O presidente do PL, Valdemar Costa Neto, está tentando fazer as pazes com o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes. Com a ajuda de amigos em comum, ele vem buscando marcar um encontro com Moraes para tentar amenizar os estragos provocados pela condenação que o presidente do TSE e ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) lhe aplicou por litigância de má fé por ter questionado o resultado das eleições presidenciais. A interlocutores, Valdemar tem admitido que está arrependido de ter movido a ação. E quer fazer chegar a Moraes esse arrependimento.
O problema de Valdemar é como conciliar esse gesto de aproximação com o presidente do TSE com a pressão que sofre do ex-presidente Jair Bolsonaro e dos bolsonaristas mais radicais. Se por um lado a filiação de Bolsonaro fez com que Valdemar experimentasse uma situação até então inédita para ele – o comando de um grande partido, de fato –, por outro o obriga a tourear o imprevisível Bolsonaro, com um estilo de fazer política, ou não fazer, que foge completamente do figurino tradicional ao qual Valdemar estava acostumado.
Valdemar resistiu o quanto pôde a fazer o questionamento das eleições a partir do relatório feito pela empresa Audiency. Na verdade, ele nunca esboçou dúvidas sobre o sistema eleitoral. Quando foi votada a emenda da deputada Bia Kicis (hoje no PL do Distrito Federal ) que propunha o voto impresso, Valdemar orientou que o partido fosse contra. Mas acabou sendo convencido por Bolsonaro e abraçou a ação. Hoje, depois da condenação de Moraes, ele já confessou a interlocutores que avalia ter sido um erro.
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Em março, o partido terá conseguido pagar a multa que lhe foi imposta por Moraes. Somente a partir daí, ele poderá de fato usufruir de ter se tornado o maior partido do país, com 99 deputados e 15 senadores. Até lá, o PL está sem um tostão sequer. A decisão de Moraes bloqueou não apenas os recursos do fundo partidário, mas o dinheiro próprio do partido, de arrecadação para as campanhas. No final do ano passado, ele conseguiu comover o presidente do TSE a liberar uma quantia para que o partido pudesse pagar o salário e o 13º dos seus funcionários. O pagamento dos salário de dezembro, porém, que seria pago no início do ano, está atrasado. Uma das coisas que ele deseja conversar com Moraes é sobre conseguir o desbloqueio para honrar a folha salarial do partido.
Antes do episódio da condenação, o presidente do PL tinha uma boa relação com Alexandre de Moraes, construída a partir da política de São Paulo. Paulista da cidade de Mogi das Cruzes, Valdemar se relacionava bem com o governo de Geraldo Alckmin, hoje vice-presidente de Luiz Inácio Lula da Silva. Moraes era o secretário de Segurança Pública de Alckmin.
“Ele tem que voltar até março”
Resolvida essa querela jurídica, Valdemar projeta, então, a estratégia que traçou para que seu partido lidere a direita que aflorou no Brasil após a eleição de Bolsonaro. Um contingente de pessoas que ainda impressiona o presidente do PL. Um contingente de pessoas que hoje se aglutina em torno de Bolsonaro. E é isso o que angustia Valdemar. Ele não tem dúvidas que hoje está filiado ao seu partido um líder de massas. O problema é que é um líder de massas imprevisível. E que não raras vezes faz o oposto do que lhe é aconselhado.
PublicidadeValdemar não sabia, por exemplo, que Bolsonaro iria para a casa do lutador de MMA José Aldo, em Orlando. “Uai, ele não ia para Mar-a-Lago?”, chegou a perguntar, referindo-se ao resort que o ex-presidente Donald Trump tem em Palm Beach, também na Flórida. Se Bolsonaro hoje está hospedado numa casa que tem um quarto de mínions, provocando uma piada pronta, isso não foi combinado com o presidente do seu partido.
Assim como não sabia para onde Bolsonaro iria, Valdemar também não sabe quando Bolsonaro irá voltar. Se é que irá voltar. “Ele precisa estar de volta até março”, angustia-se o presidente do PL, segundo interlocutores. Para que, então, possa vir a liderar o processo que Valdemar traçou para ele.
