O dia 11 de setembro ficou marcado eternamente em nossa mente como o dia do terror institucional. O dia em que a insanidade se assumiu como prática organizada de um protesto violento. Enquanto as torres do World Trade Center se desmanchavam em uma tétrica cortina de fumaça, todos perceberam, incrédulos que algo estava fora da ordem mundial. Não se estava quedando a Bastilha para, no seu lugar vazio, se edificar a esperança de um mundo fraterno, igualitário e livre. Ao contrário, o que se transportava naqueles aviões-bombas era o ódio transfigurado na proposta de humilhar, assassinar, amedrontar e fazer da vida um mero instrumento de barganha política. Era a absurda ideologia do caos pelo caos, o terror pelo terror.
Terrorismo, atentados, fundamentalismo, Taliban, Guerra Santa, tratados internacionais de defesa e retaliações, passaram a ser palavras sacadas em todos os duelos e debates, armas verbais que, detonando revolta ou perplexidade, passaram a integrar o nosso vastíssimo arsenal de problemas. Impossível permanecer insensível ao acontecido, ainda mais agora em que se completa dez anos do fatídico dia. E é bom que assim o seja, pois não se pode ficar alheio ao terror que orgulhoso ali se exibiu para o mundo, encoberto com o manto covarde do arrogante assassinato coletivo. Insensibilidade, arrogância e anonimato são ingredientes comuns nos assassinatos e genocídios de pessoas inocentes.
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Os afegãos e os iraquianos foram apontados como responsáveis principais pelo terror estadunidense. Como se noticiou naquela época, os ares da vingança foram transferidos para novos campos de batalha. Poderosas máquinas de matar foram deslocadas para a Ásia Ocidental, quando o terror então passou a ser ironicamente batizado de Guerra ao Terror. Caíram os governos que apoiavam o falecido saudita Bin Laden e o também falecido ditador Saddam Hussein, ambos, mortos pelas mesmas razões e mãos. Mortos também foram milhares de inocentes, inclusive o brasileiro Sérgio Vieira de Mello.
E não apenas as mortes causadas pela armas de destruição em massa. Caso mantidas as condições de miserabilidade e devastação no Afeganistão e no Iraque, segundo dados da ONU, um milhão de cidadãos que nasceram naqueles inóspitos países morrerão de fome. Não se assustem com o dado, um milhão de afegãos e iraquianos, sobreviventes de eternas guerras que já castigam aqueles sofridos povos, morrerão de fome e doenças, mesmo que esta agonia não seja antecipada pelas bombas e mísseis estadunidenses e ricos aliados. Insensíveis e anônimos continuarão contra o horror de morrer apenas por ter nascido afegão ou iraquiano.
De fome e Aids também está morrendo o povo africano, especialmente a recente tragédia na Etiópia. A África sofre por vários séculos o horror da morte coletiva pela fome. Sofre ainda com cruéis guerras tribais que se transformam em genocídios e mais genocídios. Como se não bastasse o horror provocado pelo homem, a Aids surge como aliada das tragédias que se tornaram o continente africano. O que dizer das riquíssimas indústrias farmacêuticas que, sem qualquer represália, se recusam a colaborar com o fornecimento de medicamentos de combate à Aids? Ao horror africano permanece insensível e anônimo todo o resto do mundo.
Desempregados e famintos vivem milhões de brasileiros. Semáforos se transformam em postos de trabalho, favelas em moradia e lixeiras em refeitórios para alimentação. Os habitantes do lixo, que não mais esperam ser chamados de cidadãos, sabem que os livros e cadernos por eles contatados são apenas amontoados de papéis que serão vendidos em empresas de reciclagem. Não bastasse o potencial devastador da corrupção, o fosso da miséria ainda permanece entre nós como se o Brasil fosse atingido diariamente por bombas de alto teor destrutivo. Governos paralelos se formaram nos morros, presídios e cidades, gerando “bin ladens” sem causa ou caras definidas. No entanto, ao terror brasileiro o Estado ainda se mostra um ineficaz e insensível combatente.
PublicidadeHomens-bomba explodindo nas ruas, aviões derrubando prédios, celebridades sequestradas e assassinatos nos faróis das cidades são exemplos de atos de terror que sempre viram comoções internacionais e nacionais. Chocam-nos, também, a violência contra a população egípcia, líbia, tunisiana e síria, embora praticada por décadas pelos mesmos e antes estimados ditadores. Parece-nos que a sensibilidade da humanidade apenas aflora quando o terror se corporifica diante de seu olhar. Mas as graves causas que geram terror repousam inertes sem qualquer reação. Aqueles que provocam a fome, o genocídio, a corrupção, o desemprego, as guerras e a discriminação permanecem sem represálias, não raro sendo aclamados de heróis e paradigmas de um novo e correto estilo de vida. Até quando ficaremos insensíveis ao horror nosso de cada dia?
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