Enquanto achavam que estavam abafando e que iam tomar o poder, os bolsonaristas amaram o vídeo da catarinense Fátima Mendonça Jacinto Souza invadindo o Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 8 de janeiro. Com a típica cara de “tia do zap”, de “vovó de bem”, a senhora de 67 anos quebrou tudo, fez sujeira no prédio da Suprema Corte e a tudo festejava dizendo que ia “pegar o Xandão”, referindo-se ao ministro do STF Alexandre de Moraes, cuja careca virou o alvo do ódio bolsonarista.
Depois, quando todo mundo foi muito justamente preso, a “Vovó Fátima”, como a turma da direita do zap chamava, foi tratada como pobre vítima da truculência policial. Uma “senhora de bem”, “patriota” que só queria o melhor para o seu país.
Passadas duas semanas daquele que foi um dos mais tristes dias da história republicana brasileira, os grupos de zap da extrema-direita querem distância de “Vovó Fátima”. A senhora é velha conhecida da polícia, com extensa ficha corrida. Tentou fraudar o INSS para ganhar uma pensão indevida. É processada por estelionato e falsificação de documentos. E foi presa em flagrante por tráfico de drogas em 2014.
Fonte da Polícia Federal que atuou nas prisões e nos interrogatórios da horda detida após o 8 de janeiro conta que “Vovó Fátima” está longe de ser uma exceção entre os presos daquele dia. Foram identificadas diversas pessoas com ficha corrida na polícia. Outros traficantes. Ladrões de toda ordem. Machões processados pela Lei Maria da Penha. Corruptos ricos com falso registro para receber benefícios do Auxílio Brasil. Sonegadores. Um ladrãozinho, por exemplo, levou um notebook com etiqueta de patrimônio que estava dentro do plenário do Supremo.
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Na verdade, a quantidade de gente desonesta se passando por “cidadãos de bem” não surpreende. Democracias são péssimas para gente desonesta. Ditaduras são uma maravilha para elas. Mesmo em democracias falhas – e a nossa ainda é muito falha – funciona muito mais o Estado Democrático de Dreito. Funcionam muito mais as instituições. E com muito maior possibilidade as leis são de fato cumpridas.
Nas ditaduras, tudo isso é substituído pelo famoso “Sabe com quem está falando?”. E ninguém precisa ser exatamente amigo do ditador de plantão para ficar preservado. Há amigos de vários níveis para livrar a barra dos criminosos com um “Sabe com quem está falando?”: de ministros, senadores e deputados a delegados e até o “guarda da esquina”. Aliás, é bom lembrar que quando foi instituído o Ato Institucional nº 5, o ex-vice-presidente Pedro Aleixo comentou que seu maior medo nem era dos generais, era do poder que se daria ao “guarda da esquina”.
O que fazem, então, os bandidos de todos os calibres? Incomodados com o alcance das leis nas democracias, aproximam-se das ditaduras. E fingem dizer que fazem isso em nome da moralidade, em favor da pátria. Amigos dos ditadores, poderão, então, bater nas suas mulheres, fraudar o INSS, roubar, traficar drogas… Como faz a “Vovó Fátima”.
Há diversos, inúmeros escândalos de corrupção ocorridos durante os 21 anos de ditadura militar no Brasil. Muitos só ficaram conhecidos depois porque na época havia censura à imprensa. Muitos ficaram impunes porque os envolvidos eram amigos dos ditadores de plantão.
Brasília purga de maneira eterna o triste assassinato da menina Ana Lídia, em 1973, aos sete anos, porque entre os suspeitos do estupro seguido de assassinatos estão vários filhos de autoridades daquela época.
Um outro exemplo é o caso Lutfalla, de empréstimo de dinheiro público para uma empresa falida que pertencia ao sogro do então prefeito Paulo Maluf, de São Paulo. Maluf foi punido? Ou seu sogro? Não. Maluf foi prefeito, governador, deputado e o último candidato à Presidência da ditadura, derrotado por Tancredo Neves em 1985 no Colégio Eleitoral. Só foi alcançado depois da redemocratização do país.
“Vovó Fátima” é um protótipo de tudo isso. Sonha com um tempo em que possa fraudar o INSS e traficar drogas impune. É por isso que se veste de verde e amarelo e quer “pegar o Xandão”…
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