreira, durante sua trajetória profissional trabalhou na Casa Civil do Governo do Estado de SP e já foi pesquisadora da ONU na Libéria. Isabela é ativista pelo direito das mulheres e traz essa pauta como bandeira em todos os cargos que já ocupou.
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