A atividade política não é um fim em si mesmo. Na democracia, a ação política busca resolver os problemas fundamentais da sociedade. A luta pela hegemonia política e a disputa entre as diversas correntes ideológicas são legítimas. No Brasil, no entanto, temos atravessado problemas sucessivos de governabilidade. Isto é fruto de um sistema político excessivamente original e disfuncional, onde não há formação clara de maioria e minoria. Muitos avanços são obtidos em complexas negociações entre o Presidente da República e o Congresso Nacional, envolvendo distribuição de cargos, concessões orçamentárias e redução das ambições transformadoras.
Em qualquer democracia madura, há uma maioria sólida identificada com o governo oferecendo apoio parlamentar. Por outro lado, cabe à oposição propor iniciativas, fiscalizar, criticar, denunciar, preparando-se para a alternância no poder. É assim nos EUA e nos países europeus. Isto, aqui, se agrava pela excessiva pulverização da representação parlamentar. O “presidencialismo de coalizão” cede lugar ao “presidencialismo de cooptação”. O pragmatismo predomina sobre a consistência programática.
Se é verdade que a política visa gerar soluções para os problemas da sociedade, a agenda de votações deveria partir do diagnóstico sobre quais são os verdadeiros desafios nacionais.
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Estamos na iminência da instalação de uma CPMI – Comissão Parlamentar Mista de Investigação – para investigar os tristes fatos ocorridos no último dia 8 de janeiro, quando vândalos, fanáticos e baderneiros destruíram as sedes dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário brasileiros. A Constituição Brasileira em seu art. 58, parágrafo 3º., prevê as CPIs como instrumento de fiscalização e investigação. Ora, não há dúvidas que os fatos ocorridos têm que ser apurados e os responsáveis rigorosamente punidos. Mas as investigações já estão muito bem conduzidas pelo STF, pelo MPF e pela PF.
Fui membro de duas CPIs importantes: a dos Fundos de Pensão e a do CARF. Aprendi que o Congresso Nacional não deve privilegiar este tipo de atuação. A investigação é rala e ineficiente, a retórica e o espetáculo predominam, a confrontação é radical e inevitável, o desgaste para as instituições, líquido e certo. Quem viver, verá.
A investigação para valer pressupõe um meticuloso trabalho de cruzamento de dados e informações. Os deputados e senadores não são treinados para isso. Nenhuma testemunha vai lá dizer a verdade. Exceto depoimentos espontâneos como o do publicitário Duda Mendonça, na CPI dos Correios, ou do gerente da PRETROBRAS e presidente da Sete Brasil, Pedro Barusco, que, muito doente, resolveu abrir o coração e revelar percentuais de propina e como a corrupção operava, pouco se acrescenta às investigações do sistema judiciário.
Temo que a CPMI do 8 de janeiro se transforme num espetáculo de baixíssima qualidade, um teatro de horrores, aguçando a atual polarização, contribuindo muito pouco para a elucidação dos fatos. E o pior, desperdiçando energia política e desviando o foco das coisas essenciais para a maioria da população.
Não seria melhor concentrar energia e trabalho na discussão e aprovação do novo arcabouço fiscal, da Reforma Tributária, dos ajustes no Ensino Médio, da Lei das Fake News e do Marco Modernizador do Saneamento, por exemplo?
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