As indústrias químicas brasileiras são fundamentais para a economia. Foi o que o governo federal declarou, por escrito, no Decreto nº 10.329, de 28 de abril de 2020, que incluiu o setor como um dos serviços essenciais durante a pandemia. Mas a edição da Medida Provisória (MP) 1095/21, que elimina o Regime Especial da Indústria Química (Reiq), que garante tratamento tributário mais favorável ao segmento, trouxe uma série de incertezas para o setor e pode ter efeitos no bolso do consumidor.
O alerta foi feito por senadores e representantes da indústria química durante webinar realizado nesta quarta-feira (25) pelo Congresso em Foco para discutir os efeitos da eventual aprovação da MP. Participaram do debate os senadores Luis Carlos Heinze (PP-RS) e Lasier Martins (Podemos-RS), o presidente da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Ciro Marino, o diretor de Relações Institucionais da entidade, André Passos, e o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Roberto Flamenghi. A mediação foi do diretor do Congresso em Foco Análise, Rudolfo Lago.
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Ciro Marino, presidente da Abiquim, afirmou que o processo de extinção do Reiq foi algo “gradual” e que a extinção do regime diferenciado trará grande impacto para o setor e também para o consumidor de outros produtos. “Como reflexo específico da extinção do Reiq, eu posso encaminhar duas vertentes. Uma delas é a insegurança jurídica que, ao nosso ver, é o maior problema hoje. E uma outra vereda, que é caminharmos nos impactos mercadológicos e financeiros”, declarou.
A Abiquim adverte que o aumento tributário provocado pelo fim do Reiq acabará sendo repassado aos custos, provocando um efeito dominó que atingirá praticamente toda a produção em um momento em que o país sofre fortemente o impacto da inflação.
Publicidade“Pior momento”
O senador Lasier Martins considera que a MP provoca um “grande prejuízo” ao país no “pior momento”. A medida provisória em tramitação no Senado deverá impactar na alta da inflação. O IPCA-15, prévia da inflação, divulgado esta semana, já indica um aumento anual da inflação superior a 12%. No seu último Boletim Macrofiscal, o Ministério da Economia já revisara sua expectativa de inflação para este ano, passando a previsão de 6,5% para 7,9%. Tal situação corre o risco de se agravar, se a alta de impostos na indústria química acabar sendo repassada pelo aumento de custos para toda a cadeira produtiva.
“A medida só traz prejuízos, e vem no pior momento: em cima de um conflito no Leste Europeu e onde nós temos um risco de não ter os fertilizantes de lá. Os produtos químicos são fundamentais na nossa vida, eles estão em todos os setores. Assim como a água e a energia elétrica, a indústria química é produto de primeira necessidade”, ressaltou o senador.
Atualmente, o Brasil importa 85% dos fertilizantes que utiliza e, somente da Rússia, vêm 23% dessas importações. Dessa forma, quanto mais dependente do produto internacional, mais vulnerável estará a indústria nacional.
A MP fala em preservação e retorno do Reiq em janeiro de 2023. Na prática, no entanto, os dispositivos incluídos no texto do relator acabam com o regime. O texto aprovado dá ao Poder Executivo a responsabilidade de regulamentar as contrapartidas elencadas, sem estabelecer um prazo para tal providência. Em outras palavras, permite que se protele a nova regulamentação do regime.
Perda de empregos e arrecadação
A Abiquim estima que a MP provocará efeitos extremamente danosos à indústria química, com a perda de R$ 5,5 bilhões anuais no Produto Interno Bruto (PIB). “O preço dos produtos gerados pela indústria química é formado fora do Brasil. Sem o Reiq, o setor vai perder competitividade, o que representará uma retração de R$ 11,5 bilhões na produção”, afirmou Ciro Marino.
Segundo a entidade, a medida também resultará na perda de 85 mil empregos e na queda da arrecadação do governo com impostos. A associação também se preocupa com o impacto da medida na competitividade da indústria brasileira em relação ao mercado internacional. “Apesar de a intenção declarada, ao cancelar o Reiq, seja aumentar a arrecadação, na prática, com a redução da atividade industrial, o governo deixará de recolher R$ 1,7 bilhão”, informou Marino.
O diretor de Relações Institucionais da Abiquim, André Passos, ressaltou que um dos impactos da extinção do regime especial é a ausência de estímulos suficientes para a indústria competir no mercado internacional. “A extinção do Reiq leva a um aumento dessa distância entre o Brasil, Coreia do Sul, França, Alemanha, Japão, Estados Unidos e China, que são as principais economias industrializadas. Ou seja, desta forma, nós vamos acelerar o processo de desinvestimento no setor industrial brasileiro”, disse.
A entidade e 75 outras instituições que apoiam a manutenção do Reiq trabalham para que o Senado rejeite ou deixe a MP caducar, ou seja, não a aprecie até o seu prazo final, que é o dia 1º de junho. Uma outra possibilidade é a modificação da MP dando garantias de manutenção do regime especial.
O vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado da Bahia (Fieb), Roberto Flamenghi, explicou que a instituição tem atuado juntamente do Congresso Nacional para preservar as indústrias petroquímicas. “De 2014 até hoje, o regime especial foi muito importante para as indústrias. E, de repente, nós temos a possibilidade de perder esse incentivo. O Reiq é uma forma de subsídio para incentivar a indústria a fazer novos investimentos e se manter atualizada”, defendeu.
No Congresso
A MP 1095 foi aprovada em 17 de maio pelos deputados. O relator da proposta, deputado Alex Manente (Cidadania-SP), apresentou um Projeto de Lei de Conversão (PLV), que, diferentemente do que propunha o governo no texto original, estende o benefício até 2027.
Segundo ele, a extensão do regime fiscal diferenciado levou em consideração a importância do setor para toda a economia brasileira.
O texto original previa o fim imediato do incentivo. Mas a Câmara decidiu propor uma nova transição até 2027, com extinção a partir de 2028. Em vez de acabar em 31 de dezembro de 2024, o incentivo vai até 31 de dezembro de 2027.
O senador Luis Carlos Heinze afirmou que encaminhou uma emenda ao relator da MP no Senado, Weverton Rocha (PDT-MA). Segundo ele, o dispositivo “praticamente mantém o Reiq”. “Nós ainda temos que acertar uma emenda de plenário com o Weverton e negociar com o governo sobre a importância do regime. Vou trabalhar para que nós possamos aprovar este destaque”, disse o senador, que é um dos principais aliados do governo no Senado.
A medida provisória é a segunda tentativa do Executivo de retirar de uma só vez os incentivos ao setor. A primeira tentativa foi por meio da MP 1.034/2021, cujos efeitos começariam em julho daquele ano. No entanto, o Congresso alterou a matéria e estabeleceu uma transição de quatro anos para o fim dos incentivos.
Com o fim do incentivo, o Poder Executivo estima aumentar a arrecadação em R$ 573 milhões neste ano de 2022. De acordo com o Palácio do Planalto, a medida seria necessária para compensar a isenção de R$ 1,13 bilhão no Imposto de Renda concedida entre 2022 e 2024 para empresas aéreas com leasing de aeronaves.
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