Rubens Roriz*
Há um texto bíblico no Livro de Eclesiastes que enfatiza a existência de tempo para todas as coisas “debaixo do céu”, e, dentre as disposições lá contidas, encontra-se a seguinte: tempo para guardar e tempo para jogar fora. Acredito que chegou o tempo de as organizações religiosas serem tributadas, de “jogar fora”, no sentido de distribuir para a sociedade, o que já foi guardado desde a promulgação da Constituição Federal de 1988. São palavras de Jesus Cristo “mais bem-aventurado é dar do que receber”. Diríamos, esse é o tempo de tributar, e não mais de guardar.
As entidades religiosas são importantes? Sim, e muito. Elas estão inseridas no terceiro setor, desenvolvem ações finalísticas de grande alcance social no campo da assistência espiritual, humanitária, social e comunitária. É polêmico o tema? Sim, e muito. Mas, num cenário de escassez de recursos e crises em todos os níveis, chegou a hora de todos contribuírem para que a nação consiga avançar em meio a todas as dificuldades encontradas nesse caminho. Para isso, por óbvio, é necessário mudar o regramento constitucional, pois ele veda que as organizações religiosas sejam oneradas com impostos. Mas, sem esgotar o assunto, ao menos teríamos três situações sobre as quais poderíamos dialogar nesse controverso assunto.
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A primeira situação é a agenda negativa exposta para as organizações religiosas perante a sociedade. Essa agenda se compõe de ao menos os seguintes ingredientes: a dívida milionária de algumas entidades eclesiásticas, mesmo sendo elas imunes; o perdão legal remitido a essa dívida, depois do veto e da derrubada dessa restrição presidencial pelo parlamento federal; o enriquecimento ilícito de dirigentes de entidades religiosas; e a realização de atividades empresariais misturadas com as religiosas, trazendo com isso uma possibilidade de concorrência desleal. Esse conjunto de fatores desencadeia uma suspeição sobre as organizações, embora, sabido é que se trata de uma parcela pequena dessas instituições religiosas.
Um segundo aspecto a ser mencionado são alguns argumentos como o teológico, no sentido de que a Bíblia, seguida pela maioria dos cristãos brasileiros, nada inibe à religião de cumprir seu papel e honrar sua quota tributária. Outro argumento é o da igualdade, princípio positivado na Constituição Federal. Quando todos pagam, pode-se pagar menos. E isso é igualdade, com justiça e equidade tributárias. Por fim, o último argumento seria o da laicidade, no sentido de que ser laico é não financiar atividades religiosas, consoante dispõe o artigo 19, I da CF.
Em terceiro lugar é o pano de fundo propiciado pela reforma tributária que está sendo discutida no Parlamento Federal. Essa é a oportunidade de rediscutir essas imunidades tributárias constitucionais dispostas na vedação contida no artigo 150 e seu inciso VI da CF. Não é apenas rediscutir a imunidade tributária das organizações religiosas, mas também, dos partidos políticos e suas fundações; dos sindicatos de trabalhadores; das instituições de educação e de assistência social; dos livros, jornais, periódicos e o papel destinado a sua impressão; e, por fim, dos fonogramas e videogramas musicais de autores brasileiros. Essa é uma agenda importantíssima para o futuro de nossa nação.
PublicidadeUma conclusão possível é a de que o custo da imunidade tributária é maior que o custo de pagar imposto. Esse custo envolve a ética, a moral, a igualdade, a laicidade e a legitimidade. E isso é maior que pagar impostos. Portanto, esse é o tempo de tributar para as organizações religiosas no Brasil.
*Rubens Roriz é auditor fiscal do DF, vice-presidente da Febrafite (Federação Brasileira de Associações de Fiscais de Tributos Estaduais) e pastor evangélico.
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