Texto escrito em parceria com Maiane Bittencourt, consultora política e parlamentar, pesquisadora do Observatório do Legislativo Brasileiro (OLB-IESP). Doutoranda em Ciência Política (UFPR).
No começo do século 20, especialistas começaram a se debruçar sobre o que faz com que mais ou menos mulheres sejam eleitas para os parlamentos pelo mundo. Até os anos 80, poucos países, como Finlândia, Suécia e Noruega, tinham uma boa quantidade de mulheres no poder legislativo. Entender essa mudança na política foi essencial para compreender um dos grandes avanços políticos da época.
Apesar de não serem muitas, a presença dessas mulheres já era suficiente para questionar ideias antigas sobre poder político. Por exemplo, em 1985, a pesquisadora Norris desafiou a noção de que os homens sempre dominam os níveis mais altos de poder. Ela achava importante olhar além dessa generalização e entender melhor o que estava levando mais mulheres para a política, demonstrando que mulheres conseguem se eleger.
No entanto, o interesse pelo tema veio à tona com o trabalho de Maurice Duverger em 1955. Seu livro apontou que a desigualdade de gênero não era só uma questão de quem concorria às eleições, mas também de quem era escolhido. Desde então, os cientistas políticos têm tentado explicar por que o número de mulheres eleitas varia tanto. As teorias geralmente se dividem em três grupos: culturais, socioeconômicas e institucionais.
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A abordagem cultural olha para fatores como etnia e religião, e como eles influenciam a aceitação das mulheres na política. É importante saber se as pessoas veem as mulheres como boas líderes ou não. Isso também ajuda a entender quanto tempo faz com que um país adote a possibilidade de todos voltarem, sem restrição alguma. Já a visão socioeconômica sugere que em sociedades onde as mulheres já competem por poder (seja na sociedade, seja na política) é mais provável que elas consigam cargos políticos. Essa linha de pesquisa foca em quantas mulheres trabalham e em que profissões elas estão, como no direito, por exemplo.
Até o início dos anos 2000, as variáveis institucionais eram vistas como as mais importantes. A maneira como os partidos escolhem candidatas e o tipo de sistema eleitoral são fatores chave. Sistemas proporcionais, por exemplo, parecem ajudar mais mulheres a serem eleitas. Thames constatou em 2017 que partidos de esquerda tendem a indicar mais mulheres, especialmente se elas têm cargos importantes no partido. Isso faz com que partidos mais antigos também comecem a indicar mais mulheres para não perderem votos.
PublicidadeAlguns estudos mostram que mulheres têm mais chance de serem eleitas em sistemas proporcionais com listas abertas, como no Brasil. Mas há quem defenda que listas fechadas são melhores para elas. O ponto central é que o tipo de sistema eleitoral realmente influencia quantas mulheres são eleitas.
A democracia de um país também tem peso nessa relação. Em países com democracias fortes, sistemas proporcionais ajudam mais mulheres a chegar ao parlamento. Em contraponto, em democracias mais fracas, essa possibilidade não é tão clara.
Outro avanço notável realizado por Hughes, em 2016, reconheceu que as variações entre as mulheres eleitas vão além do simples número, explorando fatores como religião, educação e composição étnica. A pesquisa revelou que, surpreendentemente, homens muçulmanos foram eleitos em diferentes sistemas eleitorais, enquanto as mulheres muçulmanas obtiveram benefícios principalmente em sistemas proporcionais, enfrentando desvantagens em sistemas de maioria pluralista. Essas dinâmicas complexas ressaltam a importância de considerar o contexto político ao avaliar a representação feminina na política.
Assim como as mulheres, negros e pardos enfrentam barreiras sistêmicas que vão desde o financiamento de campanhas até a cobertura da mídia e a percepção pública. As mesmas variáveis que afetam a eleição de mulheres — sistemas eleitorais, práticas partidárias e níveis de democracia — também podem influenciar a representação de minorias étnicas. A sub-representação de grupos raciais no legislativo brasileiro reflete desigualdades mais amplas e persistentes na sociedade.
No Brasil, a representação de negros e pardos no legislativo não reflete a composição demográfica da população, onde mais da metade se identifica como parte deste grupo racial. A sub-representação de negros e pardos nas esferas de poder legislativo é um fenômeno complexo, influenciado por uma série de fatores estruturais e históricos que limitam o acesso e a participação política desses grupos.
Para abordar essas questões, é necessário um compromisso com políticas inclusivas e reformas estruturais que garantam igualdade de oportunidades para todos os cidadãos. Isso inclui uma análise mais aprofundada de como as variações do sistema político afetam a representação de diferentes grupos, além de um esforço para entender e superar os preconceitos raciais e de gênero.
A jornada para uma representação igualitária, tanto de gênero quanto de raça, é gradual e requer uma abordagem ampla. O caso brasileiro destaca a importância de considerar todos os aspectos da vida política e social para criar um ambiente onde mulheres, negros, pardos e outras minorias étnicas possam competir de forma justa e eficaz. Aumentar a diversidade no parlamento é essencial para uma democracia saudável e representativa, onde todas as vozes são ouvidas e valorizadas.
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