Paulo Antônio Zinca herdou a condução dos negócios da família. O carro-chefe das atividades era a empresa ZXC Serviços Ltda., que prestava serviços de vigilância e limpeza para dezenas de repartições do Estado de Sucupira. A relação de mais de quinze anos entre a empresa e o Poder Público estava marcada por deficiências de fiscalização pelos agentes públicos, denúncias de preços bem superiores aos praticados no mercado e centenas de milhões de reais pagos sem cobertura contratual.
Com a proximidade das eleições para escolha do novo governador de Sucupira, Paulo Antônio precisava garantir a necessária influência política sobre o novo governo. Em última instância, precisava manter intocáveis e lucrativos os negócios da família, notadamente a atuação da empresa ZXC Serviços Ltda.
Para viabilizar esse objetivo negocial foi escolhido um membro da família para ser eleito Deputado Estadual. O indicado para a tarefa foi Tonho da Lua, irmão mais novo de Paulo Zinca. Tonho era um sujeito meio abobalhado, característica que rendeu o apelido. Seu nome de batismo e registro cartorial era André Antônio Zinca.
Para efetivar a eleição do irmão, Paulo Antônio reservou a quantia de R$ 5 milhões de reais. Na sequência, realizou os contatos com as pessoas certas. Começou a “campanha eleitoral” de Tonho da Lua com uma produtiva conversa com pastor Patrício Rosque, o conhecido PR, ministro da Igreja do Evangelho Transcendental dos Últimos Dias. O pastor Rosque tinha influência ou controle sobre 500 votos da comunidade de Santa Mary. Todos esses eleitores estavam devidamente cadastrados com nome, endereço e, principalmente, zona e seção eleitoral em que votavam.
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A “negociação” entre Paulo Antônio e Patrício Rosque foi conduzida nos seguintes termos:
a) PR recebeu R$ 100.000,00 em dinheiro vivo;
b) PR forneceu a lista dos 500 eleitores agrupada por seção eleitoral (20 votos na seção 267, 35 votos na seção 269, 42 votos na seção 271 e assim por diante);
c) no final do dia eleição seriam conferidos, pelos boletins de urna, a quantidade de votos “contratados” em cada seção eleitoral para o candidato Tonho da Lua;
d) garantidos os votos para o candidato, o pastor PR receberia, no dia seguinte ao pleito, o valor de R$ 200.000,00, também em dinheiro vivo.
A negociação com o pastor PR foi repetida outras dezenas de vezes com outros pastores e lideranças comunitárias. Ao final da “campanha” eleitoral de Tonho da Lua, que também contratou algumas centenas de cabos eleitorais e fez promessas de vantagens e empregos para eles e familiares, foram contabilizados 18.369 votos nas urnas no Estado de Sucupira. Com esse número de votos “legitimamente” obtidos e rigorosamente contabilizados pelas urnas eletrônicas, o novo Deputado Estadual estava eleito e os negócios da família garantidos por mais quatro anos.
Meu novo livro trata desse assunto. O título e subtítulo da obra é o seguinte: “Como escolher seu deputado. Pequeno manual para orientar o eleitor no dia 2 de outubro de 2022”. Ele está disponível no meu site no seguinte endereço eletrônico: aldemario.adv.br.
Explorei, em linhas gerais, os dois tipos básicos de votos: a) fisiológico e b) de opinião. Registrei que a construção de uma sociedade livre, justa e sustentável exige que o “voto fisiológico”, aquele que elegeu o Deputado Tonho da Lua, seja minoritário e, no limite, alcance a posição de ser meramente residual. Para tanto, três caminhos foram recusados, inclusive por ineficiência: a) a atuação de mitos, super-heróis, salvadores da Pátria, escolhidos por Deus ou coisa parecida; b) o recurso a golpes ou soluções autoritárias e c) a confiança platônica nas instituições estatais para operar mudanças profundas na realidade social. Apontei como único caminho aceitável, embora demorado e trabalhoso, aquele pautado por altas e energéticas doses de conscientização, organização e mobilização políticas, com a utilização de ferramentas educacionais e democratização econômica dos meios de comunicação.
A conclusão, e resumo, do livro pode ser observada na seguinte passagem: “caro eleitor, preste atenção, por favor, em relação aos candidatos:
a) na trajetória pessoal, profissional e política;
b) na forma de fazer política e, especialmente a campanha eleitoral;
c) nas propostas e compromissos apresentados e
d) sobretudo, nos interesses socioeconômicos defendidos ou representados (em que “lado” está o postulante)”.
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