No dia 31 de março faz aniversário o golpe militar de 1964. Sessenta anos depois de um dos mais tristes episódios da história do Brasil é necessário recordar os lamentáveis acontecimentos para afirmar de maneira categórica: DITADURA NUNCA MAIS.
Ao longo da história da humanidade é incalculável a quantidade de dor, sangue e sofrimento vivenciados em função dos mais variados tipos de governos opressores, violentos e contrários à mais elementar dignidade da pessoa humana, plasmada nos direitos fundamentais inscritos na Declaração Universal dos Direitos Humanos e repetidos em quase todas as constituições atuais.
A democracia é o regime político das liberdades de manifestação de pensamento, de imprensa, de aprender e ensinar, de divulgação cultural, de consciência e de crença religiosa, de orientação sexual, de organização e mobilização da sociedade civil, entre tantas outras. A plena realização da condição humana não rima com cerceamentos indevidos aos direitos e liberdades fundamentais. O projeto de afirmação do ser humano, nas perspectivas individual e coletiva, se alimenta de liberdade. Somente a liberdade é criativa e construtiva, aproveitando da melhor forma as mais sublimes energias humanas.
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A existência de um governo ou regime político democrático é uma conquista civilizatória da humanidade. Todo e qualquer problema existente nas sociedades humanas, dos mais simples aos mais complexos, reclamam equacionamento em ambiente democrático. A realização de qualquer objetivo socioeconômico, por mais meritório que possa ser concebido ou apresentado, não justifica a supressão da democracia política.
Nesse sentido, são amplamente conhecidas duas importantes frases. A primeira, atribuída a Alfred E. Smith, afirma que: “Todos os males da democracia podem se curar com mais democracia”. A segunda, que teria sido proferida por Winston Churchill, assevera que “a democracia é o pior dos regimes, à excepção de todos os outros”.
A Constituição brasileira de 1988 mostra uma especial preocupação com a preservação do regime democrático, como ambiente de realização das mais importantes e fundamentais liberdades humanas. Nessa linha, os direitos e garantias individuais foram caracterizados como não passíveis de restrições até mesmo por meio de emenda constitucional (art. 60, parágrafo quarto, inciso IV).
PublicidadeO constituinte originário apontou, para além de qualquer dúvida, a necessidade imperiosa de defesa da democracia e a qualificação da máxima gravidade dos atentados contra o regime democrático ao dispor no art. 5o, inciso XLIV, da Constituição: “constitui crime inafiançável e imprescritível a ação de grupos armados, civis ou militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático”.
Nessa linha, o Código Penal foi modificado pela Lei n. 14.197, de 2021, para definir os crimes de “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais” (artigo 359-L); e de “tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente constituído” (artigo 359-M).
Merece, portanto, a mais veemente repulsa, notadamente na passagem do sexagésimo aniversário do golpe de 64, a última e recente tentativa de abolição da democracia no Brasil.
Com efeito, a sociedade brasileira acompanha, cada vez mais estarrecida, o surgimento de inúmeros e robustos elementos que apontam para a gestação de um golpe contra a democracia no final do ano de 2022. Um presidente derrotado nas urnas e vários de seus auxiliares diretos, muitos oriundos dos meios militares, conspiraram contra o resultado do pleito eleitoral. Esses eventos alarmantes destacam a importância da vigilância ativa na proteção do Estado Democrático de Direito.
Consta, pelos relatos publicizados, que boa parte (a maior parte) dos comandos das Forças Armadas não se sujeitaram a participar da aventura golpista planejada. Assim, ao mesmo tempo que se impõe a crítica ao golpismo de ontem, deve ser registrado que a resistência em aderir ao golpismo de hoje demonstra um satisfatório nível de maturidade institucional e de compreensão do inestimável valor da democracia.
Em uma democracia é fundamental saber ganhar e perder, em termos políticos. Os derrotados devem aprender com o insucesso e, nos limites das regras do jogo, aprimorar argumentos, propostas e ações com o objetivo de convencer e vencer. Tentar “virar a mesa” e recorrer ao uso da força só demonstra, de forma inequívoca, o tamanho do deficit civilizatório de quem cogita e conspira contra o regime político consagrador das liberdades humanas mais importantes, duramente construídas em séculos de avanços sobre a barbárie.
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