Depois daquela votação, olhamos em volta e nos damos conta de que, repentinamente, tudo ficou velho, irremediavelmente velho. Ainda ontem, para quem passou dos 60 como eu, lutávamos pelo novo, que viria com a derrubada da ditadura militar. O novo era um metalúrgico que atendia pelo apelido de Lula, símbolo da devolução do poder ao povo. Hoje, nada é mais velho no cenário político brasileiro do que ele, o que iria nos redimir. A cada dia mais velho, tropeçando em mensalões, petrolões, triplex e pedalinhos.
Na república de estudantes em que morei quando vim do Piauí estudar jornalismo em Brasília, lá nos anos 70, alguém colocou na parede uma foto de José Dirceu, nosso herói da resistência naqueles idos, ao lado de outra com Vladimir Palmeira e José Travassos. Para nós, representavam a resistência. Uma foto atual de Dirceu gera um sentimento de traição à nossa geração. Sua retórica lembra um ancião nadando no seco, tentativa inglória de manter-se numa vanguarda que o tempo engoliu.
De Aécio a Maduro. De Kim Jong-un a Bolsonaro
Outro dia um tal Aécio Neves, neto de um certo Tancredo – um mineiro tão antigo que foi ministro de Getúlio Vargas – despontava como o líder do tucanato da centro-esquerda. Era o menino promissor, de pedigree refinado, incensado entre ícones como Mário Covas, Franco Montoro e outros. Bastou ouvi-lo numa conversa sub-republicana pedindo alguns milhões de propina e ficou instantaneamente velho. Mais velho do que o avô.
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Existe alguém mais velho do que Nicolás Maduro, com aquele jeitão de zabumbeiro de bordel? Se Hugo Chávez, seu criador, e o tal de bolivarianismo que ninguém sabe o que é, já eram caducos ao nascer, imagina Maduro, que não tem porte nem pra ser um ditador latino-americano desses de merda. E os que insistem em apoiá-lo, pobrezinhos, são tão velhos…
E Kim Jong-un, o sinistro gordinho coreano, com aquele cabelo à Grouxo Marx (corte que ele impôs a todo o povo norte-coreano)? Como alguém pode ser tão velho, sendo tão jovem? Líder de uma ditadura velha, alimentada por um fanatismo velho, alicerçada numa egolatria velha, turbinada pela lembrança velha e macabra do risco atômico que assombrava o mundo nos anos 60… Tudo tão velho…
PublicidadeBolsonaro, ah, este já nasceu velho, com seu ideário retrógrado da intervenção militar. Conhecemos essa novela. É ruim, mal escrita e quando acaba só deixa mágoa, dor, revolta e viúvas. Bolsonaro causa uma sensação de déjà-vu, cheiro de mofo, de coisa ultrapassada, de discurso surrado pelos chavões da velha direita, que surpreendentemente ainda consegue seduzir velhos empertigados e também jovens conectados que perderam cedo demais a juventude. As casernas estão cheias desses velhos. E as redes sociais, desses jovens. Eles nem sabem quão velhos se tornaram, de repente.
Dória, Collor & Adhemar
João Dória não passa de um ancião jovem. Não deve olhar-se ao espelho, por medo de se deparar com a imagem de Fernando Collor e seus punhos cerrados, de quimono, na pose de “Caçador de Marajás”. Ao lado dele, lembrado e já incensado por analistas irresponsáveis, vem aparecendo o apresentador Luciano Huck, que para alguns seria uma solução revolucionária, nova, diferente de tudo o que está aí. Mas não é nada disso. É uma saída velha, decrépita, produto do mais abjeto oportunismo, como caduca e desastrada foi a ideia de se lançar, anos atrás, um outro animador de auditório, o botocado “Homem do Baú”, à presidência da república.
Nos trejeitos dos políticos atuais, em suas falas e votos, é fácil identificar velhos cacoetes dos velhos políticos dos velhos tempos. Jânio Quadros jogava talco no paletó para parecer que tinha caspa e se identificar com os pobres. Um deputado faz uma tatuagem (falsa) para provar sua fidelidade canina… ao poder! Adhemar de Barros notabilizou-se pelo refrão imbecil do “rouba mas faz”. Qualquer semelhança com o que vem acontecendo no Brasil de hoje não é mera coincidência. Há quem diga que Dória, quando não se parece com Collor, é um Jânio sem caspa.
Toma-lá-dá-cá, bordões & reformas
O toma-lá-dá-cá em busca de apoio parlamentar – há alguma coisa mais velha na prática política brasileira? Ainda outro dia uma tal de Dilma fazia a mesmíssima coisa. Como fez também o longevo José Sarney, distribuindo concessões de rádio e TV. Como Fernando Henrique, acusado de compra de votos para aprovar a emenda de sua reeleição.
Basta receber memes de dona Dilma dizendo bobagens com gosto de mandioca & vento para se perceber que a companheira é velha faz tempo. Mais velho que ela só os que ainda a tratam de “presidenta”. Como velhas são as reformas – política, tributária e previdenciária. Quando comecei a cobrir política, mais de 40 anos atrás, já se falava nelas. Nada mais velho. Outro dia achei um artigo de Carlos Lacerda defendendo uma reforma política. Em 1953…
Por último, a insistência nos velhos bordões – à esquerda e à direita – já é cansativa de tão velha. “O povo não é bobo, abaixo a rede Globo” (este é um clássico que fez a travessia da ditadura à democracia e continua firme. Como a própria Globo). “Fora Temer”. “Fora Dilma”. “Fora Cunha”. “Diretas já” (já tinha ouvido isso. Quando?). Velhos ficaram os programas partidários pela TV: “Junte-se a nós! Filie-se ao PQP”. Melancolicamente velhas são as frases feitas que se repetem incansavelmente nas campanhas políticas: “Pela saúde, pela educação e pelo emprego, vote em mim”.
Pensando bem, essa velha ranzinice indignada que mantemos sempre viçosa talvez seja a única novidade neste museu de velharias. Todo dia é preciso renovar o estoque de implicância para que não terminemos velhos, chatos e renitentes, como os reacionários que até hoje suspendem a toalha da mesa pra ver se não tem comunistas escondidos embaixo. Ou os comunistas de botequim, que até hoje se comovem às lágrimas diante dos bigodes de Stálin.
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