Em um ato para demonstrar apoio político, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) negou que tenha tramado um golpe, reconheceu a existência de um decreto instalando um “Estado de Defesa na sede do Tribunal Superior Eleitoral”, chamada de “minuta do golpe”, e defendeu anistia aos presos pelos atos antidemocráticos de 8 de janeiro de 2023.
A manifestação bolsonarista reuniu uma multidão na Avenida Paulista, em São Paulo, neste domingo (25). Parlamentares e governadores como Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) e Ronaldo Caiado (União-GO) marcaram presença. Alvo de uma série de investigações, durante o seu discurso, Bolsonaro evitou atacar frontalmente o Supremo Tribunal Federal e se disse perseguido politicamente.
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“A última agora, ou a penúltima: Bolsonaro queria dar o golpe. Isso desde que assumi em 2019, ouvia. O que é golpe? É tanque na rua, é arma, é conspiração, é trazer as classes política e empresarial para o seu lado. Nada disso foi feito no Brasil”, disse Bolsonaro durante seu discurso. “Agora, o golpe é porque teve uma minuta de um decreto de estado de defesa. Golpe usando a Constituição? Tenha santa paciência” (leia, no final da reportagem, a íntegra do discurso de Bolsonaro).
Bolsonaro disse que o estado de sítio e de defesa tem um ritual, como a convocação do Conselho da República ou de Defesa. Segundo ele, ninguém foi convocado para “tramar ou botar no papel” uma proposta. Assim, o ex-presidente disse que o “estado de sítio” ou estado de defesa não foi decretado ou oficializado.
Bolsonaro disse ainda que está sendo perseguido desde antes da eleição de 2018 e citou os inquéritos em curso contra ele no Supremo Tribunal Federal. Segundo ele, a “perseguição” aumentou quando ele perdeu as eleições presidenciais e deixou o cargo de chefe do Executivo.
“O povo brasileiro não merece estar vivendo por esse momento, onde tão poucos, pouquíssimos, causam tão mal a todos nós. Nós ainda podemos fazer muito pela nossa pátria”, disse Bolsonaro.
PublicidadeVestidos de verde e amarelo e com bandeiras do Brasil e de Israel, os apoiadores de Bolsonaro acompanharam o discurso de aproximadamente 20 minutos.
“O que eu busco é a pacificação, é passar uma borracha no passado. É buscar maneira de nós vivermos em paz. É não continuarmos sobressaltados. É por parte do Parlamento brasileiro (…) uma anistia para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília. Nós não queremos mais que seus filhos sejam órfãos de pais vivos. A conciliação. Nós já anistiamos no passado quem fez barbaridades no Brasil. Agora nós pedimos a todos 513 deputados, 81 senadores, um projeto de anistia para seja feita justiça em nosso Brasil”, disse o ex-presidente.
Investigação da PF
A Operação Tempus Veritas, deflagrada pela Polícia Federal no início de fevereiro, atingiu em cheio a extrema direita ao localizar na cena do crime o ex-presidente Bolsonaro, o seu entorno de militares e outras figuras importantes do seu governo, todos enredados na construção de uma trama golpista para tentar mantê-lo no poder e ignorar o resultado eleitoral de 2022.
Bolsonaro teve de entregar seu passaporte e está proibido de deixar o país e de se comunicar com os demais investigados. Também estão envolvidos nas investigações ex-ministros importantes, como os generais Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, apontados como artífices de manobras golpistas. Ao menos 16 militares estão sob a mira da PF.
As apurações da Polícia Federal indicam que Bolsonaro, diferentemente do que sempre sustentou, participou de reunião para discutir uma forma de não reconhecer a eleição de Lula e pediu mudanças na minuta do decreto que buscava efetuar um golpe de Estado. Segundo as investigações, o então presidente recebeu o texto das mãos de seu assessor especial Filipe Garcia Martins, preso nesta manhã, e do advogado Amauri Saad, apontado como autor da tese. Além de Filipe, outros três militares ligados diretamente ao ex-presidente tiveram a prisão preventiva decretada. As ações foram autorizadas pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Outros políticos no ato
Durante o ato, congressistas bosonaristas, como Gustavo Gayer (PL-GO) e Nikolas Ferreira (PL-MG), também fizeram discurso. A ex-primeira-dama Michelle Bolsonaro (PL) também falou e focou seu discurso em aspectos religiosos, que, segundo ela, devem ser levados em conta na política.
“Por algum tempo fomos negligentes ao ponto de falarmos que não se poderia misturar política e religião. E o mal tomou”, disse Michelle.
Por determinação da Constituição, o Brasil é um país laico. Ou seja, o Estado não pode estar ligado diretamente a nenhuma religião.
