Do auxílio-gás, passando pelo Bolsa Escola até o Programa Bolsa Família, o Brasil viveu um ciclo de aprimoramento da qualidade das políticas assistenciais, durante 20 anos. Até que o Auxílio Brasil deu passos atrás nesse processo, diminuindo a capacidade de focalização, gerando ineficiência e comprometendo a efetividade do programa, apesar dos ganhos orçamentários. O novo governo deve aproveitar a oportunidade para corrigir os erros e avançar na área social.
Até os anos 1990, boa parte das políticas assistenciais no Brasil eram feitas de maneira indireta e pontual. Promovia-se a distribuição de cestas básicas em áreas carentes, principalmente do Norte e Nordeste, cujas compras eram centralizadas em Brasília. Além disso, havia desvios e desperdício de mercadorias pela falta de controle logístico. A natureza complexa e intermitente desse tipo de política dificultava o combate efetivo à fome e à pobreza extrema.
Nesse cenário, o governo de Fernando Henrique Cardoso inovou com a instituição do auxílio-gás e do bolsa alimentação, no qual famílias muito pobres receberam de R$15 a R$45 por mês, dependendo do número de beneficiários na família. Ainda durante o período FHC, houve a nacionalização do Bolsa Escola, implementado por Cristovam Buarque, no Distrito Federal. O Bolsa Escola distribuía os auxílios a famílias cujas crianças frequentassem regularmente a escola.
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Pela primeira vez no Brasil, houve a nível federal um programa de transferência direta de renda focalizado em famílias muito pobres e que, ao mesmo tempo, incentivava a educação dos filhos, visando quebrar o ciclo da pobreza.
O governo Lula juntou esses programas, criando o Bolsa Família. A unificação facilitou a gestão dos recursos e sua destinação às famílias participantes. Outra mudança foi a adição da condicionante da vacinação infantil em dia, ajudando a ampliar a cobertura vacinal no país. Nesse período, houve também o fortalecimento dos Centros de Referência de Assistência Social (CRAS) e dos agentes sociais que auxiliam as famílias a acessar os benefícios. Um ciclo de modernização e aumento da eficiência da política social.
A implementação do Auxílio Brasil foi na direção oposta a esses avanços. O programa não preza pela focalização na concessão dos benefícios, ou seja, famílias numerosas e muito pobres acabam recebendo o mesmo valor que famílias menores e com alguma fonte de renda. Também não integra a estrutura já existente dos CRAS e dos assistentes sociais, tampouco inclui a participação do sistema escolar, que poderia auxiliar na promoção do mérito estudantil.
PublicidadeÉ fundamental, portanto, que o próximo governo decida retomar a trajetória de melhoria nos programas sociais. A Lei de Responsabilidade Social seria um primeiro passo nessa direção. O projeto propõe a aglutinação dos programas Salário Família, Abono Salarial e Seguro Defeso, além do próprio Auxílio Brasil. Por sua vez, estes seriam consolidados em um novo desenho, com três eixos: Benefício de Renda Mínima, para os extremamente pobres; Poupança Seguro Família, para os trabalhadores de baixa renda, incluindo os informais; e Poupança Mais Educação, para os jovens concluintes do Ensino Médio que passarão a integrar o mercado de trabalho.
Apesar dos desafios atuais, o próximo governo tem à sua disposição uma boa proposta liberal para estimular a emancipação econômica e promover a igualdade de oportunidades como elementos fundamentais de uma sociedade livre e justa. Uma oportunidade de aumentar a eficiência, sem ampliar os custos, multiplicando o potencial emancipatório da política social.