A relação entre o discurso de ódio na política e a pulsão de morte proposta por Freud é um tema interessante e complexo, trata-se da exata intersecção entre política e psicanálise. Freud descreve o conceito de pulsão de morte (Tânatos) como uma força destrutiva, inerente ao ser humano, responsável por tendências de agressividade e destruição que coexistem com as pulsões de vida (Eros), voltadas à preservação, criação e continuidade. O conceito de pulsão de morte nos ajuda a entender o discurso de ódio na política como uma forma de externalizar impulsos destrutivos. Observamos ao longo da história o discurso do ódio em diferentes momentos: seja no Nazismo na Alemanha, nos códigos de Jim Crow nos USA ou no regime de Apartheid na África do Sul.
O discurso de ódio, especialmente no contexto político, é uma expressão de hostilidade e violência direcionada a grupos específicos. Ele se caracteriza por desumanizar o “outro”, reforçar hierarquias de poder e alimentar ressentimentos e divisões. Esse tipo de discurso pode surgir como resposta a crises sociais, econômicas e culturais e muito frequentemente é impulsionado por líderes carismáticos, autoritários e de impulsos narcísicos que canalizam frustrações e medos coletivos contra “bodes expiatórios”, como minorias, imigrantes, opositores políticos ou algo mais abstrato como “o Sistema”.
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Freud nos alertava para a potencial destruição dos laços sociais*, na medida em que o discurso do ódio rompe os pontos de contato de identificação entre indivíduos, reforçando divisões que dificultam a empatia e o diálogo, aprofundando antagonismos. Imagino Freud hoje analisando nossa sociedade “algorítmica”…. observando a pulsão da morte em suas dinâmicas coletivas, como grupos de WhatsApp, Telegram ou Dark web, ambientes que potencializam, legitimam, reverberam e escalam o discurso do ódio.
Os grupos bolsonaristas funcionam como câmeras amplificadoras de delírios persecutórios. Mídia comprada, eleição roubada, judiciário corrupto… ao se confrontarem com a realidade no espelho há uma inconformação incontrolável e desconcertante para quem perdeu contato com a realidade dos fatos. O Brasil não é nem virou uma ditadura. Francisco aparentemente agiu sozinho, mas o mesmo conjunto de valores, as mesmas motivações de Francisco motivaram a turba que invadiu e vandalizou o Congresso Nacional em 8 de janeiro. Há um conjunto de valores em comum que unem Francisco ao enorme grupo de bolsonaristas extremistas, antidemocráticos. A liberação descontrolada da pulsão de morte por meio de discursos de ódio tem implicações graves, de um adoecimento psíquico (individual ou coletivo), como a a escalada da violência simbólica (narrativa) para violência física.
Precisamos de mais e mais estudos sobre o impacto do discurso do ódio na saúde psíquica individual, mas também seus reflexos na saúde psíquica coletiva, já que a exacerbação do discurso do ódio pode, no limite, nos levar à aniquilação dos “outros”. Hannah Arendt, grande estudiosa da sociedade que chegou neste ponto de aniquilação dos “outros” já nos alertava sobre as condições de “temperatura e pressão” da sociedade alemã à época do florescimento do Nazismo “A sociedade como um todo estava doente”.
*Psicologia das Massas e Análise do Eu (1921), S. Freud.
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