Não há dúvidas sobre a solidez de nossa democracia. Vivemos o período de maior liberdade em toda a história brasileira. Desde a transição democrática liderada por Tancredo e Ulysses, que canalizou as energias da campanha das diretas, já passamos por seis sucessões presidenciais, enfrentamos o afastamento de Collor, superamos graves crises econômicas e fortalecemos as instituições republicanas.
O Supremo Tribunal Federal e a Procuradoria-Geral da República emergem fortalecidos do julgamento da Ação Penal 470. A imprensa nacional livre desempenha papel relevante na discussão dos grandes temas nacionais. A maturidade de nossa democracia é qualitativamente superior à de nossos vizinhos latino-americanos.
Ainda assim, precisamos de avanços institucionais importantes. O calcanhar de Aquiles de nossa dinâmica política se encontra nas relações entre a Presidência da República, o Congresso Nacional e os demais entes da Federação. Hoje, há um profundo desequilíbrio entre um Poder Executivo pleno de poderes e um Congresso Nacional esvaziado em suas prerrogativas e em seu papel. Também estados e municípios ficam entregues às decisões unilaterais e centralizadoras do governo federal. O ambiente de governabilidade é ruim, e a maioria congressual é garantida pelo velho “é dando que se recebe”, envolvendo cargos e verbas orçamentárias. A estabilidade do projeto conjunturalmente hegemônico não se dá em torno de um acordo programático, mas é garantida no varejo das transações políticas, onde impera a cooptação, o patrimonialismo e o clientelismo. Isso resulta em forte impacto na qualidade das políticas públicas, a partir do loteamento político e do aparelhamento da máquina pública.
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A Presidência da República não só presta pouca satisfação de suas ações à representação plural da sociedade, expressa no Congresso Nacional, como legisla através de medidas provisórias, com seus ritos sumários, seu debate superficial e suas criativas e inesperadas emendas de relator. Quando contrariada a vontade imperial do Executivo – caso do Código Florestal, da isenção de impostos sobre a cesta básica e dos royalties do petróleo –, surge a figura do veto. E o Congresso, afogado pela ampla maioria construída pelo presidencialismo de cooptação, não exerce sua prerrogativa de apreciar os vetos presidenciais.
Só uma ampla reforma política pode transformar esse quadro. Aproximando representantes e representados, moralizando o financiamento da atividade política, fortalecendo os partidos com o fim das coligações proporcionais e dos partidos de aluguel, dando nitidez programática à formação de maioria e minoria, mudando as regras de tramitação das MPs, fortalecendo os mecanismos de controle social e as prerrogativas do Congresso Nacional.
Infelizmente, a reforma política não consegue transpor as gavetas do Congresso Nacional e emergir como a ferramenta necessária para o avanço de nossa democracia.
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