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), também discursou e exaltou ações do governo Bolsonaro. Tarcísio disse que “não era ninguém” e que o ex-presidente apostou nele.
A fala de Tarcísio vem logo depois de o governador ter momentos de certa aproximação com o atual presidente e desafeto de Bolsonaro, Lula (PT). Neste domingo (25), Tarcísio disse que Bolsonaro é “sempre presidente”.
- íntegra do discurso de Bolsonaro na Avenida Paulista:
“Meu Deus. Esse povo brasileiro não merece estar vivendo por esse momento. Onde tão poucos, pouquíssimos, causam tão males a todos nós.
Nós sabemos que o mal não é eterno. Mas lá na caixa de ferramentas, que é a Bíblia brasileira, que é a Bíblia cristã, tá escrito que nós devemos fazer tudo o que está ao nosso alcance. Quando não mais for possível, entreguemos na mão de Deus. Nós ainda podemos fazer muito pela nossa pátria. A liberdade é um bem maior, mas, ao longo dos meus 4 anos de presidente da República, nós aprendemos que esse bem não é pétreo, não é eterno. Como um grande amor, todos os dias você tem que se preocupar com a sua liberdade.
Lembro lá, nos idos de 2018, no dia meia dúzia de setembro, em Juiz de Fora, cidade do nosso governador [de Minas Gerais, Romeu] Zema, eu fui covardemente agredido. Um cara, ex-filiado ao Psol, me esfaqueou. E eu lembro muito bem, fui muito bem atendido pelos médicos e enfermeiros da Santa Casa de Juiz de Fora. Depois vim para o Einstein, aqui em São Paulo. Nas mãos do Dr. Macedo, outro milagre. Logicamente que eu devo minha vida a Deus. Mas me lembro muito bem, naqueles momentos de rara lucidez, eu pedi apenas uma coisa a Deus: que ele não deixasse órfã a minha filha Laura, então com 7 anos de idade. Por que eu falei isso? Porque quando a gente fala em Estado Democratico de Direito, quando ele não é respeitado, nós fabricamos, ou melhor, aquela minoria fabrica órfãos de pais vivos. É lamentável o que vem acontecendo. O abuso de parte de alguns que trazem a insegurança para todos nós.
Quem sou eu? Eu sou igual a vocês. Só que do lado em direção a Curitiba. Da pequena cidade de Eldorado Paulista. Talvez 4000 habitantes. Mas ali eu me criei. Ali eu conheci a luta armada em 1970, onde foi executado pela esquerda, a pauladas, o tenente da então força pública de São Paulo, Alberto Mendes Jr.
Quis o destino que eu entrasse na carreira das armas, cursasse a Escola Preparatória de Cadetes em Campinas, a Academia Militar em Resende e saísse mundo afora. Minha última unidade de combate foi na longínqua Nioaque, Mato Grosso do Sul. Dali voltei para o Rio e entrei numa campanha de vereador. Sem nada, consegui me eleger. Depois me elegi deputado federal. Fiquei por 28 anos dentro da Câmara, muitas vezes discursando para as paredes, mas sentia que algo estava para acontecer. Em 2014 disse que seria presidente da República, lá no sagrado pátio da Academia Militar dos Agulhas Negras, em Resendes, e aconteceu. E eu tinha que fazer algo diferente do que sempre fizeram pelo Brasil.
Escolhi após a posse ministros técnicos e combatentes, muitos hoje consagrados na política, como o governador de São Paulo, Tarcisio de Freitas, o homem que pegou um orçamento minúsculo e fez grandes obras pelo Brasil. E não só foram obras de infraestrutura não, obras também… portos, aeroportos, que são de infraestrutura, mas obviamente fora da área terrestre. Escolhi também, acabou de sair daqui, o Marcos Pontes, o ministro da Ciência e Tecnologia que orgulha o Brasil inclusive fora de nossa pátria. Tivemos a Tereza Cristina na Agricultura. O nosso agronegócio é um exemplo, é algo que nos orgulha a todos no Brasil. Inclusive, durante os meus 4 anos, o MST não apareceu, não deu as caras, porque nos titulamos para mais de 4000 pessoas o seu pedaço de terra. E deixo claro: 80% dos títulos foram para as mãos das mulheres.
Assumimos 18. Em 19, aprovamos com o Parlamento brasileiro a Lei da Liberdade Econômica. Entramos em 2020, lamentavelmente a pandemia apareceu. Um sinal de interrogação para todo mundo, como em parte ainda é no dia de hoje. Fizemos o possível para atender a todo o Brasil. Demos auxílio emergencial para 68 milhões de pessoas e as mulheres, mães, recebiam o dobro desse valor.
