Cleber Lourenço *
No último domingo tivemos atos pelo impeachment de Jair Bolsonaro, compostos de forma majoritária por grupos e partidos de oposição ao Partido dos Trabalhadores. Até aí, é do jogo democrático, está valendo.
Porém, com exceção de Kim Kataguiri, do PDT e do Cidadania, representado por Alessandro Vieira, nenhum outro partido (incluindo o PSDB) contou com o presidente da legenda assinando um pedido de impeachment.
Menção (des)honrosa para o Vem Pra Rua, que inclusive teve entre seus membros o suposto lobista Marconny Faria, que hoje está enrolado na CPI da Covid.
Há votos no Congresso Nacional para viabilizar o impeachment? Não. Há disposição política para conquistá-los? Menos ainda.
É o recado que PSL, DEM, PSDB, MDB, Novo, PP, PSD, Patriotas, Republicanos e PSC quando seus respectivos presidentes não endossam nenhum dos mais de cem pedidos de impeachment protocolados.
Estranhamente, a maioria dos partidos na lista busca construir a chamada terceira via eleitoral. A versão política da teoria da geração espontânea é uma ideia obsoleta e ultrapassada de que algumas formas de vida são geradas espontaneamente de matéria inanimada.
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PublicidadeÉ a mesma coisa aqui, sem base social ou apelo popular, tenta-se criar uma alternativa política entre Lula e Bolsonaro, mas cômico ainda é o fato de os envolvidos nessa construção serem em sua maioria, ex-bolsonaristas fervorosos.
E, infelizmente, até o presidente e a sua retumbante reprovação possuem base social. Bolsonaro bota gente nas ruas, Lula bota gente nas ruas e a terceira via é aquilo a que assistimos no domingo.
E repare, em nenhuma das conversas levam em consideração o eleitorado. DEM e PSL se empolgaram com a possível fusão e a superbancada que criariam, dizem que isso poderia viabilizar uma terceira via eleitoral, como? Mistério.
Temos também o risível caso envolvendo João Amoêdo, fundador do Partido Novo. Ele afirma que “a terceira via não será viável sem a participação da sociedade”.
Sim, Amôedo descobriu as eleições. É isso que dá viver sob a égide da antipolítica. Você começa a dizer platitudes como se fossem novidades. Vide o seu partido, uma bagunça generalizada.
E não para por aí.
Uma pesquisa da MDA, instituto de opinião pública contratado pela Confederação Nacional dos Transportes (CNT), realizada em fevereiro deste ano, mostra que 59,8% dos brasileiros são contra a entrega ou venda do patrimônio público para a iniciativa privada.
E quem está lá dizendo que, caso seja presidente, venderá a Petrobras para criar um monopólio privado? Sim, João Dória.
Num país que lida com uma epidemia de desempregados, corrosão do poder de compra, inflação e onde comer virou um luxo, já quem decida debater temas pouco atraentes para os brasileiros.
Mas e o PT? E o Lula?
Desde a redemocratização, o PT esteve em todas as disputas de segundo turno para a Presidência da República e possui um forte enraizamento nos movimentos sociais. Governou 13 dos 36 anos de redemocratização do país. Dizer que o PT depende do Bolsonaro é passar um atestado de má-fé ou desconhecimento político.
Organização
O que sobra de robustez política no PT ou de base social no bolsonarismo falta em organização para a tal terceira via.
Sem exceção, grande parcela dos partidos presentes no grupo sofre até mesmo para ter alguma coesão interna.
O PSDB, assim como os demais, não conseguiu se organizar na questão do voto impresso. Nem mesmo o PP, que faz parte da base do governo.
Novo, DEM e PSDB estão quase rachando no meio por conta do impeachment.
E isso se reflete na formação da tal frente ampla de terceira via. Não há um consenso. Ao mesmo tempo temos Doria, Rodrigo Pacheco, Mandetta, Alessandro Vieira e Podemos com sua fé inabalável no Sergio Moro, agressor do Estado de Direito.
Herança maldita
E a pá de cal nessa aventura é o fato de que uma frente antibolsonaro, composta por ex-bolsonaristas, disputa votos, palanques e apoio diretamente com Jair Bolsonaro.
Enquanto Lula não perde e nem ganha com uma provável retirada do pleito eleitoral, essa seria a única chance do grupo de se viabilizar eleitoralmente – mesmo que sem base social, seria uma transferência quase que direta de votos.
Estranhamente são mais inertes com medidas que inviabilizem o presidente. Os pedidos por impeachment, cassação da chapa e afins são diminutos e até tímidos em alguns casos.
A terceira via é um trem sem direção que não sabe como chegar ao seu destino e tampouco qual seria ele.
Diz ser contra o bolsonarismo, mas vota com o governo, diz que é oposição, mas não sabe se é contra o impeachment, é contra o bolsonarismo, mas é parte (informal) da base do governo.
Se fosse uma pessoa, seria alguém com transtorno dissociativo de identidade.
Em tempo
A Câmara aprovou a quarentena para juízes, militares, policiais e integrantes do Ministério Público. Quatro anos de quarentena para ocupar cargos políticos. E embora só passe a valer em 2026, é um importante passo para o aperfeiçoamento da nossa democracia.
Chega de aventureiros e alpinistas sociais usando dinheiro e cargos públicos para tumultuar a política brasileira.
Ao articular a viabilidade da quarentena eleitoral, Arthur Lira deu um importante passo em prol da política e da democracia.
Mesmo com todos os erros, emplacou um importante acerto.
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