A Polícia Civil do Pará prendeu na noite desta terça-feira (16) um homem suspeito de ser o autor dos disparos que atingiram o líder indígena Lúcio Tembé, no último fim de semana, em Tomé-Açu, no nordeste do estado. O anúncio da prisão foi feito pelo governador Helder Barbalho (MDB). Juscelino Ramos Dias, conhecido como “Passarinho”, foi preso em flagrante quando se preparava para fugir de Tomé-Açu.
“Parabéns às equipes de Segurança Pública do Estado que, de forma integrada, trabalham com agilidade para solucionar o caso. #AquiNão”, comemorou Helder Barbalho no Twitter.
O cacique está internado desde domingo e deve passar por uma cirurgia no rosto nesta quarta-feira (17). Segundo Paratê Tembé, filho do cacique, o líder indígena está consciente e o seu quadro de saúde é considerado estável.
A tentativa de assassinato se soma a uma série de atentados sofridos por indígenas, quilombolas e ribeirinhos, na região, cercada pelo dendê e disputada pela indústria de óleo de palma Brasil Biofuels (BBF), no Vale do Acará. Após o atentado, um comitê de crise foi formado na última segunda-feira (15), sob a liderança do Ministério Público do Pará.
Em nota enviada ao Congresso em Foco, a BBF repudiou qualquer tentativa de se ligar o episódio à empresa (veja a íntegra mais abaixo).
De acordo com o delegado-geral da Polícia Civil, Walter Rezende, após uma investigação integrada foi possível identificar e localizar o suspeito do crime. “Com o intenso trabalho das equipes foi possível reunir elementos informativos comprobatórios da autoria do crime, e inclusive a possível motivação, que seria a venda de substâncias ilícitas em terras indígenas, o que não era aceito por Lúcio Tembé”, infirmou o delegado-geral.
PublicidadeSegundo Walter, o cacique discutiu com Juscelino, a quem acusou de fomentar o tráfico de drogas na aldeia. Com o suspeito foram encontrados cerca de R$ 4 mil. Lúcio tentava desatolar o próprio veículo em uma estrada que dá acesso ao território da aldeia Turé-Mariquita, em Tomé-Açu, quando foi atingido por disparos feitos por dois homens encapuzados em uma motocicleta. Ferido com tiro no rosto, ele foi levado às pressas para o Hospital Metropolitano de Urgência e Emergência (HMUE), localizado em Ananindeua, Região Metropolitana de Belém.
“Foi um atentado”
“Eles atiraram no rosto do meu pai para matar. Não levaram nada. Foi um atentado”, disse Paratê ao Congresso em Foco. Segundo ele, Lúcio estava acompanhado de um sobrinho, que testemunhou a ação dos criminosos e socorreu o líder indígena. Os disparos foram efetuados por volta das 22h30 desse sábado (13).
O sobrinho escondeu Lúcio em uma mata até as 23h30, quando apareceram as primeiras pessoas na estrada. De lá, o cacique foi levado até a delegacia de Tomé-Açu e, em seguida, a um hospital. Ele foi transferido para Belém em um avião municipal por volta das 8h de domingo.
Paratê diz que, embora não tenha provas da origem do atentado, os moradores da região sofrem com ameaças constantes do agronegócio. “Todos aqui sofremos ameaças de morte devido ao conflito agrário. Estamos todos com medo. Já houve várias tentativas frustradas de atentado que não se concretizaram por causa da nossa alta proteção. Mas não estamos seguros totalmente”, disse o indígena. “Vivemos uma tensão constante aqui”, acrescentou.
Denúncia de tortura
O Ministério Público do Pará (MPPA) solicitou, no último dia 17, a prisão de Eduardo Schimmelpfeng da Costa Coelho, dono da BBF, considerada a maior produtora de óleo de palma da América Latina. O pedido de prisão também se estende ao chefe de segurança da empresa no município, Walter Ferrari.
Segundo a agência de notícias Amazônia Real, as acusações se referem à tortura de 11 pessoas da comunidade tradicional Vale do Bucaia. As vítimas foram espancadas com chutes e golpes de cassetete, obrigadas a inalar spray de pimenta, amarradas e mantidas sob tortura por mais de sete horas, conforme denúncia do Ministério Público do Pará (MPPA). O episódio ocorreu em outubro de 2021.
“Os denunciados se deslocaram para o local dos fatos com aproximadamente 50 (cinquenta) veículos que continham cerca de 50 funcionários da segurança e 350 trabalhadores denominados ‘rurais’, dos quais 50 desses estavam também na função de segurança e armados com tonfas e escudos, tal qual uma polícia tática, comandados pelo denunciados para cometer os crimes”, relatou o MPPA.
De acordo com a Amazônia Real, a denúncia, assinada por Emério Mendes da Costa, promotor titular da Procuradoria de Justiça de Igarapé-Miri, aponta que um “grupo com características paramilitares” atua reprimindo comunitários que vivem em terras reivindicadas pela BBF.
A BBF disse à Amazônia Real que “repudia as calúnias envolvendo seus executivos”. “Trata-se de uma narrativa fantasiosa, baseada em informações falsas relatadas por uma ex-funcionária e seu parceiro, também ex-funcionário, demitidos devido a condutas antiéticas e que buscam afetar a reputação e imagem da empresa”, afirmou a companhia em nota enviada à agência.
Veja a íntegra da nota da BBF de repúdio à tentativa de assassinato do cacique e de vinculação do episódio à empresa:
“GRUPO BBF REPUDIA DECLARAÇÃO FALSA SOBRE O SEU ENVOLVIMENTO
NO ATAQUE AO CACIQUE LUCIO TEMBÉ E REFORÇA APOIO À CONCLUSÃO
DA POLÍCIA CIVIL DO PARÁ
O Grupo BBF (Brasil BioFuels) inicialmente cumprimenta o Governo do
Estado do Pará e enaltece o trabalho das equipes da Polícia Civil, pelo rápido
esclarecimento sobre a tentativa de homicídio sofrida pelo cacique Lúcio
Tembé na madrugada do último domingo, dia 14, e vem a público repudiar
a declaração sem fundamento do procurador do Ministério Público Federal,
Sr. Felipe de Moura Palha.
Em coletiva realizada no dia 15 de maio em Belém, no Estado do Pará, o
procurador vinculou o contexto enfrentado pela antiga empresa Biopalma,
adquirida pelo Grupo BBF em novembro de 2020, com a tentativa de
assassinato do Cacique Lucio Tembé na madrugada de 14 de maio. Visando
prejudicar a reputação da empresa, o procurador da república convocou
audiência com autoridades públicas e por meio da assessoria de
comunicação do Ministério Público do Pará enviou release à imprensa
nacional, mencionando que “desde a instalação da empresa Biopalma ao
redor da Terra Indígena Turé Mariquita, em Tomé-Açu, vários episódios de
violência contra os indígenas já ocorreram, relatam os ofícios expedidos
pelo MPF neste domingo”. Uma clara estratégia de ilação, com objetivo de
tirar o foco das investigações e prejudicar a empresa, que já vem sendo
perseguida pelo procurador há mais de 2 anos, o qual faz acusações levianas
e sem provas e/ou fundamentos do envolvimento da empresa contra povos
tradicionais do Estado do Pará.
A empresa destaca ainda, que, conforme apontado na investigação da
Polícia Civil do Pará, trata-se de um “acerto de contas” envolvendo o cacique
e J.R.D. – vulgo “passarinho”, preso em flagrante por tentativa de homicídio
na tarde de 16 de maio, motivado pelo possível envolvimento com tráfico
de drogas na região. Em coletiva de imprensa realizada na Delegacia Geral
da Polícia Civil em Belém, nesta quarta-feira (17), o delegado geral da Polícia
Civil detalhou a diligência deste caso, que corrobora com o contexto da
situação que a empresa vem alertando e notificando as autoridades
públicas há mais de 2 anos: Tomé Açu e Acará estão dominadas pelo crime,
invasores indígenas e o crime organizado tomam conta do local. As áreas
invadidas se tornaram pontos de tráfico de drogas, motivação da tentativa
de assassinato do cacique. Trabalhadores e moradores são vítimas desta
teia do crime, que age no roubo de frutos de dendê para vendê-los a
empresas receptadoras que atuam de forma ilegal na região.
Dentre as invasões promovidas pelo grupo formado por invasoresindígenas
Tembé, a empresa destaca o resultado da conclusão do Relatório da Polícia
Federal N° 3553885/2022 que integra o Inquérito Policial IPL 2022.0023227-
SR/PF/PA, instaurado em 12 de abril de 2022 e concluído em 26 de setembro
de 2022. O Relatório da Polícia Federal do Pará aponta que existe atuação
criminosa na invasão de terras por indígenas Tembé em áreas da empresa.
Segundo conclusão do relatório da Polícia Federal, são “pessoas agindo em
causa própria e cometendo crimes patrimoniais contra a empresa, sem
quaisquer indícios de interesses da comunidade indígena, uma vez que
restou cristalino que os crimes vêm sendo cometidos por indivíduos alheios
à comunidade indígena que se utilizam do retromencionado status para o
cometimento de crimes com interesses pessoais”. Uma importante
conclusão, que destaca não ser uma ação coletiva da comunidade indígena
que reside na região, mas sim de indivíduos que se beneficiam do status de
indígenas para praticar o crime e utilizar veículos de imprensa, ONGs e rede
sociais para se colocarem como vítimas no caso. Situação que se repetiu,
infelizmente, neste caso do ataque ao cacique Lucio Tembé.
O relatório aponta também que não há, por parte da empresa BBF, invasões
e/ou sobreposições de terras em áreas indígenas demarcadas e reforça a
acusação de que os indígenas “admitem colher e comercializar o dendê
plantado pela empresa na região limítrofe, o que em tese estaria
configurado o crime de furto, realizado individualmente por cada família”.
O relatório da Polícia Federal também foi anexado ao processo criminal
0000329-55.2016.8.14.0076 no TJPA que tem como réus o cacique Lucio
Tembé e seu filho Paratê Tembé, liderança indígena que desde 2015 vem
praticando os mesmos crimes desde à época da antiga empresa Biopalma,
que foi adquirida pela BBF em novembro de 2020. Dentre os crimes
tipificados no processo criminal acima, estão associação criminosa, furto
qualificado, dano qualificado e incêndio qualificado. Existe, desta forma,
uma atuação reiterada dos mesmos crimes praticados pelos mesmos
indivíduos em desfavor das empresas, dos trabalhadores e das
comunidades da região.
A Companhia vem sendo vítima de invasões em suas terras há mais de 2
anos, promovidas pelo grupo formado por lideranças indígenas e
quilombolas que residem nas regiões do Acará e Tomé-Açu. A ação
criminosa deste grupo envolve roubos, furtos, incêndios criminosos em
instalações físicas e equipamentos da empresa, agressões contra
trabalhadores, vandalismo contra patrimônio, tentativa de estupro,
tentativas de homicídio, entre outros. Todos os casos estão documentados
em mais de 750 boletins de ocorrência registrados e em dezenas de ofícios
enviados aos órgãos públicos estadual e federal.
Por fim, o Grupo BBF reforça acreditar no poder público e na gestão do
Governo do Estado para solução das invasões de terra. Mesmo com a
situação crítica enfrentada com invasões e violências realizadas pelo grupo
criminoso, a empresa segue garantindo a manutenção dos mais de 5 mil
empregos diretos gerados no Pará e confirma a sua perspectiva de
ampliação de investimentos no Estado, cujo propósito é acelerar a
descarbonização da Floresta Amazônica, gerar empregos e
desenvolvimento socioeconômico nas regiões onde atua.”
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