Iluminar paredes para iluminar ideias e pessoas. Essa é a pegada de uma rede formada por milhares de colaboradores no Brasil e em outros países para projetar para a sociedade mensagens políticas em espaços públicos. Da necessidade do uso de máscaras como medida preventiva contra a covid-19 à importância da preservação ambiental. Da cobrança de Justiça pelo assassinato de Dom Phillips e Bruno Pereira às denúncias de violência policial.
Do “Fora, Bolsonaro” ao “SOS, Amazônia”, nada escapa à Rede Nacional de Projecionistas Livres, iniciativa mais conhecida como Projetemos. Nem mesmo o Cartão da Transparência, ferramenta do Congresso em Foco que permite ao cidadão ter a um toque no celular acesso a informações sobre os gastos com dinheiro público feitos por deputados. Projeções do Cartão da Transparência foram feitas em São Paulo e Brasília, entre outras cidades, convocando os brasileiros a conhecerem mais de perto a forma de atuação de seus representantes na Câmara.
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Cadastrando-se, você pode receber notificações em seu smartphone sempre que um deputado pedir o ressarcimento dos valores gastos à Câmara, tal como se estivesse recebendo automaticamente informações sobre compras feitas com seu próprio cartão de crédito. Desde o início da legislatura, em fevereiro de 2019, a Câmara gastou quase R$ 800 milhões com despesas dos parlamentares como alimentação, hospedagem, passagens aéreas, aluguel de veículos e compra de material de escritório.
“A gente amou a ideia do monitoramento do orçamento”, diz a co-fundadora do movimento Brunna Rosa ao explicar a iniciativa de projetar mensagem sobre o Cartão na fachada da Biblioteca Nacional de Brasília e em outros lugares no final de outubro. A cientista política e os projecionistas Mozart Santos e Felipe Spencer são os criadores do Projetemos, projeto que começou em 2020, ainda nos primeiros meses da pandemia.
O trio de amigos teve a ideia inicial de lançar luzes contra fake news sobre a covid-19 e a favor da adoção de medidas sanitárias básicas, como uso de máscara e lavagem de mãos, para se proteger do coronavírus.
O Projetemos nasceu como uma hashtag e cresceu com a participação espontânea de uma rede de colaboradores. Qualquer um pode participar, criar conteúdo e compartilhar os posts. Basta uma ideia na cabeça, uma mensagem no papel, um projetor e uma parede disponível. A imagem não precisa ficar projetada por muitos minutos. Mais vale registrar o momento e disseminá-lo pelas redes sociais, universalizando o recado a ser dado.
Pode ser um muro em ruínas em uma comunidade qualquer. Pode ser na arquitetura imponente da Esplanada dos Ministérios, em Brasília, ou da Avenida Paulista, em São Paulo. Ou em qualquer outro lugar do mundo. “Sempre estamos prezando por falar pelos minorizáveis, que são a maioria do nosso país. Eles são a coisa mais importante. A ideia é iluminar paredes, iluminando pessoas”, explica o artista visual paraibano Felipe Spencer. Ele, Bruna e Mozart coordenam mais de 100 grupos no Whatsapp com participantes e interessados em fazer projeções.
“Nós temos obra hoje no acervo da USP, do Museu da Língua Portuguesa, em uma bienal na Romênia. Alcançamos várias esferas. Falamos sobre política social, sobre arte, sobre intervenção urbana”, complementa Mozart, DJ pernambucano radicado em São Paulo que também trabalhava com projeções em eventos e se viu, premido pela pandemia, obrigado a ficar em casa sem levar sua arte ao público. “Nós nos denominamos uma rede, não um coletivo, porque não dá pra contar quantas pessoas somos. Uma pessoa projeta e manda foto para a gente. Aí ela se sente parte”, acrescenta.
Só no Instagram o Projetemos conta com mais de 105 mil seguidores. Mozart explica que não importa onde a projeção seja feita nem por quem. “A gente quer falar uma mensagem. A forma como ela vai ser projetada, se dentro de casa, dentro do congelador, ou num prédio grande ou numa árvore não importa. O importante é que o local contribua para potencializar a mensagem”, observa. “O Projetemos chega como um grito de socorro”, emenda Felipe, ao explicitar a urgência da mobilização política no país por meio da palavra e da imagem.
Veja na galeria abaixo um pouco do trabalho do Projetemos:
Outros grupos também têm atuado internacionalmente no uso das projeções como espaço de manifestação política. Em setembro, por exemplo, a US Network for Democracy in Brazil (Rede nos Estados Unidos pela Democracia no Brasil), que reúne acadêmicos de mais de 50 universidades americanas, ativistas e organizações da sociedade civil, projetou imagens contra o presidente Jair Bolsonaro na sede da ONU em Nova York.
Bolsonaro desembarcava na cidade para fazer discurso de abertura da Assembleia da ONU e se deparou com expressões como “Brazilian shame” (vergonha brasileira) e “desgrace” (desgraça).
Em junho, o grupo britânico POW, sigla de Projeções em Muros, em parceria com ativistas brasileiros, cobrou esclarecimentos sobre o desaparecimento do jornalista britânico Dom Phillips e do indigenista brasileiro Bruno Pereira, mortos por contrabandistas no interior do Amazonas.
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