Desde que surgiu a dicotomia direita x esquerda, lá na Revolução Francesa, no Século 18, quando a Assembleia Nacional se dividia entre os apoiadores do rei à direita, e os simpatizantes da revolução à esquerda, que existem duas expressões: “a” direita e “as” esquerdas. Pelo simples fato de que a direita, moderada ou radical, sempre está unida em torno de seus interesses, sobretudo os patrimonialistas. Enquanto as esquerdas se digladiam entre suas diversas correntes e dificilmente se unem em torno de um objetivo comum.
Essa falta de foco é visível no atual momento político brasileiro. Chega a ser ridícula e perigosa a posição adotada por alguns participantes da cena eleitoral, como o candidato Ciro Gomes que, na ânsia de abrir espaço a qualquer custo e sair da incômoda posição de líder da rabeira nas pesquisas, atira para todos os lados, principalmente contra Lula, o preferido na corrida eleitoral. Segundo Ciro, Lula está “destruindo a esquerda”. Ora, se Lula está destruindo mesmo a esquerda como ele afirma, será que Ciro está fazendo qualquer coisa em favor… da união das esquerdas? E quando, sem qualquer constrangimento e de olho apenas na possibilidade de faturar alguns magros apoios, Ciro anuncia abertamente contar com apoio de bolsonaristas históricos como o ex-governador Ronaldo Caiado (“não vejo problema em Caiado ser bolsonarista, como de resto 70 por cento dos goianos apoiam Bolsonaro”), está ajudando quem? Será que aliar-se à extrema direita é o melhor caminho para a construção de uma frente ampla… das esquerdas?
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Seguindo a mesma toada, partidos radicais de esquerda se esquecem do objetivo principal – derrotar Bolsonaro – e usam as mesmas armas infames dos que se autodenominam membros do “gabinete do ódio”. E desandam a difundir fake news a torto e a direito. O problema é que o uso das armas do adversário – prática condenada no discurso mas adotada na atuação diária – implica em auto-desmoralização. Há pouco tempo o Ministro Alexandre de Moraes mandou bloquear 20 contas do Partido da Causa Operária (PCO) por produzir e disseminar notícias falsas.
Prova da prática nefanda dessa falta de foco foi a decisão da deputada Manuela D’Ávila de abandonar a disputa por uma cadeira ao Senado nas próximas eleições sob a alegação de “desunião das esquerdas” e ataques contra ela e sua família nos últimos meses. Ela se queixa da falta de uma “união razoável no campo progressista”, e completa: “A unidade é importante para garantir competitividade e a derrota dessas forças que tornam minha vida inviável pessoal e politicamente. Além disso, diante da violência, a unidade é capaz de proteger a vítima. Disputar sem essa coesão nos torna mais vulneráveis”.
Nas redes sociais, verifica-se um gasto monumental de esforço e tempo dos que se dizem integrantes da esquerda para desacreditar instituições, jornalistas e órgãos de imprensa. Não há um dia em que não circulem pelas redes fake news, montagens ou interpretações pretensamente bem informadas com ataques a institutos de pesquisas, como o Datafolha. Isto, é claro, desde que os resultados sejam desfavoráveis a Lula. Porque, quando as pesquisas apontam crescimento do candidato do PT, o Datafolha torna-se tão “confiável” que suas pesquisas são distribuídas com carimbo de alta veracidade. Ao mesmo tempo, figuras de destaque na imprensa, como é o caso das comentaristas Miriam Leitão e Eliane Cantanhede, para ficar em dois nomes, diariamente são alvos de ataques e apontadas como defensoras de posições de direita. É fácil perceber que os autores dos ataques, aconchegados no conforto das bolhas esquerdistas, não acompanham o trabalho delas. Ou saberiam que, ultimamente, elas são responsáveis pelas críticas mais procedentes e mais ácidas contra Bolsonaro, contra o bolsonarismo e contra a ação nefanda de seus adeptos.
Aliás, a própria Globo e a Folha de São Paulo – mas, de resto, a imprensa de mercado como um todo, rotulada genericamente como “mídia hegemônica”, sofre ataques diários. Entretanto, matérias veiculadas no Jornal Nacional, na Folha ou no Estadão são replicadas aos milhões se contiverem denúncias contra Bolsonaro e seus asseclas.
PublicidadeToda essa arenga tem um único objetivo: apontar a perda de tempo e o desperdício de recursos e de esforço, ativos preciosos e fundamentais na luta em favor da derrota do projeto fascista em curso no país. Como dizia o poeta Turiba, lá nos anos 80, quando o cacique Raoni corria a Amazônia na companhia do músico Sting:
– Ou nós se Raouni, ou nós se Sting.
De nada adianta derrubar Globo, Folha, Estadão, Miriam Leitão, Eliane Catanhede, Chico das Couves, Paulo José Cunha ou seja lá quem for se Bolsonaro continuar de pé. A palavra de ordem é foco. Foco, estúpido! E o foco é Bolsonaro. Ele é quem precisa cair. Seja com vitória de Lula, de Ciro, de Simone Tebet, de Eymael ou de Tiririca. Porque, pode acreditar: com qualquer um deles, pior do que está não fica.
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