Muita coisa foi aprovada, como programas do Proname e Bem, cuja iniciativa foi do então senador Jorginho Mello, atual governador do estado de Santa Catarina. Também mais para o final do ano aprovamos o Bolsa Família, onde o governo anterior pagava em média 19 reais, pagamos 600 reais, com responsabilidade fiscal, com a ajuda do Parlamento, tendo em vista a inflação no mundo todo. Aprovamos não a redução, mas a total isenção de imposto federal para os combustíveis no Brasil. Em São Paulo, no final de 2022, a gasolina ficou abaixo de 5 reais. O etanol ficou na casa dos 2,50.
Com esses ministros, como o João Roma, que está aqui, que cuidou dessa parte do social, nós fizemos o Brasil crescer. O Paulo Guedes foi um gigante na economia. Nós chegamos a crescer mais do que a China. Chegamos a ter, em 22, três meses de deflação em nossa pátria. Chegamos ao final do ano, depois daquela coisa que aconteceu em outubro de 2022, e vamos considerar isso uma página virada na nossa história, porque nós sabemos o que tem que ser feito para o futuro, para que todos não tenham dúvida da transparência daquilo que nós devemos ter, em especial quando se elege um representante nosso. Terminamos 22. Deixamos lá um saldo de 54 bilhões de reais. No ano passado tivemos um déficit na casa dos 180 bilhões de reais.
Mas a minha vinda aqui, como eu convidei a vocês, e eu estou muito orgulhoso e grato por vocês terem aceito esse convite, que era para termos uma fotografia para o mundo, uma imagem para o Brasil e para o mundo do que é a garra, a determinação do povo brasileiro. Essa fotografia está sendo inédita para todo o mundo. É uma mostra das cores da nossa bandeira, de quanto nós nos emocionamos quando cantamos o hino nacional, ou quando vemos hastear a nossa querida bandeira verde, amarela, azul e branca. E com isso, mostramos com essa fotografia que nós podemos até ver um time de futebol sem torcida ser campeão, mas não conseguimos entender como existe um presidente sem povo a teu lado.
Vocês nos trazem a esperança, nos trazem a energia, nos trazem a garra, nos trazem a certeza de que temos como vencer. Nós não queremos o socialismo para o nosso Brasil, nós não podemos admitir o comunismo em nosso meio, nós não queremos ideologia de gênero para os nossos filhos. Nós queremos respeito à propriedade privada. Nós queremos o direito, a defesa da própria vida. Nós queremos o respeito à vida desde a sua concepção. Nós não queremos a liberação das drogas em nosso país. Mas para isso nós devemos trabalhar todo dia dentro de casa, no trabalho, com os vizinhos e com os amigos. Nós sabemos então o que foi o período de 19 a 22, e estamos conhecendo agora como está difícil vencer nesse país o que nós temos a nos governar no momento.
E um último assunto, que é de extrema importância. Levo pancada desde antes das eleições de 2018. Passei quatro anos perseguido também enquanto presidente da República, e essa perseguição aumentou sua força quando deixei a Presidência da República. E deixo claro: na transição, fizemos a mesma sem qualquer reclamação por parte da esquerda. Saí do Brasil e esta perseguição não terminou. É jóia, é questão de importunação de baleia, é dinheiro que teria mandado para fora do Brasil, é tanta coisa, é tanta coisa que eles mesmos acabam trabalhando contra si. A última agora, ou penúltima: Bolsonaro queria dar um golpe. Isso desde quando assumi em 2019 eu ouvia, e parte da imprensa sempre reverberava isso. O que que é golpe? Golpe é tanque na rua, é arma, é conspiração, é trazer classes políticas para o seu lado, empresariais. É isso que é golpe. Nada disso foi feito no Brasil.
E, fora isso, por que continuam me acusando de um golpe? Agora, o golpe é porque tem um minuta de um decreto de Estado de Defesa. Golpe, usando a Constituição? Tenham a santa paciência. Golpe usando a Constituição. Deixo claro que Estado de Sítio começa com o presidente da República convocando os conselhos da República e da Defesa. Isso foi feito. Não. Apesar de não ser golpe o Estado de Sítio, não foi convocado ninguém dos conselhos da República e da Defesa para se tramar ou para se botar no papel a proposta do decreto de Estado de Sítio.
O segundo passo do decreto do Estado de Sítio: após o presidente ouvir os conselhos, ele manda uma proposta para o Parlamento, e essa proposta é analisada pelo Parlamento. E o Parlamento quem decide se o presidente pode ou não editar um decreto de Estado de Sítio. O Estado de Defesa é semelhante. Ou seja, agora querem entubar a todos nós que um golpe usando dispositivo da Constituição, cuja palavra final quem dá é o Parlamento brasileiro, estava em gestação. Creio que está explicada esta questão.
Teria muito a falar. Tem gente que sabe o que eu falaria. Mas o que eu busco, [governador de Goiás, Ronaldo] Caiado, e a pacificação, é passar uma borracha no passado, é buscar maneira de nós vivermos em paz. É não continuarmos sobressaltados. É por parte do parlamento brasileiro, [deputados] Nikolas [Ferreira], [Gustavo] Gayer, Zucco, [Marco] Feliciano, meus colegas auqi do lado, é uma anistia para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília. Nós não queremos mais que os seus filhos sejam órfãos de pais vivos. A conciliação. Nós já anistiamos no passado quem fez barbaridades no Brasil. Agora, nós pedimos a todos os 513 deputados, 81 senadores, um projeto de anistia para que seja feita justiça em nosso Brasil. E quem porventura depredou patrimônio, que nós não concordamos com isso, que pague. Mas essas penas, essas penas fogem ao mínimo da razoabilidade. Nós não podemos entender o que levou poucas pessoas a apenarem tão drasticamente esses pobres coitados que estavam lá no 8 de janeiro de 2023.
A defesa que eu queria já fiz para vocês. Essa fotografia vai rodar o mundo. Vai rodar o mundo, tenho certeza disso, e após esse pronunciamento a gente pede a Deus que ilumine a todos, até aqueles poucos ou raros que nós não gostamos, para que voltem a pensar com o coração, com a razão, e nós possamos fazer com que o nosso Brasil prossiga na sua marcha.
Em 2024, agora, temos eleições municipais. Vamos caprichar no voto, em especial para vereadores. E também para prefeitos, também. E nos preparemos para 26. O futuro a Deus pertence. Nós sabemos o que deve ser feito no futuro para que o Brasil tenha um presidente que tenha Deus no coração, que ame a sua bandeira, que se emocione quando cantam o seu hino nacional, que respeite a família brasileira e que ame de verdade o seu povo. Vocês sao os responsáveis por mim e pelo Tarcisio estarmos aqui. Nós somos privilegiados – se bem que, no momento, ele [é], porque eu não tenho mandato. Porque nós podemos decidir o futuro de todos vocês.
E também dizer que nós não podemos concordar que um poder tire do palco político quem quer que seja, a não ser por um motivo extremamente justo. Não podemos pensar em ganhar as eleições afastando os opositores do cenário político.
Então todos vocês, meus irmãos, minhas irmãs, meus amigos, eu quero agradecer a vocês. Agradecer à nossa Polícia Militar, que está fazendo o trabalho de segurança. Uma salva de palmas para a Polícia Militar. O irmão que oferece sua vida terá nossa vida. Merece todo nosso respeito e toda a nossa consideração. Também a Polícia Civil que está por aqui. Também a Guarda Metropolitana do Ricardo Nunes [prefeito de São Paulo], que está se fazendo presente também. E dizer a vocês: nós, homens, não vamos a lugar nenhum se você não tiver uma família estruturada, não tiver alguém do teu lado que reconheça os momentos difíceis e lute por você. As perseguições que falamos há pouco continuam, inclusive contra a nossa filha que tem apenas 13 anos de idade. Então todo homem deve ter alguém ao teu lado alguém que some, assim como toda mulher deve ter ao teu lado alguém que some, para que esses momentos difíceis possam ser superados.
E hoje, não é por mim, por coincidência meu pai faleceu exatamente com a minha idade, 68 anos. Tenho hoje 68 anos, já estou ultrapassando o tempo que meu pai viveu, e eu o tenho em boa memória. Com toda a sua truculência, com toda a sua maneira de educar seus filhos, mas ele está no meu coração. E o que eu quero e mais peço a Deus [é] que continue no coração de vocês. O meu trabalho, a minha dedicação, nada mais é do que servir à minha pátria, servir a todos vocês.
Muito obrigado, povo do Brasil. Muito obrigado, homens e mulheres desse Brasil fantástico e maravilhoso. Nós queremos e pedimos a Deus que nos dê forças para trabalhar, para persistir e para vencer. Não há vencedores ou vencidos. Todos nós seremos vencedores se a paz de Deus reinar sobre o coração de cada um de nós. Muito obrigado, Paulista. Muito obrigado, São Paulo. Muito obrigado, Brasil. Brasil acima de tudo, Deus acima de todos. Até breve. Um beijo nas mulheres e um abraço nos homens.”