Vou republicar o primeiro, o segundo e o terceiro parágrafos de uma crônica que escrevi poucos dias antes do primeiro turno das eleições:
“Quando os instintos prevalecem sobre a inteligência, a inteligência apela aos instintos. Foi isso o que aconteceu depois do diagnóstico quase preciso que o presidente Lula fez sobre veículos de massa e a massa propriamente dita: o primeiro magistrado da nação disse que, hoje em dia, o governo dele é quem formava opiniões.
A massa de eleitores que vai eleger Dilma Rousseff provará que Lula – infelizmente – está certo. A meu ver, o que mais irritou a “mídia” acusada pelo presidente de ser “partidária” foi o fato de que, depois de todo o bombardeamento sofrido pelo governo, e de todas as cabeças que rolaram e, depois dos escândalos revelados ao grande público através dos jornais, televisão, rádio, internet e de todos os meios de “formação” de que dispunham, depois disso tudo, não houve e nem haverá reação significativa por parte do grande eleitorado “formado” por Lula, que acabará derrotando (tanto faz se no primeiro ou no segundo turno) não a oposição, mas os jornais e revistas que, segundo o presidente, comportam-se como partidos políticos.
O Estadão admitiu que faz campanha para José Serra. Mandou a pluralidade, a imparcialidade e a hipocrisia para o espaço sideral. Uma atitude corajosa. Ou uma escorregada exemplar. Os outros, que perderam o pudor e a continência, deviam também perder a timidez e seguir o jornal paulista”.
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Na semana seguinte, Maria Rita Kehl foi demitida do Estadão por “delito de opinião”. Os colunistas do jornal não se manifestaram. Sinceramente, eu não esperava que se solidarizassem, que escrevessem crônicas enlutadas e/ou recheassem suas colunas com receitas de rocambole (como fez o próprio Estadão na época em que foi censurado pela ditadura militar). Claro que eu não esperava que organizassem piquetes nem que ameaçassem demissão coletiva, até mesmo porque ninguém tem obrigação de pensar como a colunista que foi demitida por “delito de opinião”. Mas que os colunistas do Estadão podiam ter mencionado o ocorrido – o fato! a notícia! – até mesmo por uma questão de desencargo de consciência (nem vou falar em dever profissional..), ah, isso eles podiam… No entanto, silenciaram, foram omissos e, em última análise, coniventes com o expurgo. Para mim, garantiram o empreguinho e perderam a credibilidade. Depois, é aquele chilique generalizado quando Lula diz que o seu governo é quem forma opiniões…
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De volta para o futuro.
Antes de qualquer coisa, quero dizer que nunca fui petista nem tucano e não votei em Dilma Rouseff nem em José Serra (constrangedor ter que explicar a piada).
Pois bem. Dilma não é Lula, e os “formadores de opinião” agora estão remoendo suas feridas e não só continuam os mesmos hipócritas, mas – podem apostar – depois de uma pequena trégua (e apesar das “mãos estendidas” da presidente eleita) voltarão à carga, muito mais agressivos, sanguinolentos, parciais e demolidores.
Além disso, vejo cenas de assassinato aqui na minha bola de cristal. Ou melhor, cenas de favorecimento ao canibalismo, incentivo ao suicídio. Como se o país fosse induzido a um estado puerperal, como se agora – depois do parto – a fêmea rejeitasse violentamente seu rebento parido das urnas.
A finalidade é desviar a atenção da audiência deslumbrada. Vejo um banquete. Uma festa de gala do PMDB. Um desfile de cobras, lagartos albinos e pênis decepados (até isso…). A música é péssima. Vejo uma gente esquisita dançando e gordas vestidas de preto, acho que são lésbicas. Sim, parece que elas estão felizes. É dia 31 de outubro de 2011, o primeiro dia das bruxas depois das eleições deste ano. Vejo homens rastejando aos pés dessas mulheres. A música é de amargar. As gordas defecam, urinam e se masturbam mutuamente. Jogam dardos num eunuco desfalecido. Um guindaste mantém uma jaula suspensa sobre a piscina, vinte ex-homens se espremem dentro dessa jaula. As gordas se divertem: além de jogar dardos no eunuco, lançam restos de comida e fezes na direção da jaula. A piscina está vazia. Os prisioneiros disputam os excrementos às mordidas. A música é ruim mesmo, e o trocadilho da letra “forma/ fôrma” é tão imbecil que somente poderia ser cotejado aos restos mortais que as gordas lançam para os ex-homens enjaulados. São animais. Um minuto! A bola de cristal está embaçada: nuvens negras, raios e trovoadas turvam minha visão (que já não é muito confiável…). Ainda assim, consigo vislumbrar uma ave agourenta que sobrevoa a festa infernal, um híbrido de tucano com urubu ou algo que diz que o tranco vai ser grande e que a “presidenta” não é o cara, e ela será cobrada por isso, muito cobrada. E o cara, finalmente livre dos protocolos, liturgias e rapapés correspondentes, continuará falando muita merda (?) por aí e será homenageado na Sorbonne com um título de doutor honoris causa.
Aqui em Higienópolis, Fernandinho Henrique vai morrer de inveja – uma inveja poliglota, invejará Lula em inglês e espanhol e vai morrer de inveja em seu francês impecável. Também vejo tornozelos inchados e cansaço, esgotamento. Uma atmosfera de peido congelado, como diria Henry Miller. Falta de senso de humor e intolerância – de ambos os lados e também de dentro para fora e de baixo para cima. Vejo uma guerra suja. Interna. Ameaças que se concretizam. A dissimulação não vai dar conta da iniquidade, as máscaras vão cair e, do meio do esgoto, um homem que vendeu a alma prum diabo de quinta categoria se insurgirá e conclamará pela união nacional e é claro que ele não será ouvido porque o seu perfil de medalha e o seu discurso são carcomidos, corrompidos e ultrapassados.
Golpes, traições, insurreições. Editoriais furiosos escritos por hackers enaltecendo a Virgem Maria, a família e a propriedade; sangue fétido, cadáveres reais e virtuais, penas de aluguel. Opa! Que é isso? Uma gengiva sorridente? Unhas micosadas! Um clarão irrompe no meio da tempestade. Sim, um clarão. É oficial. Vejo um homem de chapéu-coco, peruca loira, bigodinho de chupar periquita: aparentemente, é um homem tosco, democrático e semi-analfabeto. Sim, é ele mesmo. Um grande e inesperado líder ungido pelo jerimum e pelas massas que gritarão seu nome nas ruas e repetirão um refrão grudento e obsceno. Vou tentar decifrar esse refrão, tenho que me concentrar. Um momento… Será isso mesmo?
Ah, meu Deus. Não posso revelar essa visão sob o risco de perder minhas habilidades psicocinéticas. Os habitantes da bola de cristal (confeccionada na Confecom) vetaram essa parte. Mas eis que de repente, não mais que de repente, a festa das gordas vingativas se transformou num churrasco de pagodeiros. Vejo mulheres seminuas e jogadores de futebol cheirando cocaína, elas são muito gostosas e todas têm a mesma tatuagem. Um escorpião? Ou seria uma salamandra? Algo assim, eu não consigo divisar a tatuagem na bunda das garotas: sei que elas passam por um brete e o palhaço chupador de grelos que desembarcou do clarão imprime sua marca a ferro e fogo. Sim, trata-se de uma reunião de jogadores de futebol, palhaços e ex-presidentes. Não me interessa quem come quem, mas posso assegurar que a maioria no Congresso e no Senado é apenas uma ilusão. Uma frágil ilusão. Tudo é vaidade. Tudo é ilusão. Tudo é pó: que vem diretamente dos Andes pra trincar o nariz da rapaziada. Também vejo catástrofes, enchentes, desabamentos. Um acidente aéreo de grandes proporções e atentados a bomba nas maiores cidades da Europa e dos EUA. Os habitantes da bola de cristal alertam nossas autoridades sobre os perigos da tríplice fronteira. Nossas autoridades não estão nem aí pros habitantes da bola de cristal e nem aí pra tríplice fronteira. Mas James Cameron está, e o seu Avatar 5 será rodado em Foz do Iguaçu.
Vejo que minha bola de cristal é meio canastrona e redundante, todavia continuo vislumbrando incêndios, doenças tropicais e também vejo que a rua Oscar Freire será invadida por craqueiros zumbis vindos da Estação da Luz. Vejo a polícia do Alckmin descendo a porrada e o pessoal dos direitos humanos reclamando da política higienista do PSDB. Ato contínuo, vislumbro a gravata italiana de Andrea Matarazzo dizendo que se trata de uma conspiração de petistas. O ressentimento e o racismo estão no ar. Os nordestinos que ajudaram a eleger Dilma que se cuidem na terra dos Bandeirantes. Vejo uma multidão arrastada pelo cabresto. As igrejas evangélicas tomarão conta de 50% da programação da tevê aberta. Berlusconi e Sarkozy serão flagrados pelo Google em plena suruba numa ilha do Adriático.Também vejo que um grande sacana, quero dizer, um grande líder do PMDB vai morrer, e o Brasil passará três dias de luto… não por causa da morte desse grande filho da puta, mas porque um rei (não sei se é rei do futebol ou da MPB ou do breganejo…) também vai bater as botas no mesmo dia e, portanto, no final do ano de 2011 (ou será 2012?), não teremos o Especial na Globo (eita!, isso é bom), também vejo um terremoto na Indonésia e – no mês seguinte – uma grande onda que se levantará na África e atingirá o litoral brasileiro. O estado da Paraíba será o mais afetado. Muita gente vai morrer afogada, porém, antes de João Pessoa submergir, Lady Gaga se submeterá a um tratamento genético revolucionário desenvolvido na Universidade da Paraíba e terá um filho travesti com Madonna – em três meses, esse placebo será gerado a partir do ventre de uma jumenta. Alguns dirão que é o novo Messias. Isso é grave. Preciso avisar meus amigos paraibanos. Vou mandar um e-mail pro Rinaldo Fernandes agora mesmo. Saia daí, meu chapa! Ou… converta-se! Vejo moluscos e algas marinhas venenosas cobrindo o pomar de Rita. Ouço o silvo rouco das sereias de Montale. Rita Medusa, Rita Sereia.
O ano de 2011 será especialmente bom para as lésbicas piscianas e para os acarás bandeiras nascidos no primeiro decanato de agosto e, quando chegar setembro, quero me mandar pra Jacarepaguá, onde – diz a letra de uma marchinha antiga – o petróleo nasce e não para de jorrar. Não posso revelar mais nada, e gostaria de encerrar dizendo que 90% dos juízos e previsões e sortilégios citados aqui nessa crônica não refletem necessariamente minhas opiniões e vontades. Se eu pudesse, incluiria X e Y e Z nas respectivas seções de acidentes, desaparecimentos e obituários. No entanto, como sou apenas um escriba nada modesto e metido a bidu, não me atreverei a ir um milímetro além daquilo que me é dado antecipar. Só isso. Quem não gostou que reclame com as nuvens, fadas e miragens. Se eu fosse a Dilma, renunciaria na próxima segunda-feira. Tenham todos um ótimo final de semana.
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