A recente entrevista da ex-ministra da Mulher Damares Alves para o Congresso em Foco contém algumas senhas que podem ajudar a explicar o estranho e perigoso momento pelo qual o país está passando.
Em um determinado momento da entrevista, Damares afirma não acreditar que o presidente Jair Bolsonaro tomaria, ele próprio, alguma iniciativa no sentido de replicar no Brasil o que aconteceu nos Estados Unidos após a derrota de Donald Trump, a invasão do Capitólio. “Ele é sensato. Ele não é maluco”, diz Damares. “Ele pode ser impulsivo nas palavras, mas as ações de Bolsonaro nem sempre são iguais às palavras. Ele vai aceitar o resultado da eleição”, continua ela. E, aí, vem em seguida a senha: “Agora, ele não controla o povo”.
A onda de violência que vai se alastrando pelo país pode não sair inteira da mente do presidente ou dos seus estrategistas. Pode não ser totalmente deliberada. Mas se espalha porque, como disse Damares na entrevista, Bolsonaro “não controla o povo”.
Então. nós temos clubes de tiro sendo criados a cada dia pelo país. Uma população sendo armada como nunca. Estimulada a resolver ela própria suas diferenças em vez de chamar a polícia. Acende-se, assim, um rastilho de pólvora que pode resultar numa grande explosão em outubro. Uma imensa confusão. E, diante de um quadro de confusão generalizada, alguém afirma que não há condições para manter as eleições e propõe uma prorrogação de mandatos. Está dado o golpe. Desta vez, não será com tanques e exército nas ruas. Poderá ser assim, de forma mais sofisticada e sutil.
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O assassinato de Marcelo Arruda em Foz do Iguaçu é um trágico resumo do que pode estar por vir. Neste único episódio, temos, então, dois mortos e um outro na UTI, em estado grave.
Marcelo Arruda utiliza-se do clube de que era sócio para fazer sua festa de aniversário. E elege como tema da festa homenagear Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, seu candidato à Presidência da República. Algo totalmente legítimo. Vivemos em uma democracia. E todos têm o direito de declarar suas escolhas da forma que desejarem. É a partir daí, porém, que o rastilho de pólvora se acende.
O vigilante do clube, Claudinei Coco Esquarcini, dá acesso às imagens das câmeras de segurança do clube ao policial penal Jorge José Guaranho, que está em um churrasco, em outro clube. Guaranho vai, então, até onde está ocorrendo o aniversário com o claro propósito de provocar o aniversariante. Coloca alto uma música pró-Bolsonaro, estaciona seu carro na frente do salão e grita: “Aqui é Bolsonaro!”. Marcelo Arruda sai de dentro do salão e joga um punhado de terra no carro de Guaranho. Segundo a mulher do policial penal, talvez uma pedra. Uma imagem de vídeo mostra que já neste momento Guaranho saca do seu revólver. Ele arranca, porém, dali, prometendo voltar.
O que acontece em seguida mostra como se acende o rastilho de pólvora. “Ele não controla o povo”, diz Damares…
Marcelo Arruda poderia ter avisado à polícia. Ele próprio era guarda municipal. Sua mulher, Pamela, da Polícia Civil. Mas o que faz Marcelo? Vai buscar a sua própria arma. Quando Guaranho retorna, o que acontece é uma troca de tiros. Guaranho atira primeiro. Arruda revida. Ou seja: diante da sugestão que o ambiente político criado por Bolsonaro dá de que cada um resolva seus problemas com suas próprias armas, Guaranho atira em Arruda, e Arruda revida. É o rastilho de pólvora aceso. “Ele não controla o povo”, diz Damares.
Aparentemente, o que se parece desejar é que, diante de uma ameaça de violência, a resposta seja reagir com mais violência. E, aí, o caos está criado. “Ele não controla o povo”.
Na noite deste domingo, o primeiro personagem dessa história, Claudinei, apareceu morto na cidade de Medianeira, também no Paraná. O homem que passou as imagens das câmeras de segurança para Guaranho pulou do alto de um viaduto. Segundo a polícia, não havia ninguém com ele. Claudinei teria cometido suicídio.
Tudo muito estranho… Talvez Claudinei tenha mesmo se matado. Talvez tenha ficado com remorso ao saber que sua atitude resultou em um assassinato. Talvez tenha sofrido alguma forma a mais de pressão. Mas uma coisa é certa: sua morte não foi natural, e ela teve as suas motivações. Cabe, então, a pergunta: quem suicidou o vigilante do clube de Foz do Iguaçu?
Dois mortos, um outro gravemente ferido. Assim, vai-se se acendendo o rastilho de pólvora. “Ele não controla o povo”, disse Damares…
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