Ismar Viana*
Tem-se ouvido falar, desde sempre, em crise moral e ética do povo brasileiro. A ideia que se tenta passar é que a corrupção, no âmbito da Administração Pública, decorre do processo de colonização, que nasceu assim, cresceu assim e será sempre assim.
Isso não é verdade e precisa ser desmistificado. O que possibilita o desvio de recursos públicos e estimula o desvio ético dos agentes públicos é o modus operandi de projetos ilegítimos de manutenção de poder, que se materializa na máxima “uma mão lava a outra”.
Esse ambiente se fertiliza com o compadrio interinstitucional, omissões, condescendências, projetos pessoais se sobrepondo a finalidades institucionais, minando a acreditação social no Serviço Público, impactando na escassez de recursos, no aprofundamento de desigualdades sociais. É assim que morrem as democracias.
O desconhecimento também alimenta esse terreno danoso: a educação liberta na perspectiva individual e coletiva. Se os brasileiros não conhecem o papel das instituições incumbidas de garantir a manutenção de um ambiente democrático, nunca saberão, pelo menos na dimensão certa, a importância de viver em um Estado Nacional e Democrático de Direito.
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Felizmente, na democracia estão previstos antídotos contra ervas daninhas. Um dos mais eficientes é a liberdade de atuação das instituições de controle. Se o gestor da coisa pública não é o dono dela, é essencial que agentes do próprio Estado tenham independência, autonomia e segurança para serem os olhos da sociedade no Estado, e que façam jus a essa responsabilidade. Afinal, a coisa pública não é coisa de ninguém; é coisa de todos.
Portanto, um sentimento que me toma com vigor nesses 200 anos de independência do Brasil é a crença na materialização dessa liberdade, na investigação e responsabilização exemplar dos abusos institucionais dos que usam de seu poder político e institucional para manietar, limitar e perseguir agentes das instituições incumbidas do dever de reprimir a malversação de recursos públicos.
Parafraseando Lulu Santos, acredito num novo começo de era, em que cada agente público venha a sair de cima do muro, a enxergar e acreditar na plena possibilidade de uma vida melhor no futuro. Isso, de fato, fará a diferença.
Mas, mesmo diante da omissão daqueles que se furtam ao dever de proteger os que acreditam nessa nova era institucional, práticas abusivas que partem, de igual modo, dos acometidos da cegueira do bom senso e que atuam para que as instituições não cumpram as suas missões constitucionais, o terreno institucional democrático há de mostrar que a “lei é pra qualquer um, seja quem for”, principalmente porque o povo já percebeu que “usufruir do bom, do mel e do melhor é comum, pra qualquer um, seja quem for”, como já dizia Dominguinhos
E, como a história já revelou que não há arsenal que vença a luta contra quem tem ideais, quem tem a missão de pacificação social, resta-nos, então, seguir os ensinamentos de Geraldo Vandré e continuar “caminhando e cantando e seguindo a canção”, rezando para que todas as instituições republicanas nos permitam acreditar que, realmente, “somos todos iguais, braços dados ou não.”
*Ismar Viana é Mestre e doutorando em Direito Administrativo (PUC-SP), é membro consultor da Comissão Especial de Direito Administrativo Sancionador do Conselho Federal da OAB e presidente da Associação Nacional dos Auditores de Controle Externo dos Tribunais de Contas do Brasil (ANTC). Membro do Instituto de Direito Administrativo Sancionador Brasileiro (Idasan).
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