Toni Reis* e David Harrad**
Hoje, 5 de maio de 2021, completam-se dez anos desde a decisão unânime e histórica do Supremo Tribunal Federal (STF) que reconheceu a união estável homoafetiva e a equiparou à união estável entre casais heterossexuais, já com indicação que o reconhecimento se estenderia ao casamento civil, o que aconteceu de fato em 2013 por decisão do Conselho Nacional de Justiça.
Neste período de dez anos, ninguém perdeu nenhum direito, e em torno de 10% da população brasileira ganhou a proteção do Estado, herança, segurança jurídica, além de ser reconhecida como família. Demonstra inclusive o que afirmou o estudioso alemão, Petzhold, que no mundo há 196 tipos de família, não uma só. A família homoafetiva é apenas mais um tipo. Todas as formas de família merecem respeito, desde que cumpram as leis e seus deveres como cidadãos.
E os avanços não pararam por aí. Em vista da omissão do Legislativo em relação ao reconhecimento da isonomia de direitos das pessoas LGBTI+, com base em preceitos constitucionais, nos anos que sucederam o STF desencadeou uma série de decisões importantíssimas para nossa comunidade.
Leia também
Em 2015, o STF reconheceu o direito de adoção conjunta de filhos por casais homoafetivos. Houve o reconhecimento pelo STF do direito das pessoas trans à identidade de gênero em 2018. Em 2020, reconheceu a natureza discriminatória da restrição à doação sangue por homossexuais, além da revogação no mesmo ano de leis municipais que proibiam a abordagem de questões de gênero e LGBTI+ nos estabelecimentos de ensino.
Importante dizer que é notório que a comunidade LGBTI+ enfrenta discriminação, violência, estigma e preconceito, que vêm principalmente de uma cultura religiosa, em partes fundamentalista, e também heteronormativa. Portanto, foi extremamente significativo o reconhecimento pelo STF em 2019 de atos LGBTIfóbicos como uma forma de racismo, puníveis como tal.
De todos os avanços mencionados acima, a criminalização de atos LGBTIfóbicos e o enfrentamento do fundamentalismo impulsionado pela falácia da “ideologia de gênero” na educação são as questões que estão sendo mais difíceis de concretizar. Através da Aliança Nacional LGBTI+, estamos trabalhando nos estados junto aos Ministérios Públicos, Defensorias Públicas, Secretarias de Segurança Pública e Conselhos LGBTI+ para que estas decisões do STF sejam de fato cumpridas no âmbito local.
Além disso, ainda não houve avanços com as reivindicações das pessoas trans quanto ao uso do banheiro de acordo com a identidade de gênero, e nem com as demandas das pessoas intersexo, no sentido de proibir que bebês e crianças intersexo sejam submetidos a cirurgias de genitália até que tenham discernimento quanto ao que seria mais apropriado para eles. A movimentação neste campo ainda é incipiente.
Em suma, houve muitas decisões positivas para a comunidade LGBTI+ brasileira em um período relativamente curto de tempo, talvez a uma velocidade tal que a sociedade em geral ainda não tenha conseguido assimilar em todos seus aspectos. O que é alentador são as novas gerações, que parecem estar rompendo com aspectos da cultura heteronormativa e de desprezo às diferenças, passando a abraçar o respeito e valorização da diversidade.
*Toni Reis e David Harrad** vivem como casal desde 1990. São casados no civil e também na Igreja Anglicana. São pais de três filhos, agora com 15, 18 e 20 anos. Toni Reis é doutor em educação e presidente da Aliança Nacional LGBTI+.
O texto acima expressa a visão de quem o assina, não necessariamente do Congresso em Foco. Se você quer publicar algo sobre o mesmo tema, mas com um diferente ponto de vista, envie sua sugestão de texto para redacao@congressoemfoco.com.br.
Deixe um comentário