A CPI da Covid está em sua reta final, certamente será um relatório contundente e que não restará dúvidas sobre os crimes cometidos durante a pandemia da covid-19 no Brasil.
E enquanto perde-se tempo com oitivas infrutíferas como a realizada com o empresário Luciano Hang, um silêncio eloquente em torno das convocações de Braga Netto e Paulo Guedes chamam cada vez mais a atenção.
É um fato notório que o estulto Ministério da Economia e o chefe da pasta não queriam que medidas de isolamento social fossem tomadas com a alegação de que prejudicariam a economia. Uma mentira, vide os quase 600 mil mortos no país. Fizemos uma quarentena meia boca, graças à ação delinquente de figuras notórias que estimulavam o desrespeito a medidas de isolamento.
Do outro lado temos o então ministro da Casa Civil, o general da reserva Braga Netto, principal maestro e fiador do descalabro no combate à pandemia pelo governo federal. E que estava ligado de forma intrínseca ao ministério comandado por Paulo Guedes.
Tanto é que o Decreto 10.520, de 14 de outubro do ano passado, submeteu as requisições de pessoal para a Secretaria Especial do Programa de Parcerias de Investimentos do Ministério da Economia à aprovação do ministro da Casa Civil da Presidência da República, que até o momento era o general da reserva.
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Em abril deste ano Guedes criticou o aumento da expectativa de vida: “Todo mundo quer viver 100 anos”, alegando que a longevidade é insustentável para os cofres públicos.
PublicidadeAté então o país já tinha 194.543 mortos. No dia que ele fez essa fala (27 de abril), 3.086 pessoas morreram pela doença.
E esta semana a advogada Bruna Morato apontou durante a sua oitiva na CPI da covid, a suposta existência de um “pacto” entre Ministério da Economia e “gabinete paralelo”.
Embora a advogada reafirme que não escutou o nome do ministro Paulo Guedes nas conversas, ela disse que “existia um interesse do Ministério da Economia para que o país não parasse. Existia um plano para que as pessoas pudessem sair às ruas sem medo”.
A advogada ainda complementou dizendo que “eles (governo) tinham que dar esperança para as pessoas saírem às ruas. E a esperança tinha um nome: hidroxicloroquina”.
Um ofício enviado para a CPI da Covid em julho deste ano mostra que a pasta apostou na “imunidade de rebanho” sem ouvir a Saúde.
Na ocasião, o vice-presidente da CPI, o senador Randolfe Rodrigues, declarou que “não existiu nenhum tipo de política econômica para enfrentar as consequências da pandemia.”
A pasta de Guedes também precisa esclarecer por qual motivo tirou do ar um relatório em que recomenda de maneira direta o boicote a medidas de isolamento.
Aos interessados, clique aqui para ver o documento.
Em março do ano passado, a então assessora de Guedes, Solange Vieira, enxergava a morte de idosos como positiva para “reduzir déficit previdenciário”.
E, se a preocupação era evitar a “morte de CNPJs”, a pasta foi tão incompetente quanto!
Segundo uma sondagem das Micro e Pequenas Empresas, realizada pelo Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae), em parceria com a Fundação Getúlio Vargas (FGV), quase 33% dos donos de micro e pequenas indústrias consideram o grau de exigência para concessão ou renovação de empréstimos bancários alto e 57,3% moderado.
A pasta tem muito a dizer sobre a sua colaboração na tragédia brasileira. É um erro retumbante ignorar isso.
Braga Netto
Se a convocação do Paulo Guedes já é algo inevitável, a do ex-ministro da Casa Civil é ainda mais necessária. A começar pela sua filha que quase assumiu um cargo na ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) – que é o órgão responsável pela normalização, controle, regulação e fiscalização das atividades relativas à assistência privada à saúde – mas não conseguiu, por conta de uma denúncia de nepotismo cruzado.
E não parou por aí! Thiago Meirelles Fernandes Pereira, um braço direito de Braga Netto, que foi indicado pela pasta para cargo na Fundação Geap, o maior plano de saúde de autogestão, que atende a servidores públicos tinha um irmão onde? Na ANS!
Seu nome é Daniel Meirelles Fernandes Pereira e ele cuidou da tentativa de nomeação da filha de Braga Netto na agência.
Quando Braga Netto vai para o Ministério da Defesa, Thiago Meirelles assume como novo coordenador do Grupo de Trabalho para Coordenar a Aquisição e Distribuição de Vacinas, enquanto o seu irmão se torna assessor especial do Ministro da Saúde.
Além disso, Braga Netto já era ministro da Casa Civil quando o Comitê de Crise para Supervisão e Monitoramento dos Impactos da Covid-19 foi criado e posto sob a seu comando.
Recomendo também a leitura de uma publicação do psicólogo e coordenador da Rede Análise Covid, Ananias Oliveira, contando a relação de longa data de Braga Netto com o antecessor do de Thiago Meireles, Heitor Freire.
Medo
É perceptível o receio dos senadores até mesmo em mencionar o nome de Braga Netto na CPI da Covid.
Uma análise feita pelo sempre brilhante jornalista de dados Marcelo Soares e publicada por Ananias mostra que os senadores até diminuíram a quantidade de menções ao Braga Netto nas oitivas da CPI.
Antes do recesso parlamentar, a média de menções ao ex-ministro da Casa Civil era de 8,11 e depois do recesso passou caiu para 2,48.
Das 37 sessões antes do recesso, Braga Netto foi mencionado 300 vezes. Já nas últimas 21 sessões após o recesso, ele foi mencionado apenas 50 vezes.
Um levantamento do Ananias Oliveira ainda apontou que apenas duas sessões pós-recesso foram responsáveis por maioria das menções, caso contrário a média seria abaixo de um.
O que tivemos durante o recesso? A ameaça que Braga Netto fez ao processo eleitoral.
Força
Se o Senado e principalmente os membros da CPI da Covid desejam realmente reestabelecer a verdade, punir os crimes cometidos, mostrar comprometimento com a sociedade brasileira e com o Estado de Direito, precisarão convocar o atual ministro da Defesa.
Não dá para senadores se intimidarem com o arcabuz verde-oliva. Nenhuma democracia saudável deve viver sob a sombra da ameaça fardada, tampouco deixar de cumprir seus compromissos com a democracia por tal ameaça.
O país e os poderes precisam virar a página de uma vez por todas. Chega de Villas-Bôas ameaçando o Supremo Tribunal Federal, de “generais e suas notas em off”, de interpretações absurdas do artigo 142 ou de um poder moderador.
Erramos quando anistiamos torturadores, estupradores e homicidas fardados em 88 e pagamos por um preço altíssimo por isso até hoje com um país que vive refém das suas forças armadas.
Não podemos repetir esse erro mais uma vez. A nossa democracia não merece isso.
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