Minha geração do movimento estudantil acreditou que conquistada a agenda democrática – anistia, Constituinte, eleições diretas e liberdade política – a desigualdade social e os desafios brasileiros seriam naturalmente enfrentados e construiríamos o Brasil dos sonhos.
Outro dia, fui tomado por um baixo astral incrível ao ler um artigo do economista Samuel Pessoa, na revista Conjuntura Econômica do IBRE/FGV, onde ele informava que no PISA – programa internacional de avaliação do ensino – os 10% de alunos vietnamitas com o pior desempenho estavam na frente dos 10% com melhor desempenho entre os brasileiros. É inevitável, diante de um fato dessa gravidade, sentir na boca um certo gosto amargo de fracasso geracional. Afinal, educação é tudo.
O Brasil de 1900 a 1980 só cresceu abaixo do Japão. Com desigualdades, mas em ritmo acelerado. A partir daí foram crises e mais crises. É verdade que o Plano Real derrotou a hiperinflação, o SUS se consolidou, a democracia resistiu e uma sólida rede de proteção social foi erguida. Mas há um oceano a nos separar do Brasil dos nossos sonhos.
A equação central é econômica. Sem geração de emprego e renda não há política social que seja eficiente. O tripé macroeconômico está bem resolvido nos planos monetário e cambial. Hoje temos um sistema de metas inflacionárias sólido, Banco Central com autonomia operacional, inicio de movimentos de aumento da competição bancária e revoluções na ponta, como a do PIX. Ainda assim, nossa taxa real de juros é ainda muito alta.
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No front cambial não temos os riscos de estrangulamento externo. O câmbio é flutuante, as reservas cambiais são abundantes, a balança comercial é fortemente superavitária e o fluxo de investimentos banca o déficit nas transações correntes. Mas todo cuidado é pouco. O cenário externo é extremamente preocupante. Taxas de juros altíssimas nos EUA, China sem o crescimento vigoroso de outrora, guerras na Ucrânia e no Oriente Médio, Argentina em situação caótica.
O grande problema é o desequilíbrio fiscal que se sair do controle levará ao círculo vicioso que trava o desenvolvimento. O Brasil produz déficits primários desde 2014. Há um buraco a ser corrigido no Orçamento de 2024. É verdade que a política fiscal não deve ser um samba de uma nota só. Julgo que o Congresso acertou ao priorizar o emprego e prorrogar a desoneração da folha salarial.
Há ainda um plano subjetivo ligado à formação de expectativas e ao ambiente de negócios. O Brasil precisa trabalhar cada vez mais segurança jurídica e estabilidade institucional. Sem isso, adeus desenvolvimento sustentado.
Mas o grande desafio está nas políticas sociais. E aí, é preciso um choque de ousadia, inovação e competência. Como aceitar os sofríveis níveis de desempenho de nossos estudantes? Como dormir tranquilo diante das cenas inacreditáveis nascidas da ousadia do crime organizado? Como banalizar o fato de quase metade da população não ter coleta de esgoto? Como ficar passivo diante da destruição de nossas florestas?
Os indicadores de 2023 não são ruins. No entanto, tudo o que não podemos é dormir em berço esplendidos e nos contentarmos com resultados ainda frágeis. Em tempos de polarização política radical é preciso cada vez mais construir consensos progressivos e ação eficaz em torno da agenda brasileira de desenvolvimento.
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