A votação no Senado, na tarde de quinta-feira (19), do projeto de Lei 172/2020, que altera a Lei Geral de Telecomunicações e a Lei do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) para possibilitar a aplicação dos recursos do fundo em serviços de interesse público, porém não prestados em regime público, ou seja, na Internet, encerrou um debate histórico. Desde sua criação, foram arrecadados cerca de R$ 20 bilhões para o Fust, jamais utilizados. Nem para educação, nem para a expansão da telefonia fixa. E, no entanto, encerra-se um período histórico para que se abra um novo e nada simples processo: a aplicação dos recursos em redes de telecomunicações de forma a garantir a universalização do acesso mais do que o interesse de lucro das empresas de telecomunicações.
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Ao definir como finalidade do FUST a expansão, uso e melhoria das redes e serviços de telecomunicações em áreas rurais e urbanas com baixo Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), conectando inclusive escolas e estudantes, o projeto de lei oferece uma oportunidade para viabilizar, em parte, políticas públicas estruturais para o setor. Mas para isso, é preciso que os recursos não sejam contingenciados, um grande desafio, uma vez que a dívida pública brasileira deve alcançar a marca histórica de 100% do Produto Interno Bruto.
Vale lembrar que ao menos um dos objetivos do Fust, a criação de um fundo garantidor para apoiar pequenos e médios provedores de conexão a financiarem seus negócios, não tem nenhum impacto no Teto de Gastos. E, ainda assim, poderia destravar uma série de investimentos no interior do Brasil gerando emprego, renda e a garantia de direitos.
Se disponível para aplicação, haverá intensa disputa para definir as áreas de destinação. O Intervozes, ao lado da Coalizão Direitos na Rede, que reúne mais de 40 organizações da sociedade civil e centros de pesquisa, defende que os recursos do Fust sirvam para implementação do Plano Estrutural de Redes e Telecomunicações (PERT), desenvolvido pela Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Isso significa que as prioridades do Fundo devem estar relacionadas à resolução das atuais deficiências estruturais nas redes de transporte e de acesso que suportam a oferta dos serviços de banda larga, estimulando especialmente o investimento em backbone e backhaul. Esses são troncos de transporte de dados que podem ser compartilhados entre diversas empresas, o que gera um círculo virtuoso de ampliação da concorrência, expansão da oferta e, possivelmente, redução de preços com elevação da estabilidade e velocidade das conexões.
Boa parte das definições de prioridade de destinação de recursos do Fust vai depender da composição do Conselho Gestor do fundo, estabelecido no PL aprovado, e que prevê a participação não apenas de diversas pastas no governo, mas também de representantes das organizações da sociedade civil e de um representante dos Prestadores de Pequeno Porte. Isso pode assegurar o controle social dos projetos a serem implementados e fortalecer a aplicação dos recursos do Fundo para seu objetivo.
PublicidadeA principal preocupação da sociedade civil, e possivelmente de boa parte das empresas de pequeno, médio e grande porte do setor, está na destinação de recursos para pagamento de serviços unicamente, o que, no limite, pode levar a estagnação das redes de suporte à conexão à Internet no atual estado: insuficiente e desigual. As previsões de investimento para a área rural e para a educação precisam observar as necessidades estruturais de expansão das redes, que viabiliza, como dito, um mercado pujante, com possibilidade de melhorias em velocidade e preço. A destinação para desenvolvimento de aplicações, vale destacar, não deve estar entre as prioridades de investimento, ao menos não antes de todos os municípios estarem interligados com rede de fibra óptica.
Vale a comemoração pela aprovação do PL 172/2020. Com alteração da lei do FUST e a possibilidade de aplicação dos recursos para garantir a universalização do acesso a um serviço indiscutivelmente essencial, a aprovação do PL também fortalece os argumentos para a sua exclusão da PEC da Desvinculação dos Fundos (PEC 187/2019). O trabalho está apenas começando.
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