Na sede do partido em Brasília, já estão prontas as salas reservadas tanto para Bolsonaro quanto para sua mulher, Michelle. Bolsonaro será presidente de honra do PL, e receberá por isso um salário equivalente ao teto do funcionalismo, o vencimento de um ministro do STF: R$ 46 mil. Michelle Bolsonaro será presidente do PL Mulher, e essa função lhe garantirá um salário equivalente ao de deputado federal: R$ 33,7 mil.
Cargos e gabinete do ódio
Os dois cargos garantem a legalidade dos pagamentos. Os dois serão, assim, funcionários do partido. Para evitar questionamentos legais, o PL desistiu de pagar o aluguel de uma casa para o ex-presidente. Eles pagarão a moradia com seus salários.
Bolsonaro pediu também ao PL a contratação de oito assessores além dos oito a que têm direito como ex-presidente da República. Entre esses outros oito que serão funcionários do PL deverá estar o ex-assessor especial da Presidência Tércio Arnaud Tomaz, um dos integrantes do chamado “Gabinete do Ódio”.
Enquanto se espera pela vinda de Bolsonaro, já despacha diariamente em outra sala do PL o ex-candidato a vice-presidente na chapa de Bolsonaro, o general Walter Braga Neto. Segundo integrantes do partido, Braga Neto, bem-humorado, tem dito que aprende com “os profissionais da política”, como o próprio Valdemar.
Braga Netto começou a ter notoriedade quando se tornou o interventor da segurança no Rio de Janeiro, quando foi decretada em 2018 a Garantia da Lei e da Ordem (GLO) no estado. Ainda não se sabe em qual cargo, mas tanto Braga Neto quanto o PL têm a pretensão de que ele venha a disputar algum mandato no estado a partir dessa notoriedade.
Valdemar precisa de Bolsonaro de volta ao Brasil para que ele possa, com sua liderança popular, ser o vetor dos planos que ele projeta para o PL. A estimativa de Valdemar é de conseguir eleger em 2024 de mil a 1.500 prefeitos nas eleições municipais (hoje o PL tem 343 prefeitos).
A ponta de lança desse trabalho será no Congresso, a partir das bancadas conquistadas. O PL elegeu 99 deputados e inicia no Senado com 15 senadores. Projeta que, somando-se parlamentares de partidos próximos, venha a liderar uma bancada em torno de pelo menos 20 senadores. Com base nisso, na próxima semana fará uma reunião para avaliar o lançamento de uma candidatura alternativa à do atual presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que tentará a reeleição (na Câmara, o partido está comprometido com a reeleição de Arthur Lira, do PP de Alagoas). Um nome que almeja o cargo é o senador eleito pelo Espírito Santo Magno Malta.
Medo de ser preso
O problema de Valdemar: combinar tudo isso com o imprevisível Bolsonaro. O ex-presidente não esconde o medo de que ele, que responde a mais de 70 inquéritos, seja preso. E que venha a ser preso também seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro. Ao contrário dos outros dois filhos na política, o senador Flávio (PL-RJ) e o deputado Eduardo (PL-SP), nem Bolsonaro nem Carlos têm foro privilegiado. Poderiam, assim, ser colhidos por qualquer juiz de primeira instância. E têm medo disso. Daí o temor de que Bolsonaro não retorne (há uma especulação de que ele poderia ir para a Itália, caso a família obtenha cidadania que está pleiteando).
Valdemar tem tentado tranquilizar Bolsonaro nesse sentido. Alega, inclusive, que caso uma prisão venha a acontecer, ele pode se tornar mártir para o seu eleitorado. Usa nesse sentido mesmo o exemplo do próprio Lula, que foi condenado e preso, reverteu suas condenações e elegeu-se presidente.
De qualquer modo, o PL garantiu forte proteção jurídica a Bolsonaro. O advogado Marcelo Bessa está sendo contratado para atuar nas causas criminais contra o ex-presidente. Ele chefiará uma equipe com outros cinco advogados.
Mas tudo isso depende de Bolsonaro desocupar a mansão com quarto de mínions de José Aldo e retornar ao Brasil para se valer de sua popularidade e liderar o processo que Valdemar Costa Neto idealizou. O presidente do PL aguarda ansioso notícias.
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