A revista britânica The Economist traz em sua capa desta semana o presidente Jair Bolsonaro. Nada do que os bolsonaristas devam se vangloriar. Toda vez que Bolsonaro é mencionado pela imprensa internacional, as menções não têm sido nada elogiosas. A capa traz uma foto de Bolsonaro de perfil e a sombra que se projeta atrás tem o indefectível topete do ex-presidente norte-americano Donald Trump. O título da reportagem de capa é: “O homem que queria ser Trump”, numa referência ao clássico de Rudyard Kipling, que rendeu também um filme maravilhoso de Jonh Houston, “O Homem que Queria ser Rei”.
Bolsonaro replica por aqui todas as estratégias e manhas de Trump nos Estados Unidos. Algo que indica a grande probabilidade de ambos, de fato, serem fruto de uma estratégia internacional da nova direita de produção de líderes autocratas que minam as democracias por dentro, no processo que bem ensinam Steven Levitsky e Daniel Ziblatt em “Como as Democracias Morrem”.
Ao se eleger nos Estados Unidos, Trump teve como guru Steve Bannon. E Bannon foi depois buscado nos Estados Unidos pelo deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP), filho de Jair Bolsonaro, para também dar os seus pitacos por aqui.
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Bannon mais tarde brigou com Trump. Se afastou de seu governo. E agora está preso. Entregou-se na manhã desta quinta-feira (8) à polícia. Bannon, segundo as acusações, teria montado nos Estados Unidos um esquema de fraude e desvio de recursos para construir o famigerado muro na fronteira com o México, uma das principais plataformas de campanha de Trump. São seis acusações no total, por lavagem de dinheiro e conspiração.
É curioso que por aqui Bolsonaro tente se vitimizar repetindo o tempo todo o temor de que ele, seus filhos e seus aliados sejam presos. Não porque sofram uma perseguição como o presidente gosta de repetir. Mas pela similitude mesmo de métodos e acontecimentos com o que se vê nos Estados Unidos.
PublicidadePor aqui, há investigações que apontam para a montagem de esquemas ilícitos de produção e disseminação de fake news. Para desvio de recursos no Ministério da Educação por pastores evangélicos aliados. Para esquemas de rachadinha nos pagamentos de salários nos gabinetes parlamentares. Para o uso sem controle de dinheiro do Orçamento com as emendas do Orçamento secreto (nada menos que R$ 19 bilhões).
Segundo o processo contra Bannon, em 2020, montou-se a campanha “Nós Construímos o Muro”, que arrecadou cerca de US$ 25 milhões. Bannon foi acusado de enganar os doadores e usar o dinheiro para gastos pessoais. Chegou a ser preso em 2020, mas saiu após pagar fiança. No dia 20 de janeiro de 2021, horas antes de passar o comando dos Estados Unidos para Joe Biden, Trump concedeu perdão presidencial a Steve Bannon. Qualquer semelhança com certo perdão concedido por aqui, não será mera coincidência.
Nos Estados Unidos, Bannon é o grande arquiteto da aplicação de estratégias militares, de guerra híbrida, na política. Aquilo que o professor Piero Leirner, da Universidade Federal de São Carlos, chama de “estratégia militar dissonante”. É a tática de produzir desinformação o tempo todo para confundir o adversário. O uso pesado de fake news e diversionismos para deixar o inimigo tonto. Nas guerras, um bom exemplo é a bizarra operação retratada no filme “O Soldado que Não Existiu”, quando os aliados jogam no mar um cadáver fake fazendo-o passar por um oficial inglês com planos igualmente falsos que apontariam um local, também falso, por onde as tropas inimigas do nazismo iriam entrar na Itália. Os nazistas caem na esparrela. A bizarra história retratada no filme é real.
De novo, há aí similitudes. A guerra híbrida na política nos Estados Unidos pareceu ter provocado muitas vezes confusão entre os próprios seguidores de Trump. É tanta volta, tanta ida e vinda, tanta desinformação, que não são somente os inimigos que ficam tontos. Por aqui, não é diferente. E um bom exemplo foi o Sete de Setembro do ano passado, que produziu aquele constrangedor vídeo de um caminhoneiro no Sul do país comemorando, às lágrimas, o golpe que não houve. Bolsonaro avançou. Viu-se obrigado a recuar. E a sua turma não entendeu nada. Nem sobre como deveria fazer o avanço, muito menos sobre como seria o recuo.
Como dizíamos por aqui ontem, Bolsonaro produziu eventos importantes de apoio. Mostrou que tem militância. Mas também demonstrou isolamento político. Nenhum dos demais chefes de poderes esteve no desfile militar. Bolsonaro transformou a comemoração do bicentenário da independência em uma constrangedora festa particular. O tempo dirá o preço que pagará por isso. Mas não é bom que no dia seguinte o guru de tudo isso esteja preso